Migalhas Notariais e Registrais

Nome civil: princípios, regras e prática após a lei 14.382/22 - Parte I

Professor Carlos E. Elias de Oliveira detalha como ficou o nome civil após a recente mudança da lei 14.382/2022.

28/9/2022

Introdução

Este artigo centra-se em expor como ficou o cenário normativo acerca do nome civil após a Lei do SERP1 (lei 14.382/22).

Nome enquanto direito da personalidade

O nome é um direito da personalidade. É um direito existencial. É inerente à condição de pessoa. Por meio dele, a pessoa identifica-se perante terceiros e forma a própria visão de si.

A importância do nome para a pessoa natural é inegável. Mas não se pode negar que, especialmente nos tempos atuais, outros direitos da personalidade concorrem com o nome em termos de identificação.

O número de CPF (Cadastro de Pessoas Físicas) é um exemplo. Sua vocação inicial era no campo do Direito Tributário, para identificação dos contribuintes na sua relação fiscal. Todavia, as suas vantagens em termos de singularização da pessoa acabaram fazendo-o desbordar para o ramo do Direito Civil, tornando-se um elemento de identificação da pessoa natural. Nesse sentido, o CPF deve ser considerado um direito da personalidade. É mais seguro identificar uma pessoa pelo seu CPF do que pelo seu nome civil. Pelo nome, há riscos grandes de confusões decorrentes de homonímias. A própria legislação exige o CPF como elemento essencial na qualificação das pessoas em atos jurídicos e em processos judiciais.

Outro exemplo são os codinomes utilizados em perfis de redes sociais. A identidade digital da pessoa é um direito da personalidade decorrente da proliferação da Internet no quotidiano dos indivíduos. Em termos jurídicos, consideramos que esses codinomes digitais devem ser protegidos enquanto um direito da personalidade.

O foco deste artigo está apenas no nome civil.

O nome é decomposto em três elementos: (1) prenome, que pode ser simples ou composto; (2) sobrenome, também chamado de nome de família, patronímico (quando oriundo da linha paterna), matronímico (quando derivado da linha materna) ou sobrenome familiar; e (3) agnome. Este último, a rigor, é parte integrante do segundo, mas, por questão didática, a doutrina o trata em apartado. É por isso que o art. 16 do CC2 e o caput do art. 55 da LRP3 não o mencionam expressamente.

Ilustrando, o nosso nome (Carlos Eduardo Elias de Oliveira) envolve um prenome composto (Carlos Eduardo) e dois sobrenomes (Elias de Oliveira).

Os principais dispositivos que tratam do nome são estes:

a) arts. 16 a 19 do CC: cuidam da proteção do nome (e do pseudônimo) com foco externo, ou seja, preocupando-se com possíveis agressões praticadas por terceiros.

b) arts. 55 a 58 da LRP: cuidam do nome com foco interno, ou seja, assegurando o direito da pessoa em determinar qual será o nome.

Apesar de o nome ser um direito da personalidade da pessoa, há interesse público em proteger terceiros que poderiam ser prejudicados se houvesse uma tutela mais individualista do nome pelo ordenamento. Basta pensar, por exemplo, em uma pessoa que, de má-fé, causasse danos a terceiros e, depois, "desaparecesse" com um novo nome e uma nova identidade.

Na próxima semana, continuaremos tratando do assunto, expondo o cenário normativo atual sobre o nome civil após a lei 14.382/22.

__________

1 SERP: Sistema Eletrônico de Registros Públicos

2 Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.

3 Art. 55. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome (...).

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Coordenação

Carlos E. Elias de Oliveira é membro da Comissão de Reforma do Código Civil (Senado Federal, 2023/2024). Pós-Doutorando em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Doutor, mestre e bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). 1º lugar em Direito no vestibular 1º/2002 da UnB. Ex-advogado da AGU. Ex-assessor de ministro STJ. Professor de Direito Civil e de Direito Notarial e Registral. Consultor Legislativo do Senado Federal em Direito Civil, Processo Civil e Direito Agrário (único aprovado no concurso de 2012). Advogado, parecerista e árbitro. Instagram: @profcarloselias e @direitoprivadoestrangeiro.

Flauzilino Araújo dos Santos, 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de SP e presidente do Operador do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico (ONR). Diretor de Tecnologia do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil - IRIB. Licenciado em Estudos Sociais, bacharelado em Direito e em Teologia e mestrado em Direito Civil. Autor de livros e de artigos de Direito publicados em revistas especializadas. Integra, atualmente, a Comissão de Concurso Público para outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de Alagoas, realizado pelo CNJ.

Hercules Alexandre da Costa Benício, doutor e mestre em Direito pela Universidade de Brasília. É tabelião titular do Cartório do 1º Ofício do Núcleo Bandeirante/DF; presidente do Colégio Notarial do Brasil - Seção do Distrito Federal e acadêmico ocupante da Cadeira nº 12 da Academia Notarial Brasileira. Foi Procurador da Fazenda Nacional com atuação no Distrito Federal.

Ivan Jacopetti do Lago, diretor de Relações Internacionais e Coordenador Editorial do IRIB. Bacharel, mestre e doutor em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP. Pós-graduado pelo CeNOR - Centro de Estudos Notariais e Registrais da Universidade de Coimbra e pela Universidade Autónoma de Madri (Cadri 2015). 4º Oficial de Registro de Imóveis de SP.

Izaías G. Ferro Júnior é oficial de Registro de Imóveis, Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas e de Títulos e Documentos da Comarca de Pirapozinho/SP. Mestre em Direito pela EPD - Escola Paulista de Direito. Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP. Professor de graduação e pós-graduação em Direito Civil e Registral em diversas universidades e cursos preparatórios.

Sérgio Jacomino é presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) nos anos 2002/2004, 2005/2006, 2017/2018 e 2019/2020. Doutor em Direito Civil pela UNESP (2005) e especialista em Direito Registral Imobiliário pela Universidade de Córdoba, Espanha. Membro honorário do CeNoR - Centro de Estudos Notariais e Registais da Universidade de Coimbra e Quinto Oficial de Registro de Imóveis da cidade de SP.