Política, Direito & Economia NA REAL

Política e Economia NA REAL n° 258

Apesar do novo estilo "Dilminha" da presidente, continua forte a insatisfação no Congresso Nacional.

20/8/2013

A República rebelde - 1

Sem a conotação de uma rebelião aberta ou uma insubordinação burocrática, mas também não muito subterrânea e disfarçada, já é possível visualizar na capital da República, segundo os melhores observadores dos costumes locais, uma certa rebeldia de setores governamentais contra determinadas políticas, orientações e discursos oficiais. É a reação da burocracia estatal formada pelo funcionalismo com carreira de Estado, incomodados com as ordens superiores que recebem, contrárias ao que eles consideram a melhor forma de gestão pública. São os servidores, concursados, de alto nível, que sabem que a caravana passa e eles ficam para pagar muitas vezes por políticas e ações com as quais, tecnicamente, não concordam.

A República rebelde - 2

Eles não pensam como agentes do governo, de um governo, de qualquer governo, mas como servidores públicos estatais, sem vinculações políticas e partidárias. A preocupação desses grupos é preservar a imagem da instituição a que servem, sem deixar que elas sirvam a interesses que não os do Estado. O mais visivelmente incomodado é o BC. Depois de passar dois anos e pouco interpretando todos os desejos da presidente Dilma e do ministro da Fazenda, Guido Mantega, subordinando a política monetária à política de desenvolvimento da dupla que comanda a economia, o BC mudou sua posição em quase noventa graus. Seus últimos comunicados contrariam de maneira frontal o otimismo que Dilma e Mantega continuam a cultivar. Agora, enquanto a presidente e seu ministro comemoravam em seu melhor estilo a queda a quase zero da inflação de julho (meros 0,03% de alta), o diretor de política econômica do BC, Carlos Hamilton, ao avesso, disse a quem quisesse ouvir, que o resultado foi um ponto "fora da curva", indicando que a instituição não vai afrouxar no ritmo da eleição da taxa básica de juros, mesmo com sinais de que o PIB não anda lá essas coisas.

A República rebelde - 3

Semana passada, ao mesmo tempo em que o ministro da Fazenda dizia que a nova escalada do dólar é positiva para a indústria brasileira, o BC realizava uma série de intervenções no mercado para conter a rebeldia da moeda americana. Na quinta-feira, o bem informado, em matéria de BC, repórter Vicente Nunes, do "Correio Braziliense", publicou uma nota em seu blog dizendo que a instituição presidida por Alexandre Tombini estava se considerando traída pelo restante do governo, pois enquanto ela cumpriu o que tinha sido acordado entre as partes, e derrubou a Selic, não teve a contrapartida de uma política fiscal mais austera. Sem outra saída, o BC emitiu uma nota lacônica, obviamente negando a idiossincrasia. Porém, quem frequenta os ares do BC sabe que o funcionalismo de lá, altamente qualificado e comprometido com a instituição, não gosta do que está se passando. E passa seu desconforto para a diretoria, toda ela formada por funcionários de carreira. E esse ambiente de insatisfação não está somente no BC. Há tempos a burocracia da Receita Federal se preocupa com a forma atabalhoada e seletiva com que o governo adota para distribuir incentivos fiscais e desonerações de impostos. No Tesouro Nacional, outro setor de funcionários concursados e de elevado nível, a "contabilidade criativa" do secretário Arno Augustin é vista com profundo desgosto. Uma hora o caldo pode entornar.

A República insubordinada

Continua muito forte no Congresso Nacional a insatisfação dos partidos aliados, inclusive em muitos casos no próprio PT, a insatisfação com a presidente Dilma e a maior parte de seus ministros. Apesar do novo estilo "Dilminha, simpatia, quase amor" que a presidente vem exibindo nos últimos para seus parceiros políticos, com sessões de agrado no Palácio do Planalto, e a franquia dos cofres do Tesouro Nacional para as verbas das emendas parlamentares, a relação entre o Executivo e o Legislativo não melhorou. Haja vista as duas derrotas do governo em votações na Câmara, na semana passada - na divisão dos royalties do petróleo e no caso do Orçamento impositivo - e nas ameaças de derrubada hoje de alguns vetos presidenciais. A máxima franciscana (nada a ver com o papa Francisco e nem com o sentido verdadeiro da expressão de São Francisco) do "é dando que se recebe" até hoje não está funcionando, talvez porque Dilma tenha começado muito tarde nesta prática, numa hora em que seu prestígio está baixo. O ambiente no Congresso é de insubordinação. Não dá, porém, para comparar esta com a insatisfação de setores da burocracia estatal, conforme a nota acima : com os primeiros, a insatisfação é de fundo e técnica, tem a ver com as políticas que têm sido adotadas ultimamente. A insubordinação dos congressistas é mais chã, tem a ver com o interesse deles e de seus partidos apenas.

