Momento de decisão
Sabemos que as incertezas são o pior malefício para o funcionamento dos mercados, sejam da economia real sejam do mercado financeiro e de capital. Por sua vez, as tendências dos mercados são dadas pelas expectativas. Pois bem : o atual momento na economia mundial é de incerteza, ou seja, não há formação de uma tendência. Ao contrário : as opiniões se contradizem e os dados objetivos são deixados de lado em função das análises sobre o futuro.
O que está sendo ponderado ?
O estímulo fiscal generalizado ao redor do mundo foi o fator decisivo para a recuperação das principais economias mundiais. As piores perspectivas de uma recessão profunda e prolongada, tal qual nos anos 30 do século passado, foram afastadas. Resultado : elevação do valor dos ativos em geral. Como nada é neutro quando tratamos de economia, os estímulos fiscais utilizados para estimular a demanda e salvar o sistema financeiro de um colapso geraram enormes déficits fiscais. O que os investidores desejam ter mais claro é como todas as economias relevantes, sobretudo os EUA, saíram deste cenário expansionista do ponto de vista fiscal. Haverá elevação dos juros básicos por parte dos Bancos Centrais ? Em quanto tempo e quanto subirá a taxa de juros ? Como ficará a demanda neste novo (e possível) contexto ? Como ficará a relação entre as principais moedas mundiais ? Estas são apenas algumas das questões vitais que pesam sobre as economias e os diversos segmentos do mercado. Mas há dois outros fatores relevantes. Vejamos as notas seguintes.
China : mudanças estruturais
A China foi um dos motores que propiciaram o excepcional desempenho da economia mundial desde meados da década de 90 e, sobremaneira, a primeira década deste século. A capacidade do país de exportar a custos baixos gerou saldos enormes que, por sua vez, financiaram os gigantescos déficits da maioria dos países centrais no capitalismo, especialmente os EUA. De um papel importante no mundo, a China comunista passou a exercer um papel essencial. Todavia, pelas características do Estado chinês, não se pode avaliar com convicção como será exercido este papel daqui para frente. Do ponto de vista estrutural, a China pode começar a ter uma expansão geopolítica mais notória sobre o continente asiático e africano. Sua "fome" de matérias-primas é a principal justificativa para esta expansão. Do ponto de vista conjuntural, é possível que o governo comunista de Pequim passe a moderar o crescimento vigoroso do país para solucionar desequilíbrios perigosos, tais como a fragilidade do sistema financeiro e o excesso de investimento nas áreas de infra-estrutura e industrial. Há muita análise sobre tudo isso no mundo. Todavia, a única coisa certa é que há um maiúsculo ponto de interrogação sobre o futuro da política e da economia chinesa. No que se refere ao mercado financeiro e mundial, teme-se pela existência de uma "bolha". Um assunto que todos falam em voz baixa, mas que nem imaginam seus efeitos. A esfinge chinesa pode devorar muitos e muita coisa.
EUA : as escolhas de Obama
Neste momento eleitoral dos EUA, Obama emite sinais de que a agenda vai mudar. Dois itens pesam de forma especial nas suas escolhas : (i) a necessidade de recuperar a demanda, propiciando visibilidade sobre a condução do déficit fiscal, e (ii) a organização e regulação do combalido sistema financeiro norte-americano. A combinação das políticas relacionadas a ambos os aspectos dependerá em larga medida da sustentação política do governo, que está umbilicalmente ligada à melhoria dos indicadores de emprego. No teatro da política, estamos no meio da execução do script da peça. Tudo muito bem observado por um instável mercado, que treme as pernas e ajusta o preço dos ativos para baixo. Afinal, maior o risco, maior o desconto no valor destes ativos.
Brasil, bom momento depende do mundo
A política econômica brasileira vai bem. Mas nada é garantido quando o mundo pesa tanta coisa importante. O Brasil é essencialmente um exportador de commodities mesmo quando estamos a falar de produtos industriais. Nesse contexto, estamos submetidos aos humores chineses e do mercado financeiro na medida em que o país recebeu montanhas de recursos externos investidos nos ativos financeiros públicos e privados. O Brasil é um ator relevante no cenário mundial. Não era há pouco mais de uma década. Todavia, no jogo da política e da economia internacional ainda temos um papel secundário. Portanto, a hora é de olhar para fora e analisar a evolução do cenário. O Brasil evoluirá em função do mundo. Para o bem e para o mal.
Indicadores positivos
A ironia da hora é que enquanto os mercados estão inquietos, os dados da economia européia e norte-americana têm sido positivos. O PIB dos EUA no quarto trimestre do ano passado foi muito bom e surpreendente. O consumo das principais economias europeias cresce, mas a péssima situação de crédito da Grécia tem obscurecido estes dados positivos. E a China cresce espetacularmente : a produção industrial de janeiro é recorde absoluto. De forma sucinta : a maioria dos indicadores mostra ótimos resultados das políticas fiscais e monetárias. Mas a questão da hora é : para onde estamos indo ?
