Migalhas de IA e Proteção de Dados

Os desafios jurídicos reflexos do metaverso - "Tudo o que pode ser e ainda não é"

Aliado ao movimento de robotização algorítmica de tribunais como forma de gerar melhor resposta da justiça, independente das ferramentas tecnológicas deve-se observar as premissas e pressupostos de cidadania.

20/5/2022

A ambiência do metaverso e suas perspectivas 

Este despretensioso artigo tem a função de buscar a reflexão sobre o desenvolvimento das relações entre   pessoas e de negócios e os seus possíveis desdobramentos jurídicos em metaverso, com os consequentes desafios inerentes, além de pretender ser o piloto de uma série temática específica destinada a esta coluna de proteção de dados, coordenada com excelência pelos nobres professores. 

Preocupa-nos, entre outros temas que serão colocados ao longo deste artigo, a questão da proteção dos titulares de dados pessoais, enquanto usuários dos espaços e ambientes de metaverso. 

Há uma incógnita sobre a  coleta e a utilização de dados pessoais que formam o rastro digital deixado pelo usuário em sua navegação nestes espaços virtuais, sejam dados estruturados não estruturados, gerando uma possível coleta para  conjugação com várias bases contidas em  bancos de dados públicos, privados e redes sociais e inserção em sistemas de processamento no modelo big data analytics, possibilitando o fomento do perfilamento, classificação  e interpretação que possa realçar a construção de um potente perfil deste usuário ou gerar a sua ressignificação, a partir da análise da tendência de consumo e de suas preferências, refletindo na vida real e podendo gerar discriminação algorítmica.1

A terminologia metaverso  foi originariamente  grafada no  romance de ficção científica intitulado  "Snow Crash" (Nevasca), de Neal Stephenson, lançado em 1992 e é  utilizada na atualidade  para indicar um tipo de mundo virtual construído a partir de plataformas tecnológicas  que buscam replicar a realidade, formando  um espaço coletivo e virtual compartilhado, constituído pela soma de "realidade virtual", "realidade aumentada" e "Internet".2

Estas plataformas estão capacitadas para as mais diversas especificidades e características, formando espaços não territoriais onde há imersão e interação de pessoas, por meio de imagens criadas e projetadas ou, ainda, por instrumental disponibilizado para as mais diversas atividades, gerando-se ambientes e mundos paralelos reverberados em realidade virtual, que podem ter inúmeros  pontos de contato e interação com o mundo real, possibilitando experiências intelectuais, neurológicas, visuais e, recentemente, sensoriais e olfativas.

Acreditando que o metaverso possa ser o caminho futuro provável  da internet e da tecnologia, Mark Zuckerberg, CEO do Facebook, combinou aspectos de realidade virtual com dados sociais da mencionada rede, aliado à  promessa de gerar uma nova experiência de uso do espaço virtual,  e , a partir do ano 2021, realizou a modificação estrutural de sua empresa que passou a denominar-se Meta Platforms Inc., caminhando  mais assertivamente para a construção de tecnologias voltadas para a ampliação de atividades interativas em metaverso.  

A ambiência de metaverso e a expansão da experiência de uso e interação entre pessoas de forma tal que se possa replicar as atividades e negócios dos mundos reais, além de ampliar as redes de relacionamento, decorre da evolução tecnológica das plataformas, com o concurso de tecnologias informacionais e de inteligência artificial que proporcionam a experiência da realidade aumentada.

Via de regra, estas experiências são concretizadas e exteriorizadas através da possibilidade de o usuário criar o seu próprio Avatar, vocábulo que advém de crença hinduísta que prega a materialização de um ser supremo, divino e celeste na terra, que pode assumir forma humana ou animal. São espíritos de divindades que ocuparão corpos terrestres, como exemplo Krishna e Rama, que são avatares do Deus Vixnu (Vishnu), responsável pela sustentação do universo.3

A palavra avatar foi apropriada em seu sentido figurativo, para significar o processo metamórfico de transformação e mutação onde o ingressante ao metaverso cria uma persona interativa que será dirigida em todas as extensões de sua personalidade neste mundo paralelo, a partir de ferramentas e Inteligência Artificial (I.A), que contribuem para desenvolver as tarefas e atividades quotidianas deste ambiente, gerando a interação e interface entre a realidade aumentada e o mundo real.  

