De acordo com o art. 17 da LGPD, "Toda pessoa natural tem assegurada a titularidade de seus dados pessoais e garantidos os direitos fundamentais de liberdade, de intimidade e de privacidade, nos termos desta Lei". O dispositivo referencia três direitos fundamentais. A conjugação entre eles transcende a visão tradicional do direito à propriedade de dados, acenando explicitamente para a sua dimensão existencial e, implicitamente para um direito fundamental autônomo à proteção de dados pessoais.
Talvez seja a hora para que, de forma sucinta, possamos estabelecer as premissas de direito civil subjacentes ao referido preceito normativo e a sua fundamentalidade como reação principiológica a uma lógica de mercado que fragiliza as premissas teóricas edificadas no final do século XX por juristas como Gustavo Tepedino, Luiz Edson Fachin, Maria Celina Bodin e Paulo Luiz Neto Lôbo.
Uma expressão consagrada em nosso direito civil constitucional é a "personalização do direito privado". Trata-se de uma ideia persuasiva que pode ser compreendida de várias formas, sendo a que me parece mais elucidativa é a da funcionalização das situações patrimoniais às existenciais, vale dizer, a repressão às iniciativas econômicas que desconsiderem a pessoa como fundamento e fonte da ordem jurídica.
Esta diretriz impulsionou doutrina e tribunais a reformular as relações de pertencimento e trânsito de titularidades, de forma a não restringir desproporcionalmente direitos fundamentais. Tal movimento antropocêntrico é claramente aferível no RE 466.343/2008, oportunidade em que o Supremo Tribunal Federal afastou a possibilidade de prisão civil do depositário infiel como sanção por inadimplemento nos contratos de alienação fiduciária.1 Outrossim, o traço da personalização do direito civil é patente na Súmula 364 do STJ,2 ao estender a proteção do bem de família aos "singles", pois, a par da garantia geral dos credores, toda pessoa tem uma parcela de seu patrimônio afetada ao seu mínimo existencial.
Contudo, no campo negocial nem sempre é singela a distinção entre os espaços existenciais e patrimoniais. Como veste jurídico-formal de operações econômicas – na acepção de Roppo -, os contratos se adaptam as transformações socioculturais e não raro aquilo que a manualística descreve como direitos da personalidade convive pacificamente com o propósito lucrativo. Já estamos habituados com negócios jurídicos que refletem a prática social de aproveitamento da dimensão patrimonial de direitos de imagem, nome e privacidade, nos quais o consentimento do titular atua como permissão para a cessão onerosa do exercício de atributos existenciais, pela fixação de um preço para a intromissão por parte de terceiros em aspectos antes impenetráveis pelo mercado.
Como resposta a esta imprecisão quanto às fronteiras entre o "eu" e o mercado, a doutrina passou a considerar uma "relativa indisponibilidade" dos direitos da personalidade, no sentido de que o atributo da intransmissibilidade a que se refere o art. 11 do Código Civil3 concerne ao conteúdo das projeções existenciais, mas não à possibilidade de exercício temporário por outras pessoas naturais ou jurídicas, em contratos cujo objeto seja delimitado. Da mesma forma, deu-se interpretação mais ampla a parte final do referido dispositivo para se admitir a limitação voluntária de direitos da personalidade, considerando-se que, seguindo o livre desenvolvimento da personalidade, qualquer pessoa pode praticar atos de autocontenção da integridade psicofísica ou de sua intimidade, desde que se trate de prática socialmente justificada; evidencie-se o legítimo interesse do titular (e não um ato de heteronomia); seja o ato de limitação voluntária revogável a qualquer tempo e, por último, não ofenda Interesse de terceiros. Podemos ilustrar nestes critérios objetivos, a decisão de um lutador de participar de um campeonato de vale-tudo, ou a deliberação de qualquer pessoa de expor os aspectos recônditos de sua vida nas redes sociais.