Dilma, Guido, Tombini e o câmbio

Quem acompanha as coisas de Brasília sabe que quem manda na Fazenda é a presidente Dilma. Os graus de liberdade do ministro Mantega são limitados à vontade da chefe. Ele, por sua vez, parece muito bem acomodado à missão dada de fazer específica e detalhadamente o que vem do Planalto. No BC assim já foi. Hoje, como mostram as primeiras notas desta coluna, a autoridade monetária está ocupando espaços, inclusos os do Planalto. Dilma em matéria monetária parece ter apetência para mandar, mas é mais limitada política e tecnicamente que em outras governanças avançadas que desempenha. Pois bem : sabe-se que a presidente está particularmente preocupada com a alta do dólar e, sabedora dos efeitos perniciosos deste processo, parece inclinada a tomar partido "operacional" das soluções. O certo é que não há muito que fazer para estancar este estrutural processo. O que dá para fazer é cuidar das rebarbas (hedge, intervir pontualmente, etc.) e, atenção!, subir a taxa de juros básica para tentar valorizar o real e reduzir a inflação que nasce do câmbio desvalorizado. Isso o Planalto não quer escutar nem de longe. Todavia, será o que ouvirá de perto do BC.

COPOM sob tensão

Os diretores podem passar o tempo que quiserem olhando para os débeis indicadores da economia brasileira. O que se vê explicitamente e não apenas nas entrelinhas é que o país não tem vetor de crescimento. Trafega entre a perda de competitividade da indústria brasileira e a indiferença cada vez maior do setor privado (daqui e alhures) em investir (produzir riqueza nova). No meio do caminho tem um petardo estrutural (e não apenas conjuntural) : a alta cambial. O certo neste momento é o BC se fechar em torno do controle de uma variável, a inflação. Em relação ao câmbio cabe agir com moderação, sabedoria e inteligência, não necessariamente nesta ordem. Veremos o que sairá das tortuosas linhas dos comunicados do BC. M o leitor pode anotar : se o BC errar como o governo erra, o restante de 2013 será muito fraco e volátil e 2014 somente Deus sabe como será. O Brasil acumula boas reservas para operar o que torna um "colapso" improvável. Deve prevalecer o agravamento do atual grau de letargia.

Bovespa e dólar

Uma frase metafórica de um bem posicionado investidor brasileiro deve ser levada a sério : "Dólar a R$ 3,00 e Índice Bovespa a 30 mil pontos". Como se sabe, não é possível atribuir valores tão precisos às previsões, mas há que se respeitar a análise de tendências. Neste sentido, parece razoável imaginar que o tal do mercado caminha nesse sentido. Os fundamentos conspiram contra as cotações das ações das melhores empresas brasileiras cotadas na bolsa. Os preços são elevados em função do desempenho da economia brasileira e comparativamente ao que se vê lá fora. De outro lado, o dólar não capenga, tem força justificada. No curto prazo até que pode o cenário melhorar, mas isso torna uma venda mais segura que uma compra de ações.

Uma Marina incomoda muita gente - 1

A candidatura da ex-ministra e ex-senadora Marina Silva, ainda sem partido, à presidência da República, já não é vista, nem pelos partidários da reeleição da presidente Dilma, nem pelos possíveis candidatos de oposição, Aécio Neves e Eduardo Campos, como, para usarmos uma expressão da moda, "um ponto fora da curva". É, até mesmo, uma candidatura bem recebida, bem-vinda pela oposição, porque tucanos e socialistas acreditavam que ela poderia tirar votos preferencialmente de Dilma e garantir a realização do segundo turno no ano que vem. Era igualmente bem-vinda pelo petismo e aliados porque se acreditava que ela consumiria votos preciosos de Aécio e Campos, dividindo e enfraquecendo a oposição. A leitura das últimas pesquisas de opinião divulgada para o público e as que os partidos mandam realizar para consumo interno, indicam que os estragos que Marina Silva está causando atingem a todos. A ex-ministra está pegando votos (mais especificamente, intenções de votos) em todas as searas, do governo e da oposição.

