I - Introdução: a economia do mar
O potencial econômico dos oceanos e dos recursos naturais presentes no leito marinho são bastante conhecidos, mas ainda reservam surpresas e potenciais inexplorados. Um dos recentes exemplos do aproveitamento desse enorme potencial foi o expressivo e repentino aumento do Produto Interno Bruto (PIB) da Guiana, uma das menores economias da América do Sul. O país atingiu o maior crescimento do mundo no ano de 2022, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), decorrente da exploração de petróleo e gás natural offshore. A expectativa de crescimento nos próximos anos é de impressionantes 25%.
No Brasil, o Ministério de Minas e Energia (MME) prevê que a região chamada Margem Equatorial, que será tratada em maior detalhe adiante, tem potencial de gerar US$56 bilhões em investimentos, além de uma arrecadação da ordem de US$200 bilhões e geração de 350 mil empregos. Tais números ajudam a entender como uma nova onda de exploração do potencial econômico dos recursos encontrados no leito marinho podem significar impactos relevantes para a conjuntura atual do país, a exemplo do que ocorreu com o início do desenvolvimento do pré-sal anos atrás.
De fato, a economia do mar é de suma importância para o país, não apenas em razão dos recursos naturais presentes em seu leito. Na prática, cerca de 95% de todo o volume de comércio exterior é realizado em Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB), por vias marítimas, realçando a grande importância do setor Marítimo e Portuário no funcionamento amplo da economia marinha e global. Aproximadamente 1.500 navios mercantes navegam em nossas águas todos os dias, dando uma dimensão da quantidade de mercadorias, empregos diretos e indiretos, bem como recursos econômicos que circulam em águas brasileiras.
No presente artigo, será abordado, brevemente, o potencial econômico, ainda relativamente desconhecido para os operadores do Direito do Mar, da Margem Equatorial.
II - Margem Equatorial
Em 2006, o setor de óleo e gás no Brasil teve seu horizonte expandido para o alto mar de maneira, até então, inimaginável. Com a descoberta do pré-sal, o país viu seus prognósticos de produção aumentarem, sua economia efervescer e sua dependência internacional de importação diminuir. Contudo, apesar de ter correspondido, em fevereiro de 2023, a 78,1% da produção total do país, o pré-sal está longe de ser uma fonte inesgotável – como salientado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em recente fala em audiência no Câmara.
Essa questão leva o mercado a pensar em como suprir a possível demanda futura de produção. E, nesse cenário de possibilidades, a exploração na Margem Equatorial brasileira desponta como uma das opções.
Margem Equatorial, deve-se esclarecer, é o nome dado à região que se estende por mais de 2.200 quilômetros desde o Amapá até o Rio Grande do Norte, e abrange 5 bacias em alto-mar (Bacia Foz do Amazonas, Bacia Pará-Maranhão, Bacia Barreirinhas, Bacia do Ceará e Bacia Potiguar). O potencial petrolífero dessas bacias é considerável, principalmente em razão das recentes descobertas em outras regiões próximas, como é o caso da Guiana, Suriname e Guiana Francesa – que, juntas com a Margem Equatorial Brasileira, formam a Margem Atlântica Equatorial Sul-Americana (MAESA) – e das descobertas na Margem Conjugada Africana, no oeste da África, que possuí o mesmo contexto geológico e também sugere elevado potencial. Confira-se uma ilustração da região:
A primeira descoberta na área ocorreu no campo Zaedyus (na Guiana Francesa), em 2011 e na qual já atuam 24 empresas e onde ocorreram 60 descobertas com volume estimado de 11 bilhões de barris. Desde então, as características do óleo e estimativa de volume existente vêm chamando a atenção da indústria. Somente na Guiana, por exemplo, foram aprovadas seis plataformas que atingirão a marca de 1,2 milhão de barris por dia em 2027, valor este que supera o campo de Tupi, maior produtor brasileiro (PAMPLONA).