Metaverso como campo de interação e desenvolvimento de relações sociais e negócios

Entre o final dos anos noventa e início deste século,  foram  comercialmente desenvolvidas e implantadas as plataformas que buscavam gerar as  atividades e experiências em metaversos, entre os quais situam-se Active worlds em 1995, There.com;  Blaxxun  e  a denominada Second Life (S.L) que foi criada no ano de 2003  pela Linden Lab – empresa   fundada por Philip Rosedale em 1999, além de outras voltadas para a simulação de realidade como a OpenSimulator de 2007.  

Muito embora no curso do tempo, se tenha pretendido transformar o S.L em um ambiente ativo e tecnológico de realidade virtual,  com o concurso de   parceria  desenvolvida com a empresa  Sansar Social Reach, recentemente houve  modificação  desta trajetória, com o  anúncio  da venda da  plataforma S.L. para a startup  Wookey Project Corp. que seguirá na operação, como noticiado.4

Com o propósito de  criar uma realidade paralela onde usuários poderiam jogar, socializar, trabalhar, comprar e vender propriedades, entre outras atividades, houve muito interesse destes nos primeiros anos de atividades e, dependendo do tipo de uso,  a plataforma funcionava como um jogo, um mero simulador, um comércio virtual ou uma rede social.

Com experiências gráficas de tridimensionalidade, havia premissa de liberdade  na oferta deste ambiente, incentivando o usuário a ingressar em uma  nova vida paralela onde poderia ser e se transformar  no que pretendesse,  sem limites para a criatividade, em ambiente de liberdade e  economia virtual própria, complementado com o elemento de rede  social que  possibilitava interação estrita,  relacionamentos amorosos virtuais e reais.

O sistema era  formado por duas partes: o cliente que ingressava  através de um download no site oficial, passando a operar e construir os seus  espaços  interativos e o servidor. Na comemoração dos 10 anos do lançamento do jogo, a Linden Lab anunciou que o Second Life ganharia conexões externas. Com isso, trouxe suporte oficial do Facebook, em uma tentativa de criar uma experiência melhor integrada entre a vida real e virtual, das pessoas que poderiam compartilhar as suas fotos, entre outros interesses.

Este metaverso possuía jornal interno (S.L.Herald), negócios  e economia própria e nestes tantos anos de funcionamento, passou por dezenas de patchs de atualização, gerando evolução tecnológica com reflexos na percepção do usuário, tanto nos efeitos  visuais  e de iluminação dos ambientes, como nas feições e características dos avatares, que passaram a ser dotados de mais animação e de vozes.

Mesmo que hoje se expandam negócios virtuais de criptoativos ou criptomoedas, é fato que o sistema  S.L, desde seu inicio de operação, criou uma  moeda própria denominada Linden Dollar (também grafado como L$), levando o mesmo nome da empresa mantenedora (Linden), que obviamente não teria valor algum direto no "mundo real".

Todavia, apesar de não ter valor real direto, o Linden Dollar poderia ser convertido para dólares americanos e também era  possível  comprar Linden Dollar através do sites especificos e com o uso de cartão de crédito internacional, respeitando sempre os limites pré-estabelecidos pela administração do sistema.

A moeda virtual possuía valor flutuante em relação ao dólar americano, ou seja, seu valor poderia variar a qualquer momento. Em 25 de maio de 2007 cada Linden Dollar estava valendo aprox. R$ 0,0077 (menos de um centavo de real) e hoje um  Linden Dollar é igual a $0.00313 (USD).5

Do ponto de vista jurídico, a empresa servidora destas plataformas, pode ser vista como provedora de conteúdo multidisciplinar onde há relação de consumo entre usuários (operadores de avatares) e o criador do sistema operacional. Há também uma relação de consumo entre fornecedores de produtos e serviços em ambiente virtual quando estes se refletem no mundo material, após a aquisição efetivada no ambiente de metaverso, por meio de avatar, mas operada por consumidor real.

Há relação contratual entre as partes sempre que esta for a natureza das mesmas e houver a vontade de se efetivar negócios jurídicos com repercussão interna ou externa.

Pode haver relações assemelhadas às existentes em mundo real, quando da interação entre estes dois mundos. (Exemplo. Compra e venda de bens e imóveis em espaço virtual ou no mundo real.  Direito sucessórios sobre eventuais direitos de uso ou apossamento de bens e áreas virtuais obtidos em metaversos e que foram instrumentalizados pela pessoa através de seu avatar, etc.)

Não são poucos os demais exemplos de metaversos destinados às inúmeras atividades especificas, entre os quais se apresentam Star Wars Galaxies- Lineage- Ever Quest - GuildWars- Torneo Poker. Há ainda o Decentreland, a   VRChat que  é uma plataforma online de mundos virtuais, criada pela VRChat, Inc em 2014 para permitir a  interação direta entre os usuários através de voz e gestos, possibilitando maior imersão com o uso de Óculos de R.V. e a criação de seu próprio mundo ou avatar semelhantes ao usuário  na vida real, ou destoando da realidade, podendo criar personagens fictícios, monstros, dentre outros, como também criar mundos que simulem um ambiente real, como um bairro ou escritório.

E, finalmente, tanto o  Roblox que  foi criado em 2006 como metaverso de múltiplos jogos e atividades integradas a outros desenvolvedores, como o  Fortnite, que a partir da Battle royale, permite assistir a curtas animados e apresentações musicais, são metaversos utilizados mundialmente  também por crianças e adolescentes, ensejando o necessário cuidado e a proteção adequada.

Inúmeras experiências culturais e educacionais foram testadas e implementadas em metaversos desde a criação destes ambientes. O Museu de História Natural de Florença apresentou em S.L. a mostra Maskio-La Natura dell”uomo que somente aconteceria no mundo real, tempos depois. A Universidade de Harvard implantou em metaverso uma unidade, em experiência seguida à época no Brasil, por inúmeras universidades públicas e privadas brasileiras que pretendiam instalar neste metaterritorio, um ponto de presença visando a ampliação de suas atividades e serviços educacionais.6

Segundo informes da época (19/08/2007) em busca de experiências no mundo virtual 3D e relacionamentos com empresas e instituições de ensino internacionais, as Universidades USP, PUC-SP, Cásper Líbero e Mackenzie, ao lado da UNB e da Universidade Federal de Minas, ganharam auditório e terreno, numa parceria com a IG/Kaizen, para desbravar o mundo virtual.7

Talvez ainda não se tenham elementos concretos e análises de resultados destas experiências educacionais, todavia é fato que estas são reais e alvissareiras e, com o incremento tecnológico, ampliam-se as possibilidades de ensino mais assertivo da experiencia de sala de aula, a partir de ambiente possibilitado pelas inovações e evolução tecnológica de metaverso.

Registra-se neste campo, o produto desenvolvido pela Meta, consistente da idealização de luvas hápticas sensíveis ao tato, capazes de transmitir sensações interativas ao usuário, com relação aos objetos virtuais para o mundo real, que podem ser ampliadas quando aliadas ao uso dos óculos RV, gerando experiência visual e sensorial inimaginável.8

 No campo dos negócios empresariais, também foram inúmeros os projetos e as experiências implantadas em metaverso, desde as experiências pioneiras como a da Petrobras que transmitiu palestra técnica simultânea ao mundo real, em S.L. em auditório virtual composto por avatares funcionários e executivos convidados.

No segmento dos negócios imobiliários, Incorporadoras, construtoras e comercializadoras, criaram cópias virtuais de edifícios que lançariam no mundo real onde os consumidores poderiam interagir em três dimensões e decorar os apartamentos além de terem a experiência de realidade ampliada.

Instituições Financeiras como o Banco Wells Fargo, constituíram ferramentas hábeis para operação e ofertas em metaverso. Empresas como a IBM aceleraram o seu ingresso nos mundos virtuais, com um investimento de cerca de milhões de dólares para a expansão de sua presença no popular universo tridimensional. A loja da Bumbum Ipanema foi uma das primeiras lojas virtuais a se instalarem em SL, para oferta de produtos de marca real da moda brasileira.

A potencialidade de negócios em metaverso com reflexos no mundo real, já era conhecida desde seu lançamento. Tornou-se emblemático à época, o caso Anshe Chung Studios instalado em S.L para operações relacionadas ao mercado imobiliário por meio de seu avatar de mesmo nome, operado por Ailin Graef como proprietária virtual de imóveis e realizadora de negócios de compra, desenvolvimento, aluguel ou revenda de terrenos virtuais, contabilizando uma fortuna de mais de US$ 1 milhão nestas operações, culminando por ser objeto de matérias em diversos periódicos mundiais.9

As empresas operadoras destas plataformas, estão permitindo que indivíduos criem e titularizem avatares que possam se candidatar a empregos e construir carreiras no metaverso, ganhando dinheiro real.