Nada obstante, mesmo nesta turva mescla entre os nossos atributos essenciais e as exigências de afirmação da pessoa na ordem do mercado, dois muros de contenção ainda permanecem de pé:
A um, o vínculo orgânico entre a pessoa e os direitos da personalidade, tornando-os indestacáveis de seu titular, inviabilizando a transferência do nosso "cerne", seja a título gratuito como oneroso. Aquilo "que somos" não pode ser expropriado. Mantém-se o controle humano sobre o objeto, limites e duração dos atos negociais referentes às parcelas econômicas da personalidade, pois como requisito de validade, o contrato requer o consentimento livre e esclarecido do cedente. Em síntese, as situações existenciais ainda preservam o discrimen teórico perante as situações patrimoniais, pois se propriedade e créditos podem ser fraturados do titular, alienados e cedidos, preserva-se a aderência do ser humano ao seu modo de ser, pela potestade inerente aos direitos da personalidade de sujeitar a sociedade e o estado a não se imiscuir naquilo que constitui a pessoa, evitando-se a usurpação do que nos é indissociável.
A dois, em comum, as situações existenciais e patrimoniais se adequam ao conceito de "direitos subjetivos" pelo seu fundamento excludente. Tradicionalmente, assegura-se ao proprietário e ao contratante uma reserva de fruição de suas titularidades, associada à faculdade de afastar o poder público e particulares do monopólio do conteúdo de exploração, dotando tais direitos de tutelas inibitória e ressarcitória, sem se excluir uma pretensão reivindicatória em caso de violação à reserva de pertencimento. Igualmente, direitos da personalidade são dotados de uma eficácia defensiva em níveis preventivo e repressivo (art. 12, CC),4 tutelando-se os bens jurídicos intrínsecos não apenas em face de lesões – pela pretensão de reparação por danos extrapatrimoniais (art. 927, CC)5 – como diante de qualquer ameaça de prática ou reiteração de ilícitos, independentemente da ocorrência de um dano (parágrafo único, art. 497, CPC).6
Todavia, os direitos da personalidade transcendem os direitos subjetivos patrimoniais, por também serem dotados de uma eficácia ativa. Ao contrário da lógica econômica dos direitos patrimoniais, limitada ao direito de excluir, as situações jurídicas existenciais demandam o direito do ser humano à inclusão em sociedade. Não se trata apenas de um dever de proteção, mas também um dever de promoção, pois como reflete Dworkin,7 a dignidade é limite e tarefa, possuindo uma voz passiva e uma voz ativa que se conectam. A dimensão positiva da personalidade é materializada pelo livre desenvolvimento da personalidade no que concerne às deliberações existenciais fundamentais. Aqui ingressa a esfera de autodeterminação, pois o Estado Democrático de Direito reconhece no ser humano uma fonte de escolhas íntimas que deverão ser respeitadas.
A eficácia promocional das situações existenciais permite que a pessoa afirme o seu modo de ser, tornando-se protagonista de sua própria biografia, evitando-se a sua instrumentalização para fins heterônomos. Podemos ilustrar com a decisão do Supremo Tribunal Federal8 que permite a antecipação terapêutica do parto em caso de diagnóstico de anencefalia, prevalecendo a intimidade da gestante e a tutela a sua integridade psicofísica diante da inviabilidade de uma vida, afastando-se juízos morais estatais heterônomos. No mesmo diapasão, lembre-se decisão do STF9 quanto à extensão da união estável à casais homoafetivos. Em sociedades plurais, privilegia-se a privacidade do par em detrimento de uma concepção taxativa de entidades familiares. A autonomia existencial, implicitamente aludida no art. 15 do Código Civil,10 converte o consentimento informado em chave para a permissão de intervenções cirúrgicas ou tratamento, efetivação de negócios jurídicos que envolvam doação de órgãos e diretivas antecipadas quanto à vedação de distana'sia ou procedimentos médicos desproporcionais em situações de terminalidade da vida.
Entretanto, o cenário tecnológico disruptivo rapidamente erode os dois referidos muros de contenção que sustentam as colunas antropocêntricas daquilo que se convencionou chamar de "personalização do direito privado". Principiando pela afirmação dos direitos da personalidade em nível constitucional e legislativo, passando por um segundo momento de sua adaptação a economia de mercado – no qual a precificação de emanações comportamentais ainda encontra limites bem definidos – alcançamos um terceiro estágio, que denominamos "despersonalização da personalidade", materializável em três movimentos que subvertem as premissas humanistas do direito civil constitucional: a expropriação da personalidade; a ameaça à autonomia humana através de um ataque à consciência e a conversão do ser humano em um projeto de personalização.