Uma Marina incomoda muita gente - 2

A vantagem que Marina carrega hoje é que, embora tenha sido petista, tenha servido ao governo Lula e tenha tido intensa atividade parlamentar, ela não é vista pela maioria da população como alguém que representa o que mais foi condenado nas ruas de junho : "tudo que está aí", o modo de ser da política brasileira. Marina não é classificada como uma "política tradicional" no sentido brasileiro e pejorativo do termo. O maior sinal de que a ex-ministra começou a incomodar de fato foi o apelo - esta é a expressão correta que o ex-presidente Lula fez ao senador Eduardo Campos, para que ele se recomponha com as forças governistas e passe a apoiar a reeleição da presidente Dilma. Até semanas atrás, Lula, publicamente, dizia que não faria tal apelo por respeito ao direito de cada um escolher sua opção política.

Uma Marina incomoda muita gente - 3

Governistas e oposicionistas estão um pouco sem saber como agir. Torcem para que ela não consiga montar seu partido e, se conseguir, não consiga adesões e alianças suficientes para garantir um tempo razoável no horário eleitoral obrigatório no rádio e na televisão. Mas esta é uma aposta temerária, porque ela pode conseguir outra legenda. Além do mais, se a sociedade desconfiar que eles estão agindo por debaixo do pano para dificultar o nascimento do Rede Sustentabilidade, o partido que Marina tenta criar, a arma pode se voltar contra eles. A própria Justiça eleitoral parece ter se dado conta de que precisa ser mais ágil na análise do pedido de registro da legenda de Marina para não se comprometer com a opinião pública.

Uma Marina incomoda muita gente - 4

Resta tentar desconstruir a imagem da ex-ministra, o que parece já estar em andamento, haja vista algumas matérias que começam a surtir aqui e acolá, apontando falhas e contradições dela. Também deste lado não será tão fácil. A ex-ministra está mais experiente, bem mais "escolada" e bem melhor assessorada. A entrevista que ela deu ao jornal Folha de S.Paulo neste domingo é um primor e deve ser lida com muita atenção. Aparece ao lado da Marina conservadora em matéria de costumes, uma Marina mais conservadora (e liberal) em outros temas, um pouco diferente da figura quase religiosa da ambientalista radical. O discurso de Marina já não pressupõe um confronto com certos segmentos do mundo empresarial e em certos aspectos parece mais palatável para eles do que os conceitos que eles têm da presidente Dilma. É por essas e outras que Marina está incomodando muita gente. É cedo para dizer se ela vai chegar lá, mas já não é mais uma principiante como já tentou-se sugerir. Por isso, está incomodando tanta gente.

Está escrito nas estrelas - I

Lula não será candidato à presidência da República no ano que vem, se Dilma recuperar parte de prestígio perdido nos últimos meses. O PT não arriscará seu projeto de poder eterno se a presidente não chegar, lá por março, com mais de 50% de aceitação - pessoal e de seu governo. Caso não consiga, mesmo contra a sua vontade e contra qualquer risco, Lula terá de voltar aos palanques com toda a força, e não apenas como simples animador.

Está escrito nas estrelas - II

José Serra está movendo céus e terra para ser candidato novamente ao Palácio do Planalto. Poderá ser, mas não será pelo PSDB. A não ser que as chances do partido diminuam muito e Aécio prefira esperar outra oportunidade melhor para tentar a presidência, o que é muito improvável.

