Observatório da Arbitragem

A arbitragem como instrumento garantidor da segurança jurídica para o crescimento do agronegócio no país

Nos litígios envolvendo o agronegócio, em atenção à inerente dinâmica característica do mercado, decisões céleres são essenciais para o setor.

28/2/2023

O agro não é só tech e pop: o agro também é arb

Pero Vaz de Caminha mostrou-se visionário ao relatar na famosa carta dirigida ao Rei que: "Nesta terra, em se plantando, tudo dá". E, de fato, fruto de massivo investimento em ciência e tecnológica, o país chega ao final do ano de 2022 a US$ 1 tri no acumulado de dez anos relativamente à receita do exponencialmente produtivo agronegócio. O PIB nacional é impactado pelo agro em aproximadamente 25% e ele responde por 37% dos empregos existentes. Cabe destacar ainda que, se tratou de um dos poucos setores não afetados pela pandemia, tendo permanecido com tendência ascendente.

A diversidade das relações jurídicas advindas do agro é ilimitada e os litígios do setor demandam conhecimentos quanto às especificidades atinentes às leis que regulam cada uma das atividades agroindustriais, aos usos e aos costumes. Ademais, o julgador deve ter conhecimento aprofundado relativamente às peculiaridades das operações, sob pena de julgar de forma dissociada da realidade desse microssistema e gerar indesejável injustiça.

Nos litígios envolvendo o agronegócio, em atenção à inerente dinâmica característica do mercado, decisões céleres são essenciais para o setor. Notório que o objeto do negócio se refere a bens que são perecíveis, do mesmo modo, as safras são sazonais, a logística de armazenamentos é dinâmica e todo sistema de exportações mostra-se diligente.

A crescente sofisticação e complexidade quanto à tecnicidade dos assuntos geram a necessidade de devida adequação jurídica relativamente a cada uma dessas operações e o julgador deve aliar o conhecimento específico aprofundado das cada vez mais novas áreas, com os princípios de base do setor, costumes e princípios gerais do direito.

O Poder Judiciário, desde muito, está em crise e não dispõe da especialização e de celeridade necessárias ao segmento, e, desta forma, não mais pode oferecer uma solução adequada para os conflitos surgidos no agro. A complexidade das relações multifacetadas demandam a adoção de um mecanismo adequado de resolução de controvérsias: a arbitragem.

Felizmente, existem no país câmaras especializadas na agroindústria, no meio ambiente, e nas questões agrárias. É o caso, por exemplo, da CAMARB que incorporou a Câmara de Mediação e Arbitragem da Sociedade Rural Brasileira. Recentemente, vem surgindo outras câmaras arbitrais voltadas ao setor, em paralelo ao fato de que as câmaras clássicas, já vêm disponibilizando quadros de árbitros especializados no tema, tal como a CAMES, a Câmara da Ciesp/Fiesp, a Câmara da FGV e o CBMA, tudo isso na esteira de suprimento de forma suficiente e qualificada do vácuo deixado pela jurisdição estatal.

Ressalte-se que, a sistemática do agro agrega além da agropecuária em si, toda a produção e comercialização de insumos, envolve a indústria de processamento, passa pelas redes de armazenamento e distribuição e, ainda, tem-se a atuação da ciência, tecnologia, pesquisa e serviços de apoio como o de assistência técnica e transporte. Indiretamente, envolve os setores de exportação e importação, de serviços alfandegários, portuários, aeroportuários, e os mercados e atacadistas responsáveis por fazerem os produtos chegarem no consumidor final. Por fim, se faz presente o mercado acionário no qual as ações das empresas agro presentes na bolsa de valores são negociadas.

O objeto dos temas que vem sendo postos na via arbitral são os mais diversos. Vão desde litígios tendo por base contratos de compra e venda de commodities, passam por contratos de parceria e arrendamento, caminham pelos conflitos relativos aos contratos de financiamento rural e de compra e venda de insumos, perpassam os contratos imobiliários e desembocam até no amplo espectro das relações societárias.

Necessário mencionar que a lei 13.986/2020, tida como o marco legal do agro, foi e é responsável pelo grande salto fruto do fomento normativo à agroindústria nacional. Abriu caminho para que títulos recebíveis do agro pudessem ser atrelados à moeda estrangeira, o que fez com que houvesse substancial ingresso de investimento estrangeiro no setor. E, a condição para que cada centavo de dólar ingresse no Brasil é que eventuais controvérsias advindas das relações jurídicas estabelecidas sejam solucionadas pela arbitragem.

Nesse sentido, inócuo seria o novo marco legal e desimportante seria toda a nossa produtividade no campo, se inexistisse investimento estrangeiro salvaguardado pela segurança jurídica da arbitragem, condição para o seu ingresso.

O reflexo nas câmaras de arbitragem foi direto e imediato. Como exemplo, o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá, indica que os setores de agricultura e de alimentação representaram 7,62% dos casos julgados em 2020 e 8,59% dos casos em 2021. Os percentuais são expressivos e crescentes.

Os investimentos advindos dos fundos de investimentos internacionais, das instituições financeiras estrangeiras aqui passaram a encontrar um local de lucro certo e elevado, além de seguro, ante a qualificada jurisdição privada existente.

Assim, o país que é orgulhosamente responsável por alimentar a humanidade e que é exemplo de um agro tecnológico, popular, de vanguarda e de economia verde altamente produtiva, também passa a ser exemplo de disposição de instrumentos legais necessários para dar aos investidores segurança jurídica pautada em eficientes, qualificados e céleres meios de solução de controvérsias, tendo a arbitragem como valor central.

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Colunistas

Marcelo Bonizzi é professor doutor de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da USP/Largo São Francisco. Autor de livros e artigos. Pós-doutor pela Faculdade de Direito de Lisboa. Procurador do Estado de São Paulo. Atua como árbitro (FIESP/CAMES E CAMESC).

Olavo Augusto Vianna Alves Ferreira é procurador do Estado de São Paulo. Doutor e Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP. Professor do Programa de doutorado e mestrado em Direito da UNAERP. Professor convidado de cursos de pós-graduação. Membro de listas de árbitros de diversas Instituições Arbitrais. Foi membro da Comissão Especial de Arbitragem do Conselho Federal da OAB. Autor de livros jurídicos. Coordenador Acadêmico do site Canal Arbitragem.