Migalhas Notariais e Registrais

Os juros moratórios convencionais após a Lei dos Juros Legais (lei 14.905/24): o caso do art. 5º da Lei de Usura e a situação do crédito rural, comercial e industrial

Após a Lei dos Juros Legais (lei 14.905/2024), indaga-se: qual é o índice aplicável para os juros moratórios legais? E qual é o teto para os juros moratórios convencionais?

7/8/2024

Resumo

Tendo em vista a extensão deste texto, convém começar o presente texto resumindo, em frases diretas, as ideias principais.

Segue resumo das ideias do texto:

1. Já tratamos do cenário dos juros remuneratórios e dos juros moratórios após a Lei dos Juros Legais (lei 14.905/2024) em artigo anterior publicado na coluna Migalhas Notariais Registrais, ao qual remetemos o leitor.

2. O teto dos juros moratórios convencionais é o dobro dos juros moratórios legais (art. 1º da Lei de Usura). É irrelevante a previsão do art. 5º da Lei de Usura, seja por ter sido revogado tacitamente pelo novo art. 406 do CC (na redação da Lei dos Juros Legais), seja por força de interpretação sistemática.

3. No caso de cédulas ou notas rurais, industriais ou comerciais, o limite máximo dos juros moratórios legais é o resultado do acréscimo de 1% ao teto dos juros remuneratórios permitidos para esses tipos de obrigações, em razão de lei especial (art. 5º, parágrafo único, decreto-lei 167/1967; art. 5º, parágrafo único, do decreto-lei 413/1969; art. 5º da lei 6.840/1980).

4. O entendimento acima é coerente com a orientação jurisprudencial do STJ anteriormente à Lei dos Juros Legais, a qual deve ser mantida com as adaptações cabíveis. 

Limite dos juros moratórios convencionais

Após a Lei dos Juros Legais (lei 14.905/2024), indaga-se: qual é o índice aplicável para os juros moratórios legais? E qual é o teto para os juros moratórios convencionais? E como fica o art. 5º da Lei de Usura (decreto 22.626/1933), que estabelece que “pela mora dos juros contratados estes sejam elevados de 1% e não mais”?

A pergunta aqui volta-se a obrigações civis comuns. Não alcança as dívidas perante instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil (Bacen) à vista do seu regime jurídico especial.

Em anterior artigo, de 34 páginas, já respondemos a essa pergunta, detalhando todo cenário desenhado pela Lei dos Juros Legais (lei 14.905/2024), que entrará em vigor no final de agosto.

Indicamos que os juros moratórios legais é o resultado positivo da seguinte equação: Taxa Selic – IPCA. É o §§ 1º e 3º do art. 406 do CC:

Art. 406.  Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal. (Redação dada pela lei 14.905, de 2024)   Produção de efeitos

§ 1º  A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código. (Incluído pela lei 14.905, de 2024)   Produção de efeitos

§ 2º A metodologia de cálculo da taxa legal e sua forma de aplicação serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e divulgadas pelo Banco Central do Brasil. (Incluído pela lei 14.905, de 2024)

§ 3º  Caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência. (Incluído pela lei 14.905, de 2024)   Produção de efeitos

E apontamos que as partes podem pactuar juros moratórios convencionais até o dobro dos supracitados juros moratórios legais, conforme art. 1º da Lei de Usura (decreto 22.626/1933), que – no nosso entendimento – estabelece teto para todas as espécies de juros (remuneratórios e moratórios):

Art. 1º É vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal (Cod. Civil, art. 1.062).

A tese – por nós defendida – no sentido de que os juros moratórios convencionais é o dobro dos legais na forma do art. 1º da Lei de Usura já havia sido anunciada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) nestes julgados abaixo, que fixavam, como teto, o dobro dos juros legais da época (que era de 0,5% ao mês à luz do art. 1.062 do CC/19161, que era a norma aplicável aos casos concretos apreciados):

DIREITO CIVIL. EXECUÇÃO DE TRIPLICATAS. JUROS. DISCIPLINA LEGAL. JUROS LEGAIS. JUROS MORATÓRIOS. LIMITE. DOBRO DA TAXA LEGAL. CC, ARTS. 1.062 E 1.262. LEI DE USURA. FLUÊNCIA DOS JUROS A PARTIR DO VENCIMENTO. RECURSO PROVIDO.

- O limite legal previsto no art. 1º do decreto 22.626/33, c/c 1.062 do Código Civil, permite a pactuação de juros moratórios em 12% ao ano, ou 1% ao mês [ou seja, o dobro dos juros moratórios legais à época, que eram de 0,5% ao mês], em títulos cambiariformes, sendo a sua cobrança devida desde o vencimento até o efetivo pagamento.

(STJ, REsp n. 172.790/PR, 4ª Turma, Rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 16/8/1999)

RECURSO ESPECIAL. JUROS DE MORA. TAXAÇÃO.

É vedada a estipulação de taxa de juros superior ao dobro da taxa legal de 6% ao ano (CC, art. 1062; Decreto 22.626/33, art. 1.).

Recurso conhecido e provido.

(STJ, REsp n. 1.497/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Gueiros Leite, Terceira Turma, DJ de 9/4/1990)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. JUROS DE MORA. 1% AO MÊS. VIGÊNCIA DO CC/16. LEGALIDADE. FORMA PACTUADA

1. A jurisprudência da Corte considera legal a cobrança dos juros moratórios no percentual de 1% ao mês [ou seja, o dobro dos juros moratórios legais à época, que eram de 0,5% ao mês], na vigência do Código Civil de 1916, desde que pactuado.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(STJ, AgRg no Ag n. 523.073/RJ, relator Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ/RS), Terceira Turma, julgado em 15/10/2009, DJe de 5/11/2009)

CIVIL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. COBRANÇA. JUROS MORATÓRIOS. TAXA CONVENCIONADA. ART. 1.062 CÓDIGO CIVIL. LIMITAÇÃO. LEI DE USURA (DECRETO N. 22.626/33). INCIDÊNCIA.

I. A taxa de juros moratórios contratada deve ser observada, desde que não ultrapassado o limite legal de 12% ao ano previsto na Lei de Usura [ou seja, o dobro dos juros moratórios legais à época, que eram de 0,5% ao mês].

II. Recurso especial conhecido e provido.

(STJ, REsp n. 380.453/RS, relator Ministro Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, julgado em 1/4/2003, DJ de 30/6/2003, p. 254.)

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE CRÉDITO EDUCATIVO. OMISSÃO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. INOCORRÊNCIA. JUROS MORATÓRIOS. LIMITAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. REEXAME DE PROVAS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. INOCORRÊNCIA.

(...)

II - Admite-se a cobrança de juros moratórios à taxa de 12% ao ano quando pactuado no contrato [ou seja, o dobro dos juros moratórios legais à época do caso concreto – regido pelo CC/1916 –, ou seja, o dobro de 0,5% ao mês].

(...)

Recurso improvido.

(AgRg no Ag n. 706.093/RS, relator Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 23/9/2008, DJe de 13/10/2008.)

Agravo regimental. Recurso especial. Alienação fiduciária. Comissão de permanência. Limitação ao pacto. Juros de mora. Súmula nº 294 da Corte.

(...)

2. Quanto aos juros moratórios, a jurisprudência da Corte considera legal a cobrança no percentual de 1% ao mês, desde que pactuado [ou seja, o dobro dos juros moratórios legais à época, que eram de 0,5% ao mês]. O acórdão, porém, não evidencia a existência do referido pacto, não podendo, portanto, ser deferida a pretensão recursal nesse aspecto.

3. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no REsp n. 602.437/RS, relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, julgado em 3/8/2004, DJ de 16/11/2004, p. 277.)

