Política, Direito & Economia NA REAL

Política & Economia NA REAL n° 156

14/6/2011


Novos pontos no radar

A crise envolvendo Palocci escondeu por algumas semanas algumas importantes alterações no cenário externo, fato este que há de repercutir no cenário econômico local. Dentre as variáveis mais importantes destacamos : (i) a crise de crédito internacional voltou a se alastrar com o rebaixamento da nota de crédito da Grécia e Portugal, bem como a perspectiva negativa para as dívidas espanholas ; (ii) a economia europeia voltou a apresentar sinais de estagnação da atividade econômica ; (iii) os EUA não apresentam nenhum ganho significativo em termos de aumento de consumo e investimentos ; (iv) novas medidas referentes à capitalização dos bancos norte-americanos indicam que o crédito dos bancos continuará restrito ; e, (v) mesmo na Índia e China há sinais de desaquecimento, lembrando que são estes países que estão a impulsionar a demanda externa no mundo.

Efeitos

Muito embora a economia brasileira seja ainda muito fechada e, portanto, menos dependente da demanda externa, a letargia das principais economias centrais tem efeito depreciativo no médio prazo para os produtos brasileiros, inclusas aí as commodities. Ademais, nunca é demais lembrar que riscos de créditos que contaminam o sistema financeiro nunca são bem vistos pelos agentes. Logo, o cenário externo é hoje fator relevante para a contração da economia nacional.

Demanda interna

Nos últimos dois meses, já alertamos nossos leitores que a demanda interna cairá nos próximos meses. O aperto no crédito e a alta dos juros básicos estão se somando a um leve aumento da inadimplência e uma menor propensão dos consumidores para gastar. Somente a demanda do governo, via gastos correntes, é fator expansionista (e restritivo ao setor privado) no âmbito interno. Portanto, teremos de conviver com salários reais menores (por conta da inflação), massa salarial com menor crescimento e investimentos ainda insuficientes para alavancar de forma compensatória a queda do consumo. Nada é muito grave, mas longe é a ideia de que o crescimento é fato líquido e certo nos próximos meses.

Bolsa, juros e câmbio

O mercado acionário persiste negativo. Há três meses já avisamos que a nossa visão relativamente a este segmento é negativa. Os riscos não são recompensados pelos retornos e os preços das ações persistem altos. Quanto aos juros, estes devem subir ainda mais para os empréstimos e financiamentos, mas a campanha de alta dos juros básicos está próxima do fim, mesmo porque a demanda irá enfraquecer. Já o câmbio, está abandonado pelo governo : falta coragem para impor mais restrições às operações financeiras e a taxa de câmbio tornou-se instrumento de contenção da inflação por meio das baratíssimas importações. Um risco que não deveria ter sido tomado. Aliás, a taxa de câmbio sempre foi alvo das críticas do PT na oposição. No governo, os petistas se comportam como ex-petistas. Não apenas neste item, diga-se.

Radar NA REAL

10/6/11 TENDÊNCIA
SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo
Juros ¹
- Pré-fixados NA alta alta
- Pós-Fixados NA alta alta
Câmbio ²
- EURO 1,4414 alta alta
- REAL 1,5884 estável/queda estável/queda
Mercado Acionário
- Ibovespa 62.697,13 baixa estável/alta
- S&P 500 1.270,98 estável/baixa alta
- NASDAQ 2.643,73 estável/baixa alta

(1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais).
(2) Em relação ao dólar norte-americano
NA – Não aplicável

Na prática é que são elas

É inegável que o clima político ficou menos carregado depois que Dilma, em dois golpes ousados, nomeou Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Ideli Salvatti (Relações Institucionais) por livre e espontânea decisão. De uma só tacada enquadrou o PT, pôs barreiras ao assanhamento político de Lula e, ao contrário do que pode parecer - e eles ardentemente desejavam -, não ficou em dívida com os peemedebistas. Tutores e pretendentes a tal foram, no máximo, cheirados - e por pura deferência.

Política da saia justa, copa, emendas e nomeações

Os mais maledicentes de Brasília chamam de "política da saia justa" a nova estratégia de Dilma. Dizem que tal política tem de mostrar na prática – e já – que é funcional. Os desafios reais começam amanhã : aprovar a MP 517, um bonde cheio de "penduricalhos" que, entre outros pontos de interesse oficial, flexibiliza as licitações para as obras da Copa. É a terceira tentativa de passar a medida. É o primeiro teste do trio palaciano, com chances de ser ultrapassado se houver um pouco de paciência. A base partidária oficial, ainda lambendo as feridas, talvez se sinta inibida de cobrar a fatura da carraspana que levou da presidente. A oposição promete obstruir a votação, mas, como tem governadores e prefeitos diretamente interessados nos negócios da Copa, deve fazer apenas um barulhinho para a plateia. Por via das dúvidas, porém, a ministra Ideli Salvatti já começou a exibir um pouco de "paciência" : anunciou que a fila das nomeações vai andar mais rapidamente e que R$ 250 milhões de emendas parlamentares vão aparecer. Se o "Diário Oficial" corresponder à promessa, dias de trégua virão.

As pedras no caminho

É o que vem a seguir que dá enxaquecas no Planalto :

1. No Senado, já está pronta para ser votada no plenário a PPEC (autoria de José Sarney com emendas de Aécio Neves) alterando o rito de tramitação das MPs e restringindo o poder do Executivo para editá-las. Nas comissões, teve o apoio aberto do PMDB e é de total interesse do Senado : um dos propósitos é dar mais tempo aos senadores para analisar e votar MPs. No auge da crise Palocci, Dilma mostrou irritada ao saber da existência da proposta, desconhecimento no mínimo muito esquisito.