Na porção brasileira, a expectativa transformou-se em números, com as estimativas do Ministério de Minas e Energia (MME) de cerca de 10 bilhões de barris de petróleo na região. Tamanha é a expectativa, que o plano estratégico da Petróleo Brasileiro S.A (Petrobras) para o período de 2023 a 2027 prevê investimentos na casa de US$ 2,9 bilhões na região – valor que supera o investido em novas bacias do Sudeste –, com perfuração de 16 poços a partir do 1º trimestre de 2023.
III - Rodadas ANP e o processo de E&P
No Brasil, como o subsolo, e os recursos naturais dele advindos, são propriedade da União, uma das formas de se explorar petróleo e gás natural é por meio de licitações públicas. Essas rodadas de licitação são processos abertos e competitivos, organizados pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Assim, empresas estatais ou privadas adquirem o direito de explorar e produzir nos blocos em que apresentaram ofertas vencedoras nos leilões. Uma vez no bloco que arrematou, a empresa inicia a fase de exploração, responsável pelo estudo de viabilidade exploratória e comercial do bloco, para que depois, em caso de perspectiva positiva, apresente um plano de desenvolvimento à ANP e faça da área obtida um campo produtor de petróleo e/ou gás natural.
O debate acerca da exploração da Margem Equatorial remonta à década de 1970, quando ocorreram as primeiras perfurações, sem grandes descobertas – possivelmente pela falta de tecnologia presente à época. Em 2013, na 11ª rodada de licitações, os blocos da bacia foram disputados e acabaram arrematados por um consórcio formado por três empresas, sendo que duas delas desistiram das operações ao longo dos últimos três anos. Atualmente, são 42 blocos exploratórios na região.
IV - Análise Econômica dos oceanos
No cenário atual, o maior debate acerca do tema dá-se em relação ao indeferimento do pedido de licença, apresentado pela Petrobras, para exploração do poço FZA-M-59, em maio, por parte do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). Isso porque, à época da negação do pedido, o IBAMA fez algumas observações acerca do tema, como a necessidade de uma Análise Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), um estudo que mostre a direção para onde iria o óleo em caso de vazamento e uma análise do efeito do projeto sobre a movimentação do aeroporto do Oiapoque (AP) e os possíveis impactos de todo o processo sobre as comunidades indígenas que vivem na região. A primeira exigência foi superada recentemente, quando a AGU realizou um parecer vinculativo que descartou a necessidade da AAAS para a perfuração de poço exploratório. As demais exigências ainda serão discutidas em um debate técnico previsto para ocorrer na Câmara de Mediação e Conciliação da AGU, que ainda deverá ser convocado.
Contudo, por aqui, nosso objeto de análise, o protagonista da lâmina de nosso microscópio, é o impacto econômico que essa possível exploração, conquanto viável do ponto de vista ambiental e preservativo, pode ensejar na economia azul.
Economia azul, segundo o Banco Mundial, é o termo que se refere ao uso sustentável dos recursos oceânicos para o crescimento econômico, a melhoria dos meios de subsistência e do emprego, preservando a saúde do ecossistema. Segundo informações da Marinha, o Brasil possui jurisdição sobre uma área oceânica com cerca de 5,7 milhões de quilômetros quadrados, valor equivalente a mais da metade da nossa massa terrestre e que é origem de 19% do PIB de nosso país.
V - Conclusão
Por fim, observamos que, embora ainda gere um debate entre o setor energético e o setor ambiental, a exploração e produção de petróleo na Margem Equatorial brasileira serve como uma forma de reverberarmos uma possível efervescência produtiva no mercado de óleo e gás do país com seus impactos em nossa economia azul, fundamental para um futuro produtivo e sustentável, a fim de vislumbramos quais serão os resultados da confirmação desse grande potencial, até agora, oculto.
Bibliografia:
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Petrobras. “Nossas novas Fronteiras de Exploração”. Disponível aqui.
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Marinha do Brasil. “Planejamento Espacial Marinho.” Disponível aqui.
O Eco. "Há 8 anos na Câmara, projeto que cria uma lei para o mar ainda não tem votação à vista." Disponível aqui.
Poder 360. “Margem Equatorial pode receber R$ 11 bi para exploração de 42 blocos. Disponível aqui.