No âmbito da apresentação e explicação do projeto de reorganização e ressignificação da CBF, que vem tomando conta desta coluna, tratou-se, no último texto, da posição dos agentes financiadores e provedores de capitais, lá chamados, coletivamente, de mercado.
O (relevante) posicionamento, que não se resume a uma mera atribuição de lugar, é ilustrado, uma vez mais, no seguinte gráfico:
O papel (ou a função) do mercado é transformacional.
Como já se afirmou, a CBF S.A. seria um ativo especial e único, sem comparação no planeta, pela história e as perspectivas da seleção de futebol (que seria, como explicado anteriormente, de propriedade da CBF S.A.). Mais: pelas riquezas que poderiam ser geradas em favor da própria CBF S.A., de seus acionistas (incluindo a CBF Associação, clubes, sociedades anônimas do futebol e federações) e do país.
Sim, pois além de uma reunião dos melhores jogadores brasileiros, a seleção deveria servir, mesmo (ou especialmente) sob propriedade privada, como o mais poderoso soft power da Nação.
Não há ilusão, utopia ou ufanismo nessa proposição; muito menos incompatibilidade entre a atuação privada, dirigida pelo mercado (em compasso com os demais acionistas da CBF S.A., que seriam, originalmente, a CBF Associação, as federações, os clubes e as sociedades anônimas do futebol), e o interesse público ou nacional, na disseminação cultural de um país.
Repise-se o que Hollywood fez – e ainda faz – pelos Estados Unidos da América, mediante a inoculação cotidiana dos valores e interesses internos, que se projetam ao exterior e se fundem em praticamente todas as culