Migalhas Notariais e Registrais

A realização de comunicações processuais mediante notificações extrajudiciais

A realização de comunicações processuais mediante notificações extrajudiciais.

5/5/2021

O tema de que trataremos nas próximas linhas não é propriamente um caso de "desjudicialização", porque a realização dos atos de comunicação processual não é exclusividade dos Oficiais de Justiça, haja vista já se admitir, desde a vigência do antigo Código de Processo Civil (lei 5.869, de 11/01/1973), que sejam realizados mediante o concurso dos funcionários da empresa de correio – carteiros, bem como, já na vigência do atual Código de Processo Civil, lei 13.105, de 16 de março de 2015, que, sob o cânone da efetividade da justiça, adotou como princípio a instrumentalidade das formas (v. arts. 188 e 277 - CPC), também por quaisquer meios alternativos que atendam à sua finalidade essencial, já tendo sido admitida até mesmo a utilização de aplicativo de mensagens instantâneas – whatsApp. (v. PCA nº 0003251-94.2016.2.00.0000–CNJ; HC nº 641877-STJ). Portanto, há muito existe a previsão legal de que as comunicações processuais podem ser realizadas por meios extrajudiciais, embora essa realidade legal ainda não tenha sido adequadamente compreendida, nem posta intensivamente em prática no meio jurídico, em prejuízo das desejadas celeridade e segurança na efetivação de tais atos.

Sabe-se que os processos judiciais no Brasil, via de regra, são lentos, geralmente devido a "gargalos" processuais, sendo talvez o principal deles a demora na efetivação das comunicações processuais, tornando precária a prestação jurisdicional pelo estado. No entanto, é do espírito do novo Código Processo Civil, lei 13.105, de 16 de março de 2015, a efetividade real do processo, que, para isso, deve ser célere e justo. Ou seja, o processo civil deve cumprir a lei material e, para entregar ao jurisdicionado uma resposta em tempo hábil, deve ser funcional, e a funcionalidade está diretamente ligada aos procedimentos que formam o processo, entre eles, as comunicações processuais.

O princípio da celeridade processual (art.5º, LXXVIII, CF), caracterizado pela razoabilidade na duração do processo e celeridade na sua tramitação, bem como as previsões contidas no Código de Processo Civil, de que "a citação será feita pelo correio para qualquer comarca do país, exceto" (caput do art. 247) "quando o autor, justificadamente, a requerer de outra forma" (inc. V, do art. 247), e que "os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial" (art. 188), bem como que "quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade" (art. 277), evidenciam à saciedade que as notificações extrajudiciais são meio adequado e dos mais seguros, céleres e eficazes para a concretização de comunicações processuais.

Portanto, nem é o caso de realizar referidas comunicações por qualquer "outro modo", mas sim mediante correio qualificado, que é o múnus público exercido por Oficial Público de Registro de Títulos e Documentos, que é fiscalizado pelo Poder Judiciário, dotado de fé pública, e cujos atos - notificações extrajudiciais, por isso mesmo, gozam de presunção de veracidade, sendo, por isso, meio de prova superior a todos os outros previstos no Código de Processo Civil para a comunicação de fatos processuais, à exceção das comunicações realizadas por Oficial de Justiça, às quais têm status probatório semelhante, haja vista serem os Oficiais de RTD como que os Oficiais de Justiça do extrajudicial, em decorrência da capitulação legal das suas competências, especialmente aquela contida no artigo 160 da Lei dos Registros Públicos, para realizar notificações extrajudiciais veiculando qualquer conteúdo, como avisos, denúncias, cobranças e outros.

Adite-se que o conceito de correio é o de "serviço de transporte e distribuição de correspondência", "pessoa que transporta ou distribui a correspondência" (Infopédia), "pessoa enviada com correspondência, despachos, ofícios, etc" ou "subalterno às ordens de um soberano para levar correspondência, transmitir ordens, avisos, etc" ("correio", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, 2008-2021, - consultado em 04-04-2021). E é exatamente no que se enquadram os Oficiais de Registro de Títulos e Documentos quando exercem sua competência legal para realizar notificações extrajudiciais, agindo por delegação, sob o comando legal estatal.

Ocorre que, apesar da clareza dos dispositivos da lei processual, acima referidos, na atualidade, por insegurança, muitos advogados ainda hesitam recorrer a esse meio para a efetivação de comunicações processuais, talvez pelo temor de que uma decisão judicial possa apresentar entendimento diverso, a despeito das explícitas disposições da lei processual. No entanto, referidas disposições já trazem em seu bojo a profilaxia dessa insegurança: o caput do art. 247-CPC reza que "a citação será feita pelo correio para qualquer comarca do país, exceto" (inc. V) "quando o autor, justificadamente, a requerer de outra forma". Portanto, basta que já na inicial seja feito pedido* para que a citação e demais comunicações processuais sejam efetivadas mediante notificações extrajudiciais, tendo por supedâneo as disposições acima referidas, e por justificativa, a superior segurança jurídica, a celeridade e a eficácia do método, em relação à opção pelos funcionários da empresa de correio comum. Não fosse por isso, antes mesmo, conforme acima já referido, porque os Ofícios de RTD, quando atuam efetivando notificações, nada mais são que espécie de correio qualificado, segundo a acepção vernacular do termo, cujos atos, tais quais os dos Oficiais de Justiça, gozam de presunção de veracidade, porque realizados por agentes investidos em fé pública outorgada pelo estado, que lhes normatiza e fiscaliza a atuação, como entes, que são, de colaboração com o Poder Judiciário. Ou seja, as notificações extrajudiciais também são atos efetivados por correio, mas um correio qualificado, pelas razões referidas.

Pelo exposto, evidenciado fica que recorrer às notificações extrajudiciais para a efetivação das comunicações processuais traz muitas vantagens para os advogados e titulares das ações, haja vista ser a demora na consecução de tais atos um dos principais motivos de retardamento na tramitação dos processos, criando os denominados “tempos mortos”, em que estes se encontram parados nas secretarias das diversas varas de justiça, à espera da consecução das comunicações necessárias. Isso sem falar na insegurança de dar continuidade a processos tendo por lastro citações efetivadas, por vezes, de maneira precária, por servidores da empresa de correio, que, embora dignos e esforçados, não detêm a necessária expertise para o ato, nem são detentores de fé pública.

Adite-se que, na atualidade, em razão da existência, em plena operação, do Sistema de Registro Eletrônico de Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas – SRTDPJ, criado pelo Provimento CNJ nº 48, de 16 de março de 2016, foi estabelecida uma rede de centrais de serviços eletrônicos compartilhados, integradas e coordenadas por uma centralizadora nacional – a Central RTDPJBrasil -, que interliga os Ofícios de RTD a seus congêneres em todo o território nacional, viabilizando o imediato envio eletrônico de notificações aos cartórios onde devam ser executadas, em todas as comarcas do país.

Assim, além de todas as vantagens em celeridade e segurança jurídica, grande conveniência e comodidade pode ser obtida pelos advogados, que podem optar por meio seguro, célere e descomplicado para a comunicação dos atos processuais do interesse de seus clientes, visto que, sem sair dos seus escritórios, poderão requerer a emissão das necessárias certidões de peças processuais e providenciar seu envio para os cartórios de Registro de Título e Documentos de todo o país, a fim de que estes realizem a segura comunicação dos atos processuais, o que os livrará - e a seus representados - de transtornos, dispêndio de recursos e de tempo, porque não precisarão deslocar-se até as secretarias das varas dos tribunais, nem serão surpreendidos por decretações de nulidade em razão de citações inadequadamente realizadas por funcionários da empresa de correio, que não têm o devido preparo para a correta efetivação desses atos, o que, ao fim e ao cabo, resultará mais tempo para que se possam dedicar a sua atividade-fim.

E tudo isso porque, além da fé pública de que são dotados os Oficiais de Registro de Títulos e Documentos, o que confere a seus atos presunção de veracidade, as certificações notificatórias que fazem são minuciosas (ao contrário do que normalmente ocorre com os atos praticados pelos funcionários da empresa de correio), o que resulta higidez na constituição e tramitação dos processos judiciais, dando-lhes mais celeridade e eficácia, com reflexos positivos para toda a sociedade, por torná-la mais justa, com uma justiça célere, que de forma eficaz entrega a prestação jurisdicional.

Finalmente, sobre este tema, recomendamos a leitura do excelente artigo do Dr. Marco Paulo di Spirito, Defensor Público de Minas Gerais, que foi quem primeiro alertou quanto à existência dessa opção à disposição das partes e advogados, no qual analisa o correspondente suporte legal e relata sua experiência com a utilização das notificações extrajudiciais, acessível aqui, no qual recolhemos subsídios para a elaboração do presente texto.

*Emílio Guerra é bacharel em Direito, ex-advogado, especialista em Registros Públicos pela PUC – MG e Oficial Registrador do 1º Ofício de Registro de Títulos e Documentos de Belo Horizonte.