As oportunidades empreendedoras em metaverso são incontáveis, a exemplo da realização de operações de tokenização de avatares e de bens internos. Recentemente foi noticiado que a empresa sediada em Cingapura OWNFT World planeja lançar o projeto 'Guardiões da Moda', ou GOF, fruto de sua parceria com a Warner Music Group e com redes de streaming e marcas de moda, para produzir vídeos e shows.

 Fruto desta operação, serão criados 6.888 tokens não fungíveis de avatares (Non-Fungible Token - NFTs) construídos na blockchain Ethereum, onde cada usuário poderá lançar seu avatar NFT - que custará 0,18 ETH (R$ 2,7 mil) cada - para estrelar em desfiles de moda virtuais, videoclipes e séries animadas. Segundo noticiado, quando um avatar é lançado em um programa ou vídeo, seu proprietário recebe uma parte da receita por meio de tokens da comunidade GOF, que podem ser trocados por outros ativos digitais como stablecoins, uma classe de criptomoedas atrelada a um ativo de reserva 'estável' como dólar americano, por meio de uma bolsa descentralizada.10

Serviços jurídicos e de justiça operados em metaverso

Já no campo dos serviços jurídicos, o exercício da advocacia por meio de escritórios instalados em ambiente virtual nos moldes SL, não é novidade. A Seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil emitiu posição no Proc. E-3.472/2007 de 18/07/2007 que foi ementada da seguinte forma: "Exercício da advocacia - escritório em ambiente virtual second life - sigilo profissional e inviolabilidade do escritório inexistentes - ausência de relação de pessoalidade - vedação - publicidade por meio da prestação de serviços advocatícios em jogo virtual - impossibilidade."

O ponto fulcral desta questão, residiu no fato do reconhecimento pela entidade de classe de que   o Second Life, além de um jogo, constitui um ambiente de relacionamento online que oferece a possibilidade de realização de negócios com repercussão econômica e jurídica no mundo real. A utilização do referido ambiente por advogados para mero relacionamento ou jogo, escapa à competência da OAB.

No entanto, afirmou a OAB/SP que se o advogado utiliza o referido ambiente virtual para obter clientes, com ou sem remuneração, a quem serão prestados, no ambiente eletrônico ou fora dele, serviços advocatícios efetivos, as regras legais e éticas aplicáveis aos advogados, sem sombra de dúvida, hão de incidir.

Entendeu o órgão  de classe que, além da quebra do princípio da pessoalidade que deve presidir a relação cliente-advogado,  não há como garantir-se o sigilo profissional do advogado, o que inviabiliza a abertura e manutenção de um escritório virtual de advocacia, por sua própria natureza, pois não se revestiria da basilar inviolabilidade e do indispensável sigilo dos seus arquivos e registros, contrariando o direito-dever previsto no art. 7º, II, do EAOAB , além do que a  publicidade,  não se coadunaria com os princípios insculpidos no CED e no Prov. 94/2000 do Conselho Federal.11

Recentemente a ConJur retomou o tema e ouviu especialistas da matéria  que foram unânimes no sentido de se manter cautela nas atividades de advocacia em metaverso, apresentando os desafios futuros decorrentes da preservação da privacidade, dos valores éticos da classe e da proteção dos dados dos titulares.12

Mas, é fato que, se a tecnologia prosseguir em expansão, muitos dos negócios do mundo real serão replicados nos metaversos concernentes e apropriados, gerando a ampliação de redes de distribuição de produtos e de serviços de forma globalizada.

Neste contexto, escritórios prestadores de serviços jurídicos sediados em países que possuam menor potencial restritivo à advocacia, terão destaque na oferta e na captação de demandas, além de proporcionar aos clientes, novas formas e experiências de atendimento eficiente, sem desprezo da qualidade.

Considerando-se que metaversos situam-se em espaços não territoriais, importante discussão sobre níveis de eticidade e de cumprimento de regras locais nos países de origem, com relação aos seus órgãos de classe ocorrerão.

