Meio de campo

Um projeto grandioso para a CBF: A contrapartida ao mercado - Parte XIV

Advogado Rodrigo R. Monteiro de Castro trata das contrapartidas ao mercado no âmbito da proposta de reorganização e abertura de capital da CBF.

26/6/2024

No âmbito da apresentação e explicação do projeto de reorganização e ressignificação da CBF, que vem tomando conta desta coluna, tratou-se, nos dois últimos textos, da posição dos agentes financiadores e provedores de capitais, lá chamados, coletivamente, de mercado.

A inserção, não de uma entidade abstrata e irreconhecível (o mercado), mas de agentes interessados em participar de uma companhia com vocação para ser protagonista mundial, é condição necessária para que o protagonismo se realize.

A realização, como se vem demonstrando, beneficiará clubes, sociedades anônimas do futebol, CBF Associação e a sociedade civil em geral.

Mas o tal mercado – ou os agentes dispostos a financiar o desenvolvimento da seleção brasileira – não viabilizará a promoção de benefícios sem contrapartidas. Não se trata de mesquinharia, ganância ou insensibilidade; apenas de motivação para alocação de recursos próprios ou de terceiros.

Esse debate, aliás, já se travou por ocasião do advento do anteprojeto de lei que propôs a criação da SAF: como se justificava – e ainda se justifica – que a maior atividade de entretenimento do planeta (o futebol), no país que já foi justamente o do futebol (o Brasil), não atraísse interesse de financiadores e investidores?

Pois havia uma espécie de muro entre dois mundos, o mundo do futebol e o de capitais, inviabilizador da benfazeja (e necessária) comunhão.

A Lei da SAF, que completa o seu terceiro ano, viabilizou, em sentido inverso, a criação de um ambiente, minimante regulado, cuja própria regulação forma uma espécie de novo mundo (ou moldura), composto por aqueles agentes outrora estranhos uns aos outros, como se ilustra abaixo:

(Imagem: Divulgação)

Aquele estranhamento, com algumas diferenças, se estende ao secular e ainda atual modelo organizacional da CBF, que a apequena interna e externamente, apesar dos excedentes gerados a cada ano e do caixa sobre o qual está montada – justificados, sobretudo, pela sua posição monopolística.

O Brasil dispõe, porém, de um dos mais relevantes ativos planetários e a perspectiva de transformá-lo em softpower, para o bem geral – inclusive da CBF. Os caminhos já foram apresentados nos textos anteriores e estão à disposição dos dirigentes da CBF Associação e de Federações, para que a roda comece a girar.

A disponibilidade, para que se revele eficiente e efetiva, deverá atrair, como dito, interesse de agentes financiadores e investidores. E aí está, portanto, a pedra de toque: um modelo de abertura de capital arquitetado para construção de uma relação segura, transparente e previsível, em favor de todos os partícipes do sistema.

O trinômio (segurança, transparência e previsibilidade) se traduz em vias e técnicas jurídicas aptas a preservar as regras que forem instituídas, em todos os planos construtivos: governação, informação, compliance, fiscalização e proteção.

Soma-se a esse conjunto relacional interno a necessidade de manutenção, no plano legislativo, das regras instituídas, de modo a preservar o ato jurídico perfeito e o cálculo de risco na alocação de recursos em atividade empresarial.

E se completa a receita com a sempre esperançosa atuação judicial, mediante provocação e sem ativismo, (apenas) para conter ilegalidades e abusos ou para afirmar direitos, derivados de lei ou de contratos. 

Parece complexo, mas definitivamente não é.

A experiência internacional, que vai além do futebol, afirma o interesse global pelo esporte, em especial – e por diversos fundamentos – pelo próprio futebol. O Brasil também confirma a proposição.

Desde a Lei da SAF, aproximadamente 70 sociedades anônimas do futebol foram constituídas, e agentes de diversas procedências e com as mais variadas características embarcaram na tese. E a história está apenas se iniciando.

No embalo de tal movimento, a abertura de capital da CBF, que se trata de ativo único, não apenas colocaria o país na vanguarda do esporte – e do entretenimento –, como, no âmbito de um projeto devidamente estruturado, poderia atrair investidores institucionais, locais e internacionais, convergentes na criação do maior projeto esportivo da história.

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Colunista

Rodrigo R. Monteiro de Castro advogado, professor de Direito Comercial do IBMEC/SP, mestre e doutor em Direito Comercial pela PUC/SP, coautor dos Projetos de Lei que instituem a Sociedade Anônima do Futebol e a Sociedade Anônima Simplificada, e Autor dos Livros "Controle Gerencial", "Regime Jurídico das Reorganizações", "Futebol, Mercado e Estado” e “Futebol e Governança". Foi presidente do IDSA, do MDA e professor de Direito Comercial do Mackenzie. É sócio de Monteiro de Castro, Setoguti Advogados.