Relativamente à expropriação da personalidade, como coloca Shoshana Zuboff,11 o intitulado "capitalismo de vigilância" não consiste em uma nova tecnologia, mas em uma nova forma de mercado que reivindica de maneira unilateral a experiência humana como matéria-prima gratuita para a tradução em dados comportamentais que são disponibilizados no mercado como produtos de predição que antecipam e modelam comportamentos futuros. A visão kantiana do ser humano como fim em si12 é desvirtuada por um instrumentalismo, cuja base é a expropriação de nossa personalidade em prol de finalidades alheias, pois a própria sociedade se torna objeto de extração e controle.
A realidade digital converte situações existenciais em uma nova propriedade baseada na despossessão da essência daquilo que nos define, através de uma modificação comportamental, cujo legado de danos pode custar a nossa própria humanidade. A edificação do livre-arbítrio proveniente da narrativa liberal provavelmente se desintegrará quando, mesmo em sociedades supostamente livres, depararmo-nos diariamente com instituições, corporações e agências governamentais que compreendem e manipulam o que até então era nosso inacessível reino interior.13
Nesta inédita forma de mercado a pessoa se atomiza no individuo, mero conjunto de algoritmos passíveis de comercialização. Infere-se que a noção de expropriação da personalidade rompe com um dos muros de contenção das situações existenciais, pois a renderização da experiência humana não equivale a uma simples cessão temporária do exercício econômico de nossa imagem, intimidade ou nome, porém do próprio confisco do conteúdo daquilo que nos singulariza, para posterior operação lucrativa no insaciável mercado de comportamento futuro. Em síntese, ao contrário da previsão do art. 11 do Código Civil, os direitos da personalidade se tornam "absolutamente disponíveis" e suscetíveis de limitação heterônoma.
Prosseguindo, o segundo movimento de "despersonalização da personalidade" consiste na ameaça à autonomia humana através de um ataque à consciência. A autonomia é a pedra angular do direito privado, significando a "regulação pelo eu", não apenas na órbita econômica – filtrada pelo conceito de "capacidade" - como pela aptidão da pessoa gerir os seus pensamentos, emoções e desejos. Paradoxalmente, o processo de despossessão do "eu" se dá em dois níveis: não apenas dispensa o nosso consentimento (informado ou não), como a nossa própria consciência quanto à expropriação da experiência humana.
Não se trata de uma violação ao direito de escolha por meio de contrato de adesão, porém do emprego de técnicas que induzem à modificação comportamental, substituindo o imperativo categórico Kantiano por imperativos de predição. Como explica Sartre,14 não basta ter vontade, é necessário ter "vontade de ter vontade". A habilidade de premeditação e a autoconsciência nos tornam serem autônomos que projetam escolhas e realizam julgamentos morais. Perde-se este fator civilizatório quando ferramentas de predição tomam de assalto a mente inconsciente, intervindo no momento certo para em um "nudge" provocar uma contratação de bens ou serviços, impondo uma alteração no futuro a revelia do sujeito.15
O inusitado é que a expropriação da experiência humana não se dirige às informações escritas, componentes verbais ou imagens. Na economia da emoção, não somos escrutinizados pelo conteúdo, e sim de maneira sutil e oblíqua, pela forma como escrevemos, nossa respiração, tom de voz e um conjunto de metadados que decifram a pessoa, viabilizando a transferência do poder decisório. Quando sorrateiramente se liquefaz o livre-arbítrio, o indivíduo se submete a leis externas, sendo exilado do controle sobre o tempo futuro, pois onde reinava o "eu farei", entra em cena o "você fará".
A preocupação expressa por Klaus Schwab16 dedicada à 4 revolução industrial é que os tomadores de decisão costumam ser levados pelo pensamento tradicional linear (e sem ruptura) ou costumam estar muito absorvidos por preocupações imediatas e não conseguem pensar de forma estratégica sobre as forças de ruptura e inovação que moldam nosso futuro.