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Exemplificação de petição inicial com pedido para realização de citações e demais comunicações processuais mediante notificações extrajudiciais:

Petição Inicial 

 

Excelentíssimo senhor, Juiz de Direito da ____ Vara ____ da Comarca de ___________, Doutor…………., ……………………………………………… 

AÇÃO DE……….., em face de…...(nome do demandado e sua qualificação completa)………pelos fatos, motivos e fundamentos de direito que passa a expor: 

I – dos Fatos: ………………………………. 

II - ………………………………………….... 

III - …………………………………………... 

……………………………………………... 

IV – Dos pedidos: 

a - ………………………………………….. 

b - ………………………………………….. 

c - ………………………………………….. 

d – Finalmente, com supedâneo no princípio da celeridade processual (art.5o, LXXVIII, CF), caracterizado pela razoabilidade na duração do processo e celeridade na sua tramitação, bem como nas previsões contidas no Código de Processo Civil, de que a “a citação será feita pelo correio para qualquer comarca do país, exceto” (caput do art. 247) “quando o autor, justificadamente, a requerer de outra forma” (inc. V, do art. 247), e que “os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial” (art. 188), bem como que “quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade” (art. 277), o autor pede que V. Exª, ao deferir a presente inicial, autorize que a citação e demais comunicações processuais de seu interesse possam ser por ele promovidas mediante notificações extrajudiciais, a serem realizadas pelos Ofícios de Registro de Títulos e Documentos, que são espécie de correio qualificado, quando atuam na entrega de notificações extrajudiciais, porque dotados de fé pública e fiscalizados pelo Poder Judiciário, do qual são agentes auxiliares, cujos atos gozam de presunção de veracidade, o que proporcionará superior segurança jurídica, celeridade e eficácia ao ato, em relação à opção pelos funcionários da empresa de correio comum. 

Nestes termos,

Pede deferimento. 

Cidade de …………….., em………………...

 Dr. Fulano de Tal

Advogado – OAB nº xxxxx

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Coordenação

Carlos E. Elias de Oliveira é membro da Comissão de Reforma do Código Civil (Senado Federal, 2023/2024). Pós-Doutorando em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Doutor, mestre e bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). 1º lugar em Direito no vestibular 1º/2002 da UnB. Ex-advogado da AGU. Ex-assessor de ministro STJ. Professor de Direito Civil e de Direito Notarial e Registral. Consultor Legislativo do Senado Federal em Direito Civil, Processo Civil e Direito Agrário (único aprovado no concurso de 2012). Advogado, parecerista e árbitro. Instagram: @profcarloselias e @direitoprivadoestrangeiro.

Flauzilino Araújo dos Santos, 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de SP e presidente do Operador do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico (ONR). Diretor de Tecnologia do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil - IRIB. Licenciado em Estudos Sociais, bacharelado em Direito e em Teologia e mestrado em Direito Civil. Autor de livros e de artigos de Direito publicados em revistas especializadas. Integra, atualmente, a Comissão de Concurso Público para outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de Alagoas, realizado pelo CNJ.

Hercules Alexandre da Costa Benício, doutor e mestre em Direito pela Universidade de Brasília. É tabelião titular do Cartório do 1º Ofício do Núcleo Bandeirante/DF; presidente do Colégio Notarial do Brasil - Seção do Distrito Federal e acadêmico ocupante da Cadeira nº 12 da Academia Notarial Brasileira. Foi Procurador da Fazenda Nacional com atuação no Distrito Federal.

Ivan Jacopetti do Lago, diretor de Relações Internacionais e Coordenador Editorial do IRIB. Bacharel, mestre e doutor em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP. Pós-graduado pelo CeNOR - Centro de Estudos Notariais e Registrais da Universidade de Coimbra e pela Universidade Autónoma de Madri (Cadri 2015). 4º Oficial de Registro de Imóveis de SP.

Izaías G. Ferro Júnior é oficial de Registro de Imóveis, Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas e de Títulos e Documentos da Comarca de Pirapozinho/SP. Mestre em Direito pela EPD - Escola Paulista de Direito. Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP. Professor de graduação e pós-graduação em Direito Civil e Registral em diversas universidades e cursos preparatórios.

Sérgio Jacomino é presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) nos anos 2002/2004, 2005/2006, 2017/2018 e 2019/2020. Doutor em Direito Civil pela UNESP (2005) e especialista em Direito Registral Imobiliário pela Universidade de Córdoba, Espanha. Membro honorário do CeNoR - Centro de Estudos Notariais e Registais da Universidade de Coimbra e Quinto Oficial de Registro de Imóveis da cidade de SP.