Ação de revisão de contrato. Trânsito em julgado da sentença que julgou procedente ação de busca e apreensão. Decisão de ofício.

Juros remuneratórios. Capitalização. Juros moratórios. Comissão de permanência. Precedentes da Corte.

(...)

4. Os juros moratórios podem alcançar até 12% ao ano, quando assim pactuados, como ocorre neste caso [ou seja, o dobro dos juros moratórios legais à época do caso concreto – regido pelo CC/1916 –, ou seja, o dobro de 0,5% ao mês].

(...)

6. Recurso especial conhecido e provido, em parte.

(REsp n. 537.355/RS, relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, julgado em 6/4/2004, DJ de 17/5/2004, p. 217.)

Todavia, essa tese merece ser confrontada com o art. 5º da Lei de Usura, que veicula o seguinte comando:

Art. 5º Admite-se que pela mora dos juros contratados estes sejam elevados de 1% e não mais.

Entendemos que o dispositivo acima não afasta a tese supracitada (a de que o teto dos juros moratórios convencionais é o dobro dos juros moratórios legais à luz do art. 1º da Lei de Usura). E há dois motivos para tanto.

O primeiro motivo é que consideramos que o art. 5º da Lei de Usura foi tacitamente revogado por incompatibilidade com a Lei dos Juros Legais, especificamente com o novo texto do art. 406 do CC.

Isso, porque o art. 5º da Lei de Usura, ao fazer menção a um percentual fixo de 1%, partia da premissa de que os juros moratórios legais eram também baseados em um percentual fixo. De fato, à época do CC/1916, o percentual dos juros moratórios legais era de 0,6% ao mês.

Acontece que, com o novo texto do art. 406 do CC, os juros moratórios legais passam a estar sujeitos a um índice flutuante, entregue à oscilação dos índices Selic e IPCA. É incompatível com essa base fluída estabelecer um percentual fixo máximo a título de juros moratórios convencionais, o que faz com que a revogação do art. 5º da Lei de Usura seja de reconhecida.

Basta imaginar se o Brasil imergisse em uma fase de heterodoxia financeira, com a Selic escalando para a casa dos 1.000% ao mês. Um percentual fixo de 1% para servir de teto aos juros moratórios legais seria absolutamente risível diante de sua insignificância e, por isso, além de não indenizar adequadamente o credor, não teria qualquer efeito inibidor contra o devedor em mora.

Portanto, consideramos que o art. 5º da Lei de Usura está tacitamente revogado pelo novo art. 406 do CC (na redação da Lei dos Juros Legais).

Ainda que assim não fosse, há um segundo motivo subsidiário. É que, mesmo se considerarmos o art. 5º da Lei de Usura em vigor, temos que ele precisaria ser lido em conjunto com o art. 1º da Lei de Usura, que estabelece, como teto para os juros (remuneratórios e moratórios), o dobro dos juros moratórios legais.

Isso, porque o espírito da Lei de Usura, com o referido art. 1º, é impedir que censurar qualquer multiplicação exagerada da dívida por força de juros. Logo, quando o art. 5º da Lei de Usura autoriza que os juros moratórios convencionais resultem da elevação, em 1%, dos juros remuneratórios pactuados, esse dispositivo deveria ser lido no sentido de que essa elevação deve corresponder a, no máximo, o dobro da taxa legal.

Na prática, essa interpretação infertiliza o art. 5º da Lei de Usura, mas nos parece mais adequada com o espírito da própria Lei de Usura, que é a de impedir cobranças exorbitantes de juros (ainda que moratórios). Além disso, para indenizar e punir no caso de inadimplemento, o ordenamento disponibiliza a multa moratória. Acerca da multa moratório, lembramos que que o art. 9º da Lei de Usura fixa um teto de 10% do valor da dívida para esse tipo de multa2 em dívidas pecuniárias, teto esse que deve ser tido como reduzido para 2% quando se tratar de dívida consumerista (art. 52, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor – CDC3) e de dívida condominial (art. 1.336, § 1º, do CC4).