Radar NA REAL
Os investidores, conforme já dissemos nas notas acima, estão muito sensíveis ao desenvolvimento dos acontecimentos políticos e econômicos das principais economias, especialmente dos EUA. No que se refere especificamente ao mercado financeiro, o momento é negativo no curto prazo. Todavia, não é o caso de se acreditar numa tendência negativa para o resto do ano e no médio prazo. É preciso analisar o peso da evolução do noticiário sobre os diversos segmentos do mercado mundial e local. As bolsas de valores são aquelas que registram com maior intensidade os ajustes das mudanças de cenário. Portanto, a volatilidade é para cima. No que se refere às moedas, há uma corrida mundial na direção do dólar. Esta é a razão fundamental para a alta do dólar perante o real. Um fenômeno, portanto, a despeito das variáveis locais. Também os títulos de renda fixa apresentam desvalorização. As taxas de juros de médio e longo prazo, sobretudo dos títulos governamentais dos EUA, estão subindo. Logo, o valor de face dos títulos cai. É o que acontece com os títulos da dívida externa brasileira. A palavra de ordem é calma. Não há necessidade de se precipitar. Como dissemos, a tendência positiva para o médio prazo persiste positiva, apesar de a convicção sobre a benignidade do desempenho das principais economias, inclusive a brasileira, ter se deteriorado.
29/1/10 |
TENDÊNCIA
SEGMENTO CotaçãoCurto prazo
Médio Prazo
Juros ¹
- Pré-fixados NA
alta
alta
- Pós-Fixados NAestável
alta
Câmbio ²
- EURO 1,3900
estável/queda
estável/baixa
- REAL 1,8950estável/baixa
estável/baixa
Mercado Acionário
- Ibovespa 65.401,77
estável/queda
estável/alta
- S&P 500 1.083,87estável/queda
alta
- NASDAQ 2.147,35estável/queda
alta
(1) – Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais)
(2) – Em relação ao dólar norte-americano
NA – Não aplicável
Estresse à vista no Congresso
Nos planos do presidente Lula, assoberbado com a campanha da ministra Dilma, e sem tempo para muitos conchavos políticos além dos eleitorais, Câmara e Senado serão muito camaradas com ele este ano. Lula confia que deputados e senadores, a maioria lutando pela sobrevivência na selva da reeleição, não lhe tragam aborrecimentos. O presidente está equivocado, ignora o essencial : ano eleitoral é propício para as demagogias. Aliás, não é que o presidente ignora, ele de fato esquece. Quem, como revelou a revista "Veja" na semana passada, adia para 31/10 (coincidência danada, já terá passado o primeiro e o segundo turno da eleição) a suspensão de mais de 250 mil benefícios do Bolsa-Família que não se recadastraram, como manda a lei, sabe muito bem do que se trata. Não tem muito do que se queixar se o Congresso adotar a mesma linha de condução.
Adiando projetos
Lula terá de tourear pelo menos o andamento de dois projetos, nos próximos dois três meses :
1. A MP já em vigor, que aumentou as aposentadorias acima do salário mínimo em cerca de 6%. Há um ganho real em relação à inflação dos últimos 12 meses. Mesmo assim, tanto oposicionistas como governistas vão tentar aprovar uma emenda à MP estabelecendo o mesmo índice aplicado ao salário mínimo para todos os benefícios pagos pelo INSS.
2. A proposta, de autoria do deputado Vicentinho, reduzindo a jornada de trabalho no Brasil de 44 horas semanais para 40.
Os dois projetos têm apoio incondicional dos sindicatos e das centrais, CUT e Força Sindical. A área econômica considera inaceitáveis ambas as propostas. Seria uma bomba nas contas públicas. Lula, porém, não quer vetar nada do tipo popular para não ferir a campanha de Dilma. Vai cobrar mais esse sacrifício do PT e de alguns aliados. Terá sucesso com as centrais sindicais prometendo barulho no Congresso e manifestações nas ruas e, até mesmo, greves ? O governo pode ficar nas mãos do presidente da Câmara, que é quem, em última instância, determina a pauta votações e pode manobrar para evitar surpresas para o governo.
E tem ainda o pré-sal
A votação de três dos quatro projetos com as novas regras de exploração de petróleo no Brasil pelos deputados pode ser outro aborrecimento para Lula. A intenção é votar tudo esta semana – a capitalização da Petrobras, a criação do Fundo Social com recursos do pré-sal e as questões da partilha dos recursos e royalties. Em todos os três governistas e oposicionistas querem meter o bedelho, em direções que o governo execra. Mas o mais polêmico é o da divisão do dinheiro. Depois que, pelo menos aparentemente, houve um acordo pela partilha dos bens, de agrado dos três produtores (RJ, SP e ES), apareceu uma emenda, liderada pelo deputado Ibsen Pinheiro, do RS, estabelecendo que uma divisão igualitária, para Estados e municípios não-produtores e para Estados e municípios produtores. E valendo para o que já existe e para o que virá. É uma proposta explosiva, pois é do gosto de quase todo mundo. Vai ser difícil o governo forçar parlamentares a botarem a cara no plenário para votar contra o interesse de seus Estados e dos municípios onde buscam votos. Por isso, manobras são feitas para que a emenda não seja votada. Uma alegação é a de que é extemporânea. O deputado Eduardo Cunha, do RJ, Estado diretamente interessado em boicotar a proposta, promete recorrer ao STF para suspendê-la. Tem sido norma o Supremo não se imiscuir em assuntos que dizem respeito ao Legislativo. O governo mais uma vez terá de se aninhar nos braços de Temer. Exatamente o político do PMDB que o PT tenta afastar da posição de vice de Lula.
E ainda tem a oposição
Para complicar ainda mais o cenário na Câmara neste início de um ano legislativo que promete ser muito breve por causa da Copa do Mundo e das eleições, o DEM está ameaçando com uma obstrução total na Câmara. É um protesto do partido contra o veto do presidente Lula na lei orçamentária. Lula retirou a suspensão dos trabalhos de quatro obras da Petrobras – R$ 13 bilhões – decidida pelo TCU e mantida pelos congressistas. Todas barradas por suspeitas de irregularidades, entre elas excesso de faturamento.
E a Petrobras segue olímpica
Até agora a Petrobras finge que não é pelo menos estranho que duas horas antes da abertura dos envelopes das agências de publicidade que concorriam a sua milionária conta de propaganda, um site especializado na área de publicidade tenha divulgado exatamente quais seriam os três agraciados. O mínimo que se esperava é que ela suspendesse a licitação. Mas, ao que tudo indica, com o poder de fogo que a estatal tem, ela está acima do bem e do mal.
Sucintas informações sobre a batalha sucessória
Não há nada de muito novo no front, mas há avanços e definições :
1. Tanto a candidatura de Dilma, quanto a de Serra, estão consolidadas.
2. O crescimento de Dilma é consistente, como mostrou a pesquisa do instituto de pesquisas "Vox Populi" na semana passada e outras sondagens mostrarão ao longo das duas próximas semanas.
3. Ciro Gomes está fora do jogo. Agora a hora em que ele receberá o cartão amarelo (ou vermelho) está sendo acertada.
4. Marina Silva está mais desenvolta, aparecendo mais, o que pode ser espelhado nas próximas pesquisas.
5. As batalhas dos vices dos dois candidatos principais ainda vão render muito grandes confrontos. O que se pode dizer é que as resistências de Aécio a cada dia que passa se tornam menos intransponíveis. E que Temer continua no fio da navalha.
6. Nem o carnaval será refresco para as disputas entre PT e PMDB em muitos Estados.
O quadro vai se afunilando, numa situação em que a oposição está visivelmente em desvantagem.
As "grandes" que o governo tenta formar
A empreiteira Camargo Corrêa recebe o apoio do governo, segundo a "Folha de S.Paulo" do último domingo, para comprar a Eletropaulo e a participação societária da Previ e do BB na Neoenergia. Se isto acontecer, 1/3 da energia do país será provida por uma empresa apenas. Este estímulo à formação de enormes conglomerados empresariais por parte do governo está se generalizando. Da área de varejo até a petroquímica a concentração mercadológica aumenta vertiginosamente. Resta saber quem olhará pelos interesses dos consumidores. No geral, os órgãos de defesa da concorrência - CADE e SDE - fazem poucas restrições a este processo. O consumidor está cada vez mais cerceado pelos interesses destes conglomerados. O Congresso, desmobilizado, também não intervém. Uma coisa é certa : este processo pode ser bom para as empresas, mas os riscos para o consumidor são consideráveis.
PPPs, o retorno
A julgar pela movimentação de grandes escritórios de advocacia, as PPPs estão em alta velocidade. A Copa do Mundo e as Olimpíadas são mais dois fatores que se somam à preferência dos estrangeiros pelos investimentos no país para que as PPPs voltassem a ser um instrumento relevante para grandes investimentos em infra-estrutura.
FHC e os negócios
O Instituto FHC não é apenas um ponto de encontro de certos grupos de intelectuais. Por ali estão passando alguns negócios portentosos. O ex-presidente parece estar interessado em fusões e aquisições no setor de comunicação. A conferir os resultados destas conversas...
FHC e sua visão sobre a China
Luiz Gonzada Beluzzo, presidente do Palmeiras e intelectual de peso, informou no programa "Painel" da "Globo News", que num encontro com FHC na Europa, o ex-presidente teria lhe dito que na China não há opressão política visível sobre os cidadãos. Ou seja, as liberdades civis são respeitadas. O que seriam então os episódios como os do Google ?
Serra e São Pedro
Não se sabe o grau de religiosidade de José Serra. Mas ele deve estar rezando muito invocando o meteorologista divino. O pedido é que cessem ou se reduzam dramaticamente as chuvas em São Paulo. Somente assim há chance de as obras das marginais e do rodoanel serem concluídas antes de o governador paulista se lançar candidato ao Planalto.