Migalhas Consensuais

A importância da mediação no ESG: Promovendo a sustentabilidade nas empresas e na sociedade

A mediação promove a sustentabilidade corporativa, oferecendo uma solução colaborativa e transparente para disputas, alinhada com os princípios ESG e os ODS da ONU. É uma oportunidade para empresas fortalecerem relacionamentos e demonstrarem responsabilidade social.

29/5/2024

Nos últimos anos, a sustentabilidade ambiental, social e de governança corporativa, ou, como é conhecida pela sigla em inglês, ESG, tornou-se uma prioridade para as empresas, a nível global e nacional.1 Como parte desse movimento e em alinhamento com os próprios ODS - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU que dialogam com os princípios ESG, a mediação emerge como uma ferramenta poderosa para promover a resolução eficaz de disputas.2

O próximo encontro do G203 no Rio de Janeiro, com o slogan "construindo um mundo justo e um planeta sustentável", apresenta-se como uma excelente oportunidade para o debate da mediação, sobretudo como ferramenta de acesso à justiça, que é capaz de lidar com a urgência de abordar questões ambientais e sociais em vista de uma pauta crucial de sustentabilidade.

Sempre bom lembrar que a mediação desempenha um papel fundamental ao oferecer um meio eficaz e colaborativo para resolver disputas de forma rápida e justa. Ao optar pela mediação, as empresas podem evitar litígios prolongados, reduzir custos legais e preservar relacionamentos comerciais valiosos.

Além disso, a mediação promove a transparência e a responsabilidade, dois pilares essenciais dos princípios ESG. Ao resolver disputas de maneira aberta e transparente, as empresas demonstram seu compromisso com a boa governança e a prestação de contas.

A mediação oferece uma oportunidade única para as partes envolvidas se envolverem diretamente na resolução de suas disputas. Isso permite que as empresas construam relacionamentos mais fortes com suas partes interessadas ("stakeholders") e promovam a responsabilidade social corporativa.

À medida que avançamos em direção a um mundo mais sustentável, a mediação continuará desempenhando um papel vital na construção de um mundo empresarial mais ético, transparente e responsável.

Aqui estão cinco dicas essenciais para promover a mediação no dia a dia empresarial atento às mudanças requisitadas pelo ESG:

  1. Implementar programas de resolução de conflitos: As empresas podem estabelecer programas formais de resolução de conflitos que incluam a mediação como uma opção default/primária de resolução de disputas. Isso pode incluir a criação de políticas e procedimentos claros para lidar com conflitos internos e externos, bem como a formação de uma equipe dedicada de mediadores ou o acesso a serviços externos de mediação;
  2. Oferecer treinamento em resolução de conflitos: Capacitar os funcionários em habilidades de comunicação, de negociação e outras formas de resolução de conflitos com o objetivo de aprimorar o ambiente de trabalho e reduzir conflitos interpessoais. Os programas de treinamento podem incluir workshops, palestras e cursos online sobre os diversos meios de resolução de conflitos;
  3. Incentivar a cultura da mediação: Promover uma cultura organizacional que valorize a mediação e a resolução de conflitos de forma colaborativa e construtiva. Isso pode ser feito por meio de campanhas de conscientização, reconhecimento e recompensa de comportamentos positivos de resolução de conflitos e liderança exemplar;
  4. Integrar a mediação nas políticas de sustentabilidade: Incorporar a mediação como parte das políticas de sustentabilidade da empresa, reconhecendo-a como uma prática que promove a justiça social, a inclusão e a responsabilidade corporativa. Isso pode incluir a mediação como um indicador de desempenho ambiental e social nos relatórios de sustentabilidade;
  5. Colaborar com partes interessadas externas: Engajar-se com partes interessadas externas, como fornecedores, clientes, comunidades locais e organizações da sociedade civil, para promover a mediação como uma ferramenta eficaz para resolver disputas e mitigar impactos sociais e ambientais adversos. Isso pode envolver parcerias com provedores de serviços de mediação externos ou a participação em iniciativas de resolução de conflitos comunitários.

Ao adotar essas práticas e incorporar os princípios ESG em sua cultura organizacional, as empresas podem não apenas fortalecer sua posição no mercado, considerando os incentivos criados e buscados pelos governos diante dos ODS, mas também contribuir de forma significativa para a construção de um futuro mais sustentável e inclusivo para todos.

Nesse sentido, importantes benefícios para a sociedade podem ser destacados:

  1. Redução da sobrecarga do sistema judiciário: A mediação ajuda a aliviar a carga do sistema judiciário, reduzindo o número de processos judiciais e, consequentemente, os custos associados à resolução de disputas por meio de litígios. Isso permite que o sistema judiciário concentre seus recursos em casos mais complexos e urgentes;
  2. Promoção da pacificação social: A mediação contribui para a resolução de conflitos de forma pacífica e colaborativa, promovendo a harmonia e a coesão social. Ao facilitar o diálogo e a negociação entre as partes envolvidas, a mediação ajuda a prevenir o surgimento de tensões e conflitos prolongados que podem prejudicar o tecido social de uma comunidade;4
  3. Inclusão e acessibilidade à justiça: A mediação oferece uma abordagem mais acessível e inclusiva para a resolução de disputas, permitindo que indivíduos e comunidades de diferentes origens socioeconômicas tenham acesso a processos justos e eficazes de resolução de conflitos. Isso é especialmente importante para grupos vulneráveis e marginalizados que podem enfrentar barreiras no acesso ao sistema judiciário tradicional;
  4. Sustentabilidade e desenvolvimento social: A mediação contribui para a promoção dos ODS, especialmente aqueles relacionados à paz, justiça e instituições eficazes (ODS 16). Ao facilitar a resolução de conflitos de maneira colaborativa e inclusiva, a mediação contribui para a construção de sociedades mais pacíficas, justas e resilientes;
  5. Empoderamento das partes envolvidas: A mediação capacita as partes envolvidas a participar ativamente da resolução de seus próprios conflitos, permitindo-lhes assumir o controle de suas vidas e decisões. Ao promover a autonomia e a responsabilidade individual, a mediação fortalece as relações interpessoais e comunitárias, promovendo um ambiente de confiança e cooperação mútua.

Em suma, a mediação desempenha um papel fundamental na promoção da sustentabilidade nas empresas, ao mesmo tempo em que ajuda a resolver disputas de forma eficaz e justa, auxiliando no desenvolvimento social condizente com um porvir consciente e de fruição universal pacífica.

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1 A título de exemplo, por meio da Diretiva de Due Diligence de Sustentabilidade Corporativa, a União Europeia aprovou recente legislação determinando que, entre 2027 e 2029, a depender do tamanho das empresas, estas ao fazerem negócios com qualquer um dos 27 países da UE precisarão provar que seus fornecedores respeitam normas de direitos humanos e ligadas à proteção do meio ambiente, sob pena de multa de até 5% da sua receita (Disponível aqui. Acesso em 26 de maio de 2024). Já a nível doméstico, destaca-se o Projeto de Lei n° 4363, de 2021, atualmente em trâmite, que institui o Selo Nacional ASG (Ambiental, Social e Governança) a ser conferido às empresas que investem em ações e projetos de motivação ambiental, social e de governança, de forma a garantir-lhes condições competitivas mais benéficas.

2 “(…) mediation is not just a process; it is a path to social peace and inclusiveness. As we embrace this powerful tool, we take significant steps toward realizing the vision set forth in the United Nations’ SDG 16—a world where peace, justice, and strong institutions prevail. Let us continue to explore and champion mediation as a fundamental instrument for pacification and a brighter future for all.” (MAIA, Andrea. Mediation as a Tool for Social Peace: Addressing UN SDG 16. Disponível aqui.

3 “Também conhecido como Grupo dos Vinte, o G20 nasceu após uma sequência de crises econômicas que assolaram o mundo na década de 1990. No ano de 1999, foi criado um fórum multilateral entre países industrializados e emergentes, composto na época por ministros de Finanças e presidentes de Bancos Centrais, que inicialmente tinha como foco debater questões econômicas e financeiras mundiais. Em 2008, no auge de mais uma crise econômica mundial causada pela quebra do banco Lehman Brothers, o grupo teve a primeira reunião de Cúpula com chefes de Estado e de Governo e, desde então, não parou de crescer, sempre discutindo assuntos relacionados à estabilidade econômica global. Com presidências rotativas anuais, o G20 desempenha um papel importante na definição e no reforço da arquitetura e da governança mundiais em todas as grandes questões econômicas internacionais. (...) O grupo agrega dois terços da população mundial, cerca de 85% do PIB global e 75% do comércio internacional.” Disponível aqui.

4 “O que se percebe, inobstante, é que no processo judicial, bem como no processo arbitral, muitas vezes a pacificação existe apenas no plano social. O conflito é dirimido em face da sociedade, sendo retirado do mundo jurídico e fático. Não há, todavia, uma solução que atinja as verdadeiras raízes do conflito, pois na lógica do ‘perde-ganha’, em que sempre haverá um vencedor e um vencido, este dificilmente se conformará com a decisão imposta, buscando, se possível, a interposição reiterada de recursos e até mesmo dificultar o cumprimento da sentença. Assim, entende-se que a pacificação social também pode ser observada na justiça estatal (e arbitral), tendo-se em consideração o conceito de Tribunal Multiportas e que, invariavelmente, o maior grau de pacificação é atingido com a justiça conciliativa, em que as partes buscam e constroem em conjunto a resolução do conflito.” (FERNANDES, Amanda. Justiça Consensual. São Paulo: Almedina, 2021, pp. 77-78).

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Colunistas

Mariana Freitas de Souza é advogada e mediadora. Presidente do ICFML Brasil. Diretora do CBMA. Membro da Comissão de Mediação do Conselho Federal da OAB. Membro da Comissão de Arbitragem da OAB/RJ. Membro da Comissão de Conciliação, Mediação e Arbitragem do IAB. Membro do Global Mediation Panel da ONU. JAMS Weinstein International Fellow. Sócia do PVS Advogados.

Samantha Longo é advogada e professora. Membro do FONAREF – Fórum Nacional de Recuperação Empresarial e Falências e membro do Comitê Gestor de Conciliação, ambos do CNJ. Conselheira da OAB/RJ. Mestre em Direito Empresarial e Cidadania pela UniCuritiba. Negotiation and Leadership Program na Harvard University. LLM. em Direito Empresarial pelo IBMEC/RJ. Autora de diversos artigos, coordenadora de obras coletivas, coautora da obra "A Recuperação Empresarial e os Métodos Adequados de Solução de Conflitos" e autora do livro "Direito Empresarial e Cidadania: a responsabilidade da empresa na pacificação dos conflitos".