Ilustrando o que expusemos, suponha que uma dívida de parcelamento da venda de um veículo em uma relação civil (sem envolver consumidor). Nessa hipótese, poderiam as partes pactuar que as parcelas do preço seriam submetidas:

a) até o vencimento, a juros remuneratórios correspondente ao dobro do resultado positivo desta equação: Taxa Selic – IPCA; e

b) após o vencimento, por atraso, a juros moratórios no mesmo importe acima (ou seja, ao dobro do resultado positivo da equação Taxa Selic – IPCA), além de pactuar eventual multa moratória de até o teto de 10% do art. 9º da Lei de Usura.

No exemplo acima, havendo inadimplemento, haverá uma continuidade da cobrança do máximo de juros admitidos no Brasil, com o acréscimo de multa moratória.

Apesar desse entendimento acima – que ora defendemos –, é preciso reconhecer a existência de uma corrente paralela.

A corrente paralela é no sentido de que, à luz do art. 5º da Lei de Usura, o teto dos juros moratórios convencionais é de 1% mais o dobro dos juros moratórios legais.

Sobre o tema, é preciso tomar muito cuidado na leitura dos julgados do STJ que, aparentemente, chancelariam essa orientação.

Isso, porque, na verdade, apesar de haver alguns julgados que tenham feito referência ao art. 5º da Lei de Usura, eles tratam, na verdade, apenas de casos envolvendo cédulas ou notas rurais, comerciais ou industriais. E, ao garimpar a origem desses julgados, verifica-se que o entendimento está edificado no parágrafo único do art. 5º da Lei da Cédula Rural (decreto-lei 167/1967), similar ao parágrafo único do art. 5º da Lei da Cédula de Crédito Industrial (decreto-lei 413/1969) – que é aplicável também às cédulas de crédito comercial por força do art. 5º da Lei nº 6.840/1980. Referidos dispositivos assim dispõem:

Decreto-lei 167/1967

Art 5º As importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros as taxas que o Conselho Monetário Nacional fixar e serão exigíveis em 30 de junho e 31 de dezembro ou no vencimento das prestações, se assim acordado entre as partes; no vencimento do título e na liquidação, por outra forma que vier a ser determinada por aquêle Conselho, podendo o financiador, nas datas previstas, capitalizar tais encargos na conta vinculada a operação.

Parágrafo único. Em caso de mora, a taxa de juros constante da cédula será elevável de 1% (um por cento) ao ano.

Decreto-lei 413/1967

Art 5º As importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros e poderão sofrer correção monetária às taxas e aos índices que o Conselho Monetário Nacional fixar, calculados sôbre os saldos devedores da conta vinculada à operação, e serão exigíveis em 30 de junho, 31 de dezembro, no vencimento, na liquidação da cédula ou, também, em outras datas convencionadas no título, ou admitidas pelo referido Conselho.

Parágrafo único. Em caso de mora, a taxa de juros constante da cédula será elevável de 1% (um por cento) ao ano.

Lei 6.840/1980

Art. 5º Aplicam-se à Cédula de Crédito Comercial e à Nota de Crédito Comercial as normas do decreto-lei 413, de 9 de janeiro 1969, inclusive quanto aos modelos anexos àquele diploma, respeitadas, em cada caso, a respectiva denominação e as disposições desta Lei.

Um dos julgados fundantes desse entendimento para financiamentos rurais é este:

MÚTUO RURAL. JUROS. (...) ILEGALIDADE DA TAXA PACTUADA PARA O CASO DE INADIMPLEMENTO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO

(...)