Todavia, como a OAB se flexibiliza em vários pontos, a exemplo da publicidade e informação da advocacia, consoante se depreende do provimento nº 205/2021 que trata, inclusive, de marketing jurídico na publicidade, decerto a visão inicial mencionada, passará também por transformação para possibilitar o exercício de atividades especificas de advocacia em metaverso, respeitados os regramentos éticos.13 

Já no tocante às atividades voltadas para a solução de conflitos em metaverso ou, ainda, o uso deste ambiente para facilitar a realização da justiça, observamos que  há experiências pioneiras como a levada à efeito pelo Ministério da Justiça de Portugal que lançou no ano de 2.007, uma plataforma para operar em metaversos o que denominou de "E-Justice Centre", que era consistente de uma corte com atendimento diário e aberta a todos os residentes do mundo virtual  Second Life. Esta experiência contemplou também um centro de mediação e arbitragem, que visava gerar a segurança necessária para transações comerciais e outros tipos de relações virtuais.14

Tratava-se de uma espécie de tribunal exclusivo para causas "intramundo", que julgava avatares, e não seus representantes no mundo real. Em notícias da época, observou-se que o serviço era prestado em português, e deveria atrair avatares brasileiros.

O lançamento foi feito pelo Secretário de Estado da Justiça da época, João Tiago Silveira que informou que o "E-Justice Centre" seguiria as leis do país de origem dos avatares. Em caso de nacionalidades diferentes, se levaria em conta a legislação norte-americana (onde estavam os servidores da Linden Lab à época) e o direito internacional.  Não se tem notícias atuais acerca da evolução destes modelos buscando a solução de conflitos em metaverso, mas, pode ser um dos tantos caminhos e uma tendência na busca da pacificação social.15 

Já no que tange ao uso do metaverso no cenário judicial brasileiro,  Conselho Nacional de Justiça (CNJ)  pretende construir uma plataforma blockchain até 2030, para gerar mais eficiência e transparência nas atividades jurisdicionais.

A utilização de tecnologia e de I.A., possibilitará que certas atividades do dia a dia possam ser desenvolvidas também em metaversos, como sistemas de audiência judicial.

Recentemente, o Conselho Nacional de Justiça realizou uma audiência pública com vistas a buscar a padronização dos Portais dos Tribunais para uniformizar a linguagem para uma comunicação integrada entre os tribunais e atingir o maior acesso dos cidadãos aos serviços da Justiça.16 

A possibilidade de exploração das tecnologias voltadas ao metaverso e de blockchain, também é estudada em vários tribunais brasileiros.  Em evento recente realizado no Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), voltado para a discussão de um Judiciário Exponencial como desafio para a justiça, estes temas foram tratados com acuidade, com destaque para o potencial de uso das criptomoedas e blockchain, além da Regulação do metaverso como um dos novos desafios da justiça.17 

Onde há economia, deve estar também o Direito na sua principiologia e amplitude protetiva. Os desafios do metaverso são relevantes e merecem amplo debate temático, visando a possibilidade de sua utilização para fomentar riquezas e desenvolver atividade empresarial ordenada, sem se afastar de conquistas sociais e dos direitos à privacidade, proteção do titular de dados pessoais e dignidade da pessoa humana.

Além dos cuidados específicos para se detectar preventivamente que metaversos se transformem em bolhas sistêmicas que possam gerar prejuízos incomensuráveis aos usuários, há que se ter atenção para com a possibilidade de criação de metaversos em ambientes hostis no modelo “deep web”, gerando ou visando ilicitudes das mais diversas.

Temas desafiadores merecem o olhar dos pesquisadores, entre os quais elencamos a  solução de  controvérsias  e a  prestação de serviços  jurídicos em metaterritório, arbitragem em ambiente virtual, jurisdição e  legislações aplicáveis  em  caso de conflito, questões voltadas para a relação de trabalho e Inclusão social em geral e de pessoas portadoras de necessidades especiais; relação de consumo e oferta  em metaverso; cybercrimes, lavagem de dinheiro e pedofilia em ambiente digital, no sentido de se coibir a prática por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente, nos termos do Art. 241-A do ECA.

Enfim, aliado ao movimento de robotização algorítmica de tribunais como forma de gerar melhor resposta da justiça, na replicação de modelos jurídicos usuais para ambientes externos como metaversos, independente das ferramentas tecnológicas deve-se observar as premissas e pressupostos de cidadania.