2. Na Câmara, cresce a pressão para que sejam postos em votação o PL regulamentando a EC 29 (aumenta os recursos para a saúde) e a PEC 300 (de reajuste dos salários dos bombeiros e policiais civis e militares). Ambas encontram forte resistência da área econômica. Contudo, uma tem a simpatia de governadores e prefeitos e a outra mobiliza as corporações armadas estaduais.

Para complicar, são temas transversais, fogem ao binário governo-oposição, são suprapartidários. Assim como o Código Florestal, primeira dor de cabeça real de Dilma. Quanto às novas regras para as florestas, o governo deu-se algum tempo mais para negociá-las no Senado : ao contrário do que ameaçou não fazer, para tentar assustar os ruralistas e defensores da proposta do deputado Aldo Rebelo, na semana passada o Planalto adiou por mais seis meses a cobrança de multas.

Ambulante na metamorfose

A nova ministra chefe da Casa Civil terá de fazer malabarismos de circo mambembe para passar a pensar como a chefe Dilma a respeito o Código Florestal. Oriunda do Paraná, Estado com forte presença do agronegócio, e no qual tem expostas ambições políticas, Gleisi Hoffmann foi defensora do projeto relatado por Aldo Rebelo. Relatório que Dilma classificou como uma "abominação".

Dúvida cruel - I

A partir de hoje o Brasil político começará a descobrir se a presença de Gleisi Hoffmann e Ideli Salvatti no cérebro do Planalto vai ajudar a amainar o estilo duro da presidente Dilma ou, ao contrário, o modo meio belicoso das duas ministras ajudará a explodir ainda sua paciência.

Dúvida cruel – II

Quanto tempo Dilma e suas escudeiras levarão para recompor as relações do Planalto com o PT e o PMDB ? Os dois estão cheios de mágoa. O PT sangra em público, no seu melhor figurino. Mais matreiro, o PMDB rumina em palácio.

João odiava Teresa que odiava...

Desde que a crise política esquentou com o caso Palocci posto na rua, algumas pessoas voltaram a se lembrar de um episódio da política inglesa muito ilustrativo da situação que perturba Dilma nas suas relações com os parceiros. Tendo voltado ao parlamento, depois de ter perdido a eleição pós-guerra, sir Winston Churchill se viu abordado por um parlamentar mais jovem, também conservador. Apontando para as bancadas dos trabalhistas, o jovem comentou com o experiente e sagaz ex-primeiro-ministro : "Ali estão nossos inimigos". Imediatamente, o bem humorado Churchill corrigiu o colega : "Ali estão os adversários. Nossos inimigos estão aqui." E estendeu os braços para mostrar os companheiros ao redor. Tudo como na seara dilmista : o PMDB briga com o PT, o PT briga com o PT, todos os outros não se entendem entre si e odeiam o PMDB e o PT... Parece aquele poema de Carlos Drummond às avessas : "João que amava Teresa que amava Raimundo (...)". Para graça da presidente, a oposição é apenas um retrato na parede, esmaecido e quase silente.

Os ciúmes vão bater

Ainda na fase de formação de seu governo, talvez já prevendo a barafunda partidária em que se metera, Dilma chegou a estender algumas pontes em direção à oposição, inclusive no discurso de posse e em outros sinais visíveis. Ficou só nisso, não se sabe ao certo por querer apenas mostrar civilidade e cordialidade ou porque sua turma não gostou. Agora, manda uma carta calorosa, bem além do protocolar, ao ex-presidente FHC cumprimentando-o por seus 80 anos...

Divã no ABC

O PT, como um todo, e o PT paulista, em particular, vão ter de passar por demoradas sessões de psicanálise política até descobrirem sua identidade no governo Dilma. O divã a ser usado (até ficar surrado) não tem endereço no Planalto Central. Está instalado no ainda coração da indústria automobilística nacional.

O atalho do Jaburu

Nos tempos gloriosos do MDB, o restaurante Piantella, em Brasília, era o ponto no qual os chefes do partido, como Ulysses Guimarães e Tancredo Neves faziam suas tramas para combater a ditadura. Nos tempos presentes do PMDB, um tanto quanto menos gloriosos dos que os de seu antecessor, as trilhas do partido desembarcam todas no ancoradouro da vice-presidência. É lá que os "grandes caciques" peemedebistas tramam. A mudança de endereço, como se diz no popular, está "causando espécie".

Afasta de mim esse cargo

Nunca se viu o sempre faminto PMDB tão "de regime" como na disputa pelo cargo de ministro das Relações Institucionais. O partido fez absoluta questão de nem passar, ainda que por descuido, perto da porta do ministério. O que prenuncia dias de turbulência para Ideli Salvatti.

Arrogância

É praticamente consenso : foi pessimamente conduzido o processo de fusão da Sadia com a Perdigão. Os donos do negócio e seus operadores perderam o tino ao acreditar que como o negócio era do gosto do governo e tinha o dedo do BNDES estava no papo.

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Colunista

Francisco Petros Advogado, especializado em direito societário, compliance e governança corporativa. Também é economista e MBA. No mercado de capitais brasileiro dirigiu instituições financeiras e de administração de recursos. Foi vice-presidente e presidente da seção paulista da ABAMEC – Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais e Presidente do Comitê de Supervisão dos Analistas de Investimento. É membro do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo e do Corpo de Árbitros da B3, a Bolsa Brasileira, Membro Consultor para a Comissão Especial de Mercado de Capitais da OAB – Nacional. Atua como conselheiro de administração de empresas de capital aberto e fechado.