Dados da Serasa Experian demonstram que, no primeiro trimestre, houve um aumento de 37,6% nos pedidos de recuperação judicial comparado com o mesmo período de 2022, enquanto os de falências subiram 44,1%. Em termos de recuperações judiciais e falências decretadas, os números alcançam, respectivamente, 51% e 3,7%.1 E o ano está apenas no começo.
No início de 2021, entrou em vigor a lei 14.112/20, que reformou a lei 11.101/05 (LREF), com o objetivo de torná-la mais aderente à realidade jurídica, econômica, política e social do país.
Dentre as novidades trazidas pela lei 14.112/20, foi admitido o uso da mediação antes ou durante o trâmite dos processos de insolvência, ou seja, de recuperação judicial ou extrajudicial e de falência (LREF, arts. 20-A a 20-D).
A experiência prática mostra que a aplicação e a avaliação da mediação dependem da correta compreensão do seu objetivo por todos os agentes envolvidos: advogados, assessores financeiros, administradores judiciais, magistrados, membros do Ministério Público e da Defensoria Pública e, claro, mediadores.
De modo geral, pode-se afirmar que a mediação é um método de solução de conflitos, voluntário, flexível e confidencial, conduzido por um terceiro (mediador), neutro e imparcial, que busca facilitar o diálogo das partes, para que elas negociem, com urbanidade, cooperação e informação adequada, a solução que melhor corresponda aos seus interesses em disputa.
Em processos de insolvência, o objetivo da mediação é estabelecer um diálogo produtivo entre as partes, direcionado à melhor solução para a superação da crise econômico-financeira do devedor, materializada, em nosso sistema concursal, por um plano vinculativo se aprovado pela maioria dos credores.2
Para estabelecer um diálogo que dê voz aos participantes, é preciso democratizar a informação, empoderar credores, em especial aqueles com valores de menor expressão econômica, e mapear pontos de convergência e de divergência entre o devedor e os credores, bem como possíveis pontos de resistência, internos e externos.
Experiências em diversas localidades do Brasil têm confirmado que, por meio de um diálogo produtivo, a mediação tem facilitado e incentivado as negociações entre as partes, reduzido assimetrias de informações e contribuído para uma solução mais rápida, econômica e adequada para os conflitos surgidos ou já existentes e, assim, para o próprio processo.3
Em outras palavras, a mediação tem servido como um verdadeiro mapa para os agentes envolvidos nos processos de insolvência sobre as possibilidades de consenso entre devedor e credores e, por consequência, de efetividade processual.
A correta compreensão do objetivo da mediação passa, então, pela correta compreensão também da figura do mediador como gestor do diálogo entre as partes.4 Assim, não lhe cabe fazer análises econômico-financeiras do devedor, nem lhe fiscalizá-lo ou julgá-lo, muito menos negociar contra ou a favor dele.
Saber o que é e como funciona a mediação é fundamental para afastar o ceticismo sobre a sua eficiência5 e, assim, para a sua consolidação no sistema de insolvência brasileiro, em especial considerando o crescente aumento nos pedidos de recuperação e de falência.
Referências bibliográficas
Cerezetti, Sheila Christina Neder. A Recuperação Judicial de Sociedade por Ações: o princípio da preservação da empresa na lei de recuperação e falência. São Paulo: Malheiros, 2012.
COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas: Lei 14.112/20, nova Lei de Falências, 14 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021.
VASCONCELOS, Ronaldo; HANESAKA, Thais D'Angelo da Silva; CARNAÚBA, César Augusto Martins. Mediação na recuperação judicial: paralelos com a evolução estrangeira. Revista de Arbitragem e Mediação, São Paulo, v. 16, n. 62, p. 45-81, jul./set. 2019.
VEZZULLA, Juan Carlos. Teoria e prática da mediação. Curitiba: IMAP, 1998.
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1 Disponível aqui. Acesso em 14 abr. 2023.2 Cerezetti, Sheila Christina Neder. A Recuperação Judicial de Sociedade por Ações: o princípio da preservação da empresa na lei de recuperação e falência. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 427.
3 VASCONCELOS, Ronaldo; HANESAKA, Thais D'Angelo da Silva; CARNAÚBA, César Augusto Martins. Mediação na recuperação judicial: paralelos com a evolução estrangeira. Revista de Arbitragem e Mediação, São Paulo, v. 16, n. 62, p. 45-81, jul./set. 2019.
4 Juan Carlos Vezzulla afirma que “[O] mediador é tão somente a parteira, que ajuda a dar à luz os reais interesses que possibilitarão o acordo final” (Teoria e prática da mediação. Curitiba: IMAP, 1998, p. 44-45).
5 Por exemplo: COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas: Lei 14.112/20, nova Lei de Falências. 14 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021, p. 95-98.