Os juros moratórios, limitados, em se tratando de crédito rural, a 1% ao ano, distinguem-se dos juros remuneratórios. Aqueles são forma de sanção pelo não pagamento no termo devido. Estes, por seu turno, como fator de mera remuneração do capital mutuado, mostram-se invariáveis em função de eventual inadimplência ou impontualidade.

Clausula que disponha em sentido contrário, prevendo referida variação, e cláusula que visa a burlar a disciplina legal, fazendo incidir, sob as vestes de juros remuneratórios, autênticos juros moratórios em níveis superiores aos permitidos.

(STJ, REsp n. 28.907/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 8/3/1993)

No supracitado julgado, observa-se que as discussões giraram em torno do art. 5º do decreto-lei 167/1967, que foi apontado como violado no recurso especial. Nada se referiu ao art. 5º da Lei de Usura.

Idêntico raciocínio foi aplicado às Cédulas ou Notas de Crédito Comercial, por força da respectiva lei especial. Veja este julgado:

NOTA DE CRÉDITO COMERCIAL. JUROS DE MORA. INALTERAÇÃO EM CASO DE INADIMPLEMENTO DO DEVEDOR. JULGAMENTO EXTRA PETITA.

(...)

- Na hipótese de mora do devedor, os juros não podem elevar-se à taxa superior a 1% ao ano (art. 5º, parágrafo único, do Decreto-lei nº 413, de 09.01.695, c.c. o art. 5º da Lei nº 6.840, de 03.11.80).

Recurso especial não conhecido.

(STJ, REsp n. 73.637/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ de 19/3/2001)

A Segunda Seção do STJ sacramentou essa linha de raciocínio:

CRÉDITO RURAL (DECRETO-LEI N. 167/67).

(...)

 2. Taxa de juros pelo inadimplemento do devedor. Não é lícita a cláusula que, no pormenor, prevê a substituição por taxa superior, diferenciando taxas para pagamento no prazo e após o vencimento da divida.

Em caso de mora, admite-se seja a taxa inicialmente pactuada elevada de apenas 1% (um por cento) ao ano. Precedentes atuais das turmas da 2ª Seção do STJ.

3. Embargos de Divergencia conhecidos, mas rejeitados.

(STJ, EREsp n. 64.428/RS, 2ª Seção, Rel. Min. Nilson Naves, DJ de 3/6/1996)

O que se observa é que, com base nesses julgados, edificados em lei especial, vários outros precedentes seguiram a mesma linha, sempre analisando hipóteses de cédulas ou notas de crédito rural, comercial ou industrial (STJ, AgRg no AREsp n. 14.950/MS, 4ª Turma, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe de 24/10/2013; REsp n. 307.165/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de 10/3/2003; REsp n. 102.118/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de 18/2/2002; REsp n. 135.075/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de 19/11/2001; REsp n. 95.970/RS, 4º Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 11/11/1996; REsp n. 97.770/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 29/10/1996; REsp n. 95.540/RS, 4º Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 14/10/1996; REsp n. 63.029/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 29/4/1996; REsp n. 59.691/RS4º Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 27/11/1995; AgRg no REsp n. 1.411.837/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe de 19/6/2015).

Como se vê, mesmo antes da Lei dos Juros Legais (lei 14.905/2024), a jurisprudência do STJ acenava no sentido de que o teto dos juros moratórios convencionais é o dobro dos juros moratórios legais, com base no art. 1º da Lei de Usura. Ressalva, porém, por força de leis especiais, quando se tratasse de cédulas ou notas de crédito rurais, industriais ou comerciais, o teto dos juros moratórios legais era o resultado do acréscimo de 1% ao teto dos juros remuneratórios permitidos para esses tipos de créditos específicos.

Lembramos que, nesses tipos de créditos específicos, há apelo social e econômico maior, por envolver empreendedores em atividades extremamente sensíveis ao País. Isso justifica a existência de leis especiais para essas espécies de crédito.