Conclusão

Se através do metaverso e das tecnologias, se pode criar uma vida paralela e um "persona" que se animará nestes "mundos", deve-se guardar sintonia para que nestas interações, não se reduzam as conquistas sociais e econômicas do “mundo real”, afastando-se os padrões negativos e hostis que geram tanta destruição e desconformação.  

Caberá aos usuários de  nosso tempo e aos criadores desta ambiência virtual, guardar comprometimento com as conquistas sociais e princípios constitucionais, objetivando a  evolução social,  em qualquer dos mundos que se resolva habitar ou interagir, sempre preservadas as suas característica criadoras e objetivos, contribuindo para o aperfeiçoamento das instituições e, consequentemente, a melhoria do mundo real, sempre com a certeza de que o metaverso,  na forma como ora se instituiu e se apresentou, é  tudo o que pode ser e ainda não é.

Referências

1 Disponível aqui

Disponível aqui

3 Disponível aqui

4 Disponível aqui

5 Disponível aqui

6 Disponível aqui

7 Disponível aqui

8 Disponível aqui

9 Disponível aqui

10 Disponível aqui

11 Disponível aqui 

12 Conjur

13 Conjur

14 Disponível aqui.

15 Disponível aqui.

16 Disponível aqui.

17 Disponível aqui.

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Coordenação

Cintia Rosa Pereira de Lima, professora de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP Ribeirão Preto – FDRP. Doutora em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP com estágio na Ottawa University (Canadá) com bolsa CAPES - PDEE - Doutorado Sanduíche e livre-docente em Direito Civil Existencial e Patrimonial pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (USP). Pó-doutora em Direito Civil na Università degli Studi di Camerino (Itália) com fomento FAPESP e CAPES. Líder e Coordenadora dos Grupos de Pesquisa "Tutela Jurídica dos Dados Pessoais dos Usuários da Internet" e "Observatório do Marco Civil da Internet", cadastrados no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq e do Grupo de Pesquisa "Tech Law" do Instituto de Estudos Avançados (IEA/USP). Presidente do Instituto Avançado de Proteção de Dados – IAPD - www.iapd.org.br. Associada Titular do IBERC - Instituto Brasileiro de Responsabilidade Civil. Membro fundador do IBDCONT - Instituto Brasileiro de Direito Contratual. Advogada.

Cristina Godoy Bernardo de Oliveira, professora doutora da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo desde 2011. Academic Visitor da Faculty of Law of the University of Oxford (2015-2016). Pós-doutora pela Université Paris I Panthéon-Sorbonne (2014-2015). Doutora em Filosofia do Direito pela Faculdade de Direito da USP (2011). Graduada pela Faculdade de Direito da USP (2006). Líder do Grupo de Pesquisa Direito, Ética e Inteligência Artificial da USP – CNPq. Coordenadora do Grupo de Pesquisa "Tech Law" do Instituto de Estudos Avançados (IEA/USP). Membro fundador do Instituto Avançado de Proteção de Dados – IAPD.

Evandro Eduardo Seron Ruiz, professor Associado do Departamento de Computação e Matemática, FFCLRP - USP, onde é docente em dedicação exclusiva. Atua também como orientador no Programa de Pós-graduação em Computação Aplicada do DCM-USP. Bacharel em Ciências de Computação pela USP, mestre pela Faculdade de Engenharia Elétrica da UNICAMP, Ph.D. em Electronic Engineering pela University of Kent at Canterbury, Grã-Bretanha, professor lLivre-docente pela USP e pós-Doc pela Columbia University, NYC. Coordenador do Grupo de Pesquisa "Tech Law" do Instituto de Estudos Avançados (IEA/USP). Membro fundador do Instituto Avançado de Proteção de Dados – IAPD.

Nelson Rosenvald é advogado e parecerista. Professor do corpo permanente do Doutorado e Mestrado do IDP/DF. Pós-Doutor em Direito Civil na Università Roma Tre. Pós-Doutor em Direito Societário na Universidade de Coimbra. Visiting Academic na Oxford University. Professor Visitante na Universidade Carlos III, Madrid. Doutor e Mestre em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil – IBERC. Foi Procurador de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais.

Newton De Lucca, professor Titular da Faculdade de Direito da USP. Desembargador Federal, presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (biênio 2012/2014). Membro da Academia Paulista de Direito. Membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Membro da Academia Paulista dos Magistrados. Vice-presidente do Instituto Avançado de Proteção de Dados.