O homem forte

A Câmara e o Senado têm presidentes eleitos por seus pares. Todos os partidos têm direções escolhidas pelos seus filiados, os partidos indicaram de comum acordo seus líderes na Câmara, no Senado e no Congresso, assim como o governo escolheu seus representantes no Legislativo sem nenhuma pressão, por livre e espontânea vontade. Com tudo isso, porém, uma única pessoa dá as cartas para valer no momento no Congresso Nacional - o líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha/RJ. Sem a boa vontade dele nada acontece hoje no Congresso. Se Cunha não quer, não passa ; se ele avaliza, anda. É o caso de perguntar : que talentos têm este homem ? Ou o que ele sabe que outros não sabem que o torna tão poderoso e tão temido ?

Barbosa versus Lewandowski - 1

Certo é que o palavreado exacerbado - para usar um termo mais suave - do presidente do STF Joaquim Barbosa não é desmedido como parece. Barbosa não pretende ser um homem ilustre. Quer ser muito mais neste tema do mensalão : quer ser herói. Assim sendo, é preciso entender que ser herói lato sensu significa ultrapassar a percepção de um grande homem e adentrar no imaginário extramuros do STF. O distinto público está com fome de Justiça, deseja ver atrás das grades os poderosos que sempre "escapam pelo ladrão" (sem trocadilhos). Deste imaginário popular é que nasce os trejeitos pessoais do excelentíssimo presidente do STF. Não se tenha ilusão disso. Os que desejam algo mais, digamos, "jurídico" nas decisões da Corte, não devem esperar isso de alguém que almeja o heroísmo. O heroísmo combina com combate, bravura e coragem. Barbosa sabe disso e irá desempenhar seu papel.

Barbosa versus Lewandowski - 2

Lewandowski, de sua tribuna, sabe que Barbosa está mais frágil nos intestinos corredores da Suprema Corte. A astúcia política do presidente está mitigada por dois detalhes importantes. O primeiro é que parte aparentemente majoritária do plenário quer decidir por força da hermenêutica jurídica e, mesmo sabendo-se que isso não é algo absoluto, está pondo na mesa os seus argumentos legais. Este é o jogo "político" que foi traçado. O segundo é que Barbosa já sofre certos revezes de imagem, especialmente quando fala e parece desequilibrado e em eventos como o da compra de um apartamento em Miami por meio de um artifício tributário incomum aos magistrados. Neste item, Lewandowski e sua turma (se esta existe) está a conseguir o intento de neutralizar a demanda popular por um herói e que Joaquim Barbosa sabe operar. Este é o cenário por detrás das cortinas, mas que será incorrido na frente de todos. Não se espere calma nessa hora.

Barbosa versus Lewandowski - 3

Convenhamos que a questão dos embargos infringentes é pra lá de polêmica. Não é matéria certeira a ponto de se falar de jurisprudência pacificada. Ocorre que este questionável recurso não esconde que é nele que repousa a esperança de José Dirceu e outros de ficar livre da cadeia. Esta é a cena ideal e final que Barbosa espera propiciar para o distinto povo faminto de Justiça. Pena mesmo é que o tema dos embargos infringentes fique obscurecido por tão notório caso concreto. Afinal, é um assunto de ordem mais do que pública e cujas repercussões vão do Oiapoque ao Chuí. Todavia, até se chegar ao final desta intrigante peça teatral sobre o poder, não se espera calma naquele plenário.

Radar NA REAL

16/8/13   TENDÊNCIA
SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo
Juros ¹
- Pré-fixados NA alta estável/alta
- Pós-Fixados NA alta estável/alta
Câmbio ²
- EURO 1,3342 estável baixa
- REAL 2,4191 baixa baixa
Mercado Acionário
- Ibovespa 51.538,78 estável/baixa baixa
- S&P 500 1.655,85 estável/alta alta
- NASDAQ 3.602,78 estável/alta alta

(1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais).
(2) Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável

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Colunista

Francisco Petros Advogado, especializado em direito societário, compliance e governança corporativa. Também é economista e MBA. No mercado de capitais brasileiro dirigiu instituições financeiras e de administração de recursos. Foi vice-presidente e presidente da seção paulista da ABAMEC – Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais e Presidente do Comitê de Supervisão dos Analistas de Investimento. É membro do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo e do Corpo de Árbitros da B3, a Bolsa Brasileira, Membro Consultor para a Comissão Especial de Mercado de Capitais da OAB – Nacional. Atua como conselheiro de administração de empresas de capital aberto e fechado.