Enfim, em conclusão, entendemos que esse cenário subsiste após a Lei dos Juros Legais, com o detalhe de que, ao nosso sentir, o art. 5º da Lei de Usura – que já era infertilizado hermeneuticamente – foi definitivamente sepultado: está revogado tacitamente por força do novo art. 406 do CC, na redação da Lei dos Juros Legais.

__________

1 Art. 1.062. A taxa dos juros moratórios, quando não convencionada (art. 1.262), será de seis por cento ao ano.

2 Art. 9º Não é valida a clausula penal superior á importância de 10% do valor da divida.

3 CDC: Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre: (...) § 1° As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação. (...).

4 CC: Art. 1.336. (...) § 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito à correção monetária e aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, aos juros estabelecidos no art. 406 deste Código, bem como à multa de até 2% (dois por cento) sobre o débito.

5 Art 5º As importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros e poderão sofrer correção monetária às taxas e aos índices que o Conselho Monetário Nacional fixar, calculados sôbre os saldos devedores da conta vinculada à operação, e serão exigíveis em 30 de junho, 31 de dezembro, no vencimento, na liquidação da cédula ou, também, em outras datas convencionadas no título, ou admitidas pelo referido Conselho. (...) Parágrafo único. Em caso de mora, a taxa de juros constante da cédula será elevável de 1% (um por cento) ao ano.

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Coordenação

Carlos E. Elias de Oliveira é membro da Comissão de Reforma do Código Civil (Senado Federal, 2023/2024). Pós-Doutorando em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Doutor, mestre e bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). 1º lugar em Direito no vestibular 1º/2002 da UnB. Ex-advogado da AGU. Ex-assessor de ministro STJ. Professor de Direito Civil e de Direito Notarial e Registral. Consultor Legislativo do Senado Federal em Direito Civil, Processo Civil e Direito Agrário (único aprovado no concurso de 2012). Advogado, parecerista e árbitro. Instagram: @profcarloselias e @direitoprivadoestrangeiro.

Flauzilino Araújo dos Santos, 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de SP e presidente do Operador do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico (ONR). Diretor de Tecnologia do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil - IRIB. Licenciado em Estudos Sociais, bacharelado em Direito e em Teologia e mestrado em Direito Civil. Autor de livros e de artigos de Direito publicados em revistas especializadas. Integra, atualmente, a Comissão de Concurso Público para outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de Alagoas, realizado pelo CNJ.

Hercules Alexandre da Costa Benício, doutor e mestre em Direito pela Universidade de Brasília. É tabelião titular do Cartório do 1º Ofício do Núcleo Bandeirante/DF; presidente do Colégio Notarial do Brasil - Seção do Distrito Federal e acadêmico ocupante da Cadeira nº 12 da Academia Notarial Brasileira. Foi Procurador da Fazenda Nacional com atuação no Distrito Federal.

Ivan Jacopetti do Lago, diretor de Relações Internacionais e Coordenador Editorial do IRIB. Bacharel, mestre e doutor em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP. Pós-graduado pelo CeNOR - Centro de Estudos Notariais e Registrais da Universidade de Coimbra e pela Universidade Autónoma de Madri (Cadri 2015). 4º Oficial de Registro de Imóveis de SP.

Izaías G. Ferro Júnior é oficial de Registro de Imóveis, Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas e de Títulos e Documentos da Comarca de Pirapozinho/SP. Mestre em Direito pela EPD - Escola Paulista de Direito. Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP. Professor de graduação e pós-graduação em Direito Civil e Registral em diversas universidades e cursos preparatórios.

Sérgio Jacomino é presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) nos anos 2002/2004, 2005/2006, 2017/2018 e 2019/2020. Doutor em Direito Civil pela UNESP (2005) e especialista em Direito Registral Imobiliário pela Universidade de Córdoba, Espanha. Membro honorário do CeNoR - Centro de Estudos Notariais e Registais da Universidade de Coimbra e Quinto Oficial de Registro de Imóveis da cidade de SP.