Como terceiro e derradeiro movimento de despersonalização da personalidade temos um deliberado "projeto de personalização" que camufla a própria coisificação da pessoa. O termo "personalizar" que outrora significava colocar o direito a serviço da pessoa, assume nova conotação. Pode-se dizer que não passa de um eufemismo para a monetização da vida em troca de segurança, serviços e conveniência. A personalização como ferramenta de marketing para que a pessoa tenha acesso à exclusividade, on-line e off-line. Não se trata de um acesso ao mínimo, senão ao máximo existencial, onde o supérfluo assumes ares de necessário. Produtos inteligentes feitos sob medida para as vicissitudes de cada pessoa – casas, roupas, relógios – potencializam a obtenção de superávit comportamental. O assistente digital é o protótipo deste esvaziamento da intimidade e ideia de solidão, um verdadeiro cavalo de Tróia para o qual cedemos conhecimento, autoridade e poder.
O projeto de personalização apaga a fronteira entre o eu e o mercado. Em 2011 Michael Sandel escreveu o livro "O que o dinheiro não compra".17 A ideia central é a delimitação dos limites morais do mercado, na medida em que a economia de mercado se transmuda em sociedade de mercado, na qual prevalece uma visão econômica da vida, marcada pela precificação de bens antes tidos como indisponíveis e agora submetidos ao cálculo racional do incentivo monetário. Sandel se vale dos argumentos filosóficos da coerção (necessidade material fragiliza a liberdade de escolha) e da corrupção (degradação de bens existenciais em mercadorias) como óbices a contratos como venda de órgãos, barriga de aluguel e remuneração de esterilização.
Passados dez anos, percebemos que no âmbito do capitalismo de vigilância a coerção é dispensada e a corrupção naturalizada. Algoritmos constituem nossa identidade e reputação, classificam nossos riscos, discriminam e manipulam comportamentos, sem qualquer transparência. Elimina-se a coerção pois a experiência humana é coletada sem a consciência quanto à contratação. Normaliza-se a corrupção, pois bovinamente aquiescemos à conversão das coisas que temos em coisas que nos têm, à passagem de um mercado para você em um mercado "sobre" você.
Finalizamos por onde começamos. O art. 17 da LGPD consiste em ponto nodal de resistência às três emanações da despersonalização da personalidade. A titularidade de dados pessoais ancorada na tríplice dimensão da liberdade, intimidade e privacidade, representa uma ampliação da esfera normativa do pertencimento, extrapolando a propriedade imaterial, para alcançar uma "titularidade inclusiva", reafirmando-se no mundo digital, a aderência das situações existenciais à pessoa natural, a extrapatrimonialidade dos direitos da personalidade e sua relativa indisponibilidade e, consequentemente, a máxima efetividade das tutelas preventiva e repressiva das projeções eletrônicas do ser humano.18 Cabe à doutrina extrair todas as possibilidades hermenêuticas do dito preceito, a fim de se preservar o domínio humano sobre o que lhe é inerente. Como argutamente constatou Zygmunt Bauman, na modernidade fluida a contradição mais evidente é o "O abismo que se abre entre o direito a` autoafirmação e a capacidade de controlar as situações sociais que podem tornar essa autoafirmação algo factível ou irrealista".19
*Nelson Rosenvald é professor do corpo permanente do doutorado e mestrado do IDP/DF. Procurador de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais. Pós-doutor em Direito Civil na Università Roma Tre (IT-2011). Pós-doutor em Direito Societário na Universidade de Coimbra (PO-2017). Visiting Academic Oxford University (UK-2016/17). Professor Visitante na Universidade Carlos III (ES-2018). Doutor e mestre em Direito Civil pela PUC/SP. Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil (IBERC) e Associado Fundador do Instituto Avançado de Proteção de Dados (IAPD).
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1 STF. RE n. 466.343, 03.12.2008, Informativo n. 531 Rel. Min. Cezar Peluso: "Já não é possível conceber o corpo humano como passível de experimentos normativos no sentido de que se torne objeto de técnicas de coerção para cumprimento de obrigações estritamente de caráter patrimonial".
2 Súmula 364 do STJ: "O imóvel residencial do próprio casal ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei".
3 Art. 11, Código Civil: Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.
4 Art. 12, Código Civil: Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
5 Art. 927, Código Civi: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
6 Art. 497, CPC: Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Parágrafo único. Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo.
7 DWORKIN, Ronald. Domi'nio da vida. Sa~o Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 339.
8 STF. ADPF 54/DF, Rel: MIN. Marco Aurélio, 30.4.2012.
9 STF. ADI 4.277 e ADPF 132, Rel. Min. Ayres Brito, 5.5.2011. "Tudo que não está juridicamente proibido, está juridicamente permitido. A ausência de lei não é ausência de direito, até porque o direito é maior do que a lei."
