Migalha Trabalhista

A nova leitura da OJ 191 da SBDI-1 pelo TST

Contrato de empreitada de construção civil entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora.

15/7/2022

O TST, através da resolução 175/11 (publicada no DEJT nos dias 27, 30 e 31/5/11), editou nova redação para a Orientação Jurisprudencial 191 da SBDI-1 - Subseção de Dissídios Individuais1 com os seguintes dizeres:

Diante da inexistência de previsão legal específica, o contrato de empreitada de construção civil entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora.

Destarte, a Corte Superior Trabalhista manteve a uniformização do entendimento de que o dono da obra jamais responderia pelas obrigações trabalhistas de forma solidária ou subsidiária, a não ser que fosse uma empresa construtora ou incorporadora que estivesse terceirizando o serviço de construção, havendo também exceção no que se refere às obrigações previdenciárias, que importam responsabilidade solidária em caso de inadimplência.

Ocorre que novo cenário jurisprudencial surgiu a partir do julgamento do recurso de revista, autos de 190-53.2015.5.03.0090, interposto pela Anglo American Minério de Ferro do Brasil em face de decisão do TRT da 3ª região (MG). Naquela ocasião, TRT de origem condenou a empresa de forma subsidiária nas obrigações trabalhistas decorrentes de um contrato de empreitada, afirmando em sua decisão que somente a pessoa física ou as micro e pequenas empresas estariam isentas da responsabilidade solidária/subsidiária, impedindo que pessoas jurídicas de grande porte se valessem da OJ 191 para se livrarem de débitos trabalhistas, não sendo sequer obrigadas a fiscalizar o contrato do prestador de serviços em face dos trabalhadores contratados.

Na oportunidade, os ministros da 6ª turma do TST decidiram por bem afetar o recurso de revista à SBDI-1 do TST, para que o caso fosse analisado e julgado nos termos das regras previstas para os recursos repetitivos, possibilitando dar ao julgado efeito vinculante, conforme art. 927, III, do CPC2. Afinal, a questão jurídica a ser respondida seria a seguinte: “O conceito de dono da obra, previsto na OJ 191 da SBDI-1/TST, para efeitos de exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária trabalhista, restringe-se a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado?

Após longos debates, julgando ao final, o IRR - Incidente de Recurso de Revista 190-53.2015.5.03.0090 (tema 06)3, os ministros do TST mantiveram os dizeres da OJ-191, mas ampliaram sua interpretação, fixando as seguintes teses para os casos em que se debate a responsabilidade solidária ou subsidiária do dono da obra:

"INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO. TEMA Nº 0006. CONTRATO DE EMPREITADA. DONO DA OBRA. RESPONSABILIDADE. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 191 DA SbDI-1 DO TST VERSUS SÚMULA Nº 42 DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA TERCEIRA REGIÃO
1. A exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária por obrigação trabalhista, a que se refere a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, não se restringe a pessoa física ou micro e pequenas empresas. Compreende igualmente empresas de médio e grande porte e entes públicos.
2. A excepcional responsabilidade por obrigações trabalhistas, prevista na parte final da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, por aplicação analógica do artigo 455 da CLT, alcança os casos em que o dono da obra de construção civil é construtor ou incorporador e, portanto, desenvolve a mesma atividade econômica do empreiteiro.
3. Não é compatível com a diretriz sufragada na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-1 do TST jurisprudência de Tribunal Regional do Trabalho que amplia a responsabilidade trabalhista do dono da obra, excepcionando apenas "a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado".
4. Exceto ente público da Administração direta e indireta, se houver inadimplemento das obrigações trabalhistas contraídas por empreiteiro que contratar, sem idoneidade econômico-financeira, o dono da obra responderá subsidiariamente por tais obrigações, em face de aplicação analógica do art. 455 da CLT e de culpa in eligendo." (IRR 190-53.2015.5.03.0090, SDI-1, Acórdão publicado em 30/06/2017, Relator Ministro João Oreste Dalazen). (g.n.)

Posteriormente, em âmbito de embargos de declaração, a SBDI-1 do TST modulou os efeitos da decisão proferida no IRR em questão, para deixar claro que: “O entendimento contido na tese jurídica 4 aplica-se exclusivamente aos contratos de empreitada celebrados após 11 de maio de 2017, data do presente julgamento” (g.n.).

Importante frisar que, após negar seguimento aos recursos extraordinários interpostos pelas partes e terceiros interessados, o acórdão proferido pelo TST transitou em julgado em 16/12/214, razão pela qual as teses fixadas são de observância obrigatória por todos os TRT do país, o que ainda não é feito de forma absoluta, havendo decisões que ainda aplicam a OJ-191 sem a devida interpretação fixada no IRR-tema 06, dada a recente finalização do julgado, sem necessidade de se aguardar futuro posicionamento do STF sobre o tema.

Portanto, desde o ano de 2017, o que temos no caso em debate é que, nos termos da OJ-191 da SBDI-1 do TST e do IRR 190-53.2015.5.03.0090, o dono da obra pode ser condenado no pagamento das verbas trabalhistas, de forma subsidiária, desde que fique comprovada a inidoneidade econômico-financeira da empresa contratada, em decorrência da culpa in eligendo, razão pela qual deve a contratante demonstrar que, no ato da celebração do contrato de empreitada de construção civil, buscou verificar se a empresa contratada tinha capacidade para realizar a obra e pagar as verbas trabalhistas devidas, sem o que responderá pelas verbas trabalhistas inadimplidas pelo empreiteiro.

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1 Na ocasião foram citados os seguintes precedentes: ERR 53700-80.2005.5.03.0041, 108400-80.2007.5.17.0191, 112100-98.2006.5.17.0191, 34900-33.2002.5.17.0004, 558064-39.1999.5.05.5555, 356371-72.1997.5.05.5555, 312885-28.1996.5.03.5555 e 109810-33.1994.5.03.5555 e os RR 360731-49.1997.5.23.5555, 620762-58.2000.5.01.5555, 547314-96.1999.5.15.5555 e 455044-23.1998.5.03.5555.

2 Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

3 Disponível aqui.

4 Disponível aqui.

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Colunista

Ricardo Calcini é professor, advogado, parecerista e consultor trabalhista. Estratégica, atuação estratégica e especializada nos Tribunais (TRTs, TST e STF). Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP. Pós-Graduado em Direito Processual Civil (EPM TJ/SP) e em Direito Social (Mackenzie). Professor Convidado de Cursos Jurídicos e de Pós-Graduação (FADI, ESA, IEPREV, Católica de SC, PUC/PR, PUC/RS, Ibmec/RJ, FDV e USP/RP). Coordenador Trabalhista da Editora Mizuno. Membro do Comitê Técnico da Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária. Professor indicado pela Câmara dos Deputados para presidir o grupo de estudos técnicos para a elaboração do PL 5.581/2020 acerca do Teletrabalho. Coordenador Acadêmico do projeto "Migalha Trabalhista" (Migalhas). Palestrante e Instrutor de eventos corporativos pela empresa Ricardo Calcini | Cursos e Treinamentos, especializada na área jurídica trabalhista com foco nas empresas, escritórios de advocacia e entidades de classe. Autor do livro "Prática Trabalhista nos Tribunais: TRT's e TST". Coautor dos livros "Execução Trabalhista na Prática" (2ª Edição) e "Manual de Direito Processual Trabalhista". Organizador das obras coletivas "CLT Comentada: Artigo por Artigo" – Mizuno (2ª Edição), "Estratégias da Advocacia no TST", "ESG – A Referência da Responsabilidade Social Empresarial", "Prática de Processo de Trabalho: Técnica Visual Law", "Reflexões Jurídicas Contemporâneas: Estudos em homenagem ao Ministro Douglas Alencar Rodrigues", "Relações Trabalhista e Sindicais – Teoria e Prática" (2ª Edição), "LGPD e Compliance Trabalhista" e "Reforma Trabalhista na Prática: Anotada e Comentada" (2ª Edição). Coordenador do livro digital "Nova Reforma Trabalhista" (Editora ESA OAB/SP, 2020). Coordenador dos livros "Perguntas e Respostas sobre a Lei da Reforma Trabalhista" (Editora LTr) e "Reforma Trabalhista: Primeiras Impressões" (Editora Eduepb). Membro e Pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social, da Universidade de São Paulo (GETRAB-USP), do GEDTRAB-FDRP/USP e da CIELO LABORAL. Contatos: Instagram ricardo_calcini | Website www.ricardocalcini.com.br