10 Artigo 15, CC: Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.
11 ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância, Rio de Janeiro, Ed. Intrínseca, 2021, p. 19/23. A autora encarta seis declarações que resumem o capitalismo de vigilância: "Nós reivindicamos a experiência humana com o matéria-prima gratuita para se pegar. Com base nessa reivindicação, podemos ignorar considerações de direitos, interesses, consciência ou entendimento dos indivíduos; com base na nossa reivindicação afirmamos o direito de pegar a experiência do indivíduo para convertê-la em dados comportamentais; nosso direito de pegar, baseado na nossa reivindicação de matéria-prima gratuita, nos confere o direito de possuir os dados comportamentais derivados da experiência humana; nossos direitos de pegar e possuir nos conferem o direito de saber o que o conteúdo dos dados revela; nossos direitos de pegar, possuir e saber nos conferem o direito de decidir como usamos o nosso conhecimento; nosso direitos de pegar, possuir, saber e decidir nos conferem nossos direitos às condições que preservam nossos direitos de pegar, possuir, saber e decidir". Op. cit. p. 210/1.
12 Kant, em "Fundamentação à Metafísica dos Costumes" assevera: o homem, e, de maneira geral, todo o ser racional, existe como fim de si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade (...). Os seres cuja existência depende, não em verdade da nossa vontade, mas da natureza, têm, contudo, se são seres irracionais, apenas um valor relativo como meios, e por isso se chamam coisas, ao passo que os seres racionais se chamam pessoas, porque a sua natureza os distingue já como fins em si mesmos, quer dizer, como algo que não pode ser empregado como simples meio.
13 Como percebe Yuval Noah Harari, "Quando a autoridade passa de humanos para algoritmos, não podemos mais ver o mundo como o campo de ação de indivíduos autônomos esforçando-se por fazer as escolhas certas. Em vez disso vamos perceber o universo inteiro como um fluxo de dados". 21 Lições para o século 21, São Paulo. Companhia das Letras, 2019, p. 83.
14 [...] separado do mundo e de minha essência por esse nada que sou, tenho de realizar o sentido do mundo e de minha essência: eu decido sozinho, injustifica'vel e sem desculpas [...]" SARTRE, J. P. O ser e o nada – ensaio de ontologia fenomenológica. 6 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998, p. 782.
15 "Nudge", Termo consagrado na economia comportamental pela obra de autoria de Richard H. Thaler e Cass R. Sunstein sobre a arquitetura de escolhas. São Paulo, Editora Objetiva, 2. Ed, 2019.
16 SCHWAB, Klaus. A Quarta Revolução Industrial. São Paulo, Edipro, 2016, p. 12. O autor anota três razões que sustentam a singularidade da 4. Revolução industrial: "Velocidade: ao contrário das revoluções industriais anteriores, esta evolui em um ritmo exponencial e não linear. Esse é o resultado do mundo multifacetado e profundamente interconectado em que vivemos; além disso, as novas tecnologias geram outras mais novas e cada vez mais qualificadas. – Amplitude e profundidade: ela tem a revolução digital como base e combina várias tecnologias, levando a mudanças de paradigma sem precedentes da economia, dos negócios, da sociedade e dos indivíduos. A revolução não está modificando apenas o "o que" e o "como" fazemos as coisas, mas também "quem" somos. Impacto sistêmico: ela envolve a transformação de sistemas inteiros entre países e dentro deles, em empresas, indústrias e em toda sociedade". Op.cit, p.
17 SANDEL, Michael J. O que o dinheiro não compra: os limites morais do mercado; tradução de Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.
18 RODOTÀ, S. El derecho a tener derechos. Madrid: Editorial Trotta, 2014.2014, p.150. O autor propõe o conceito de corpo eletrônico da pessoa humana: "En la dinámica de las relaciones sociales y también en la percepción de uno mismo, la verdadera realidad es la definida por el conjunto de las informaciones que nos afectan, organizadas electrónicamente. Este es el cuerpo que nos sitúa en el mundo".
19 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida, São Paulo, Zahar, 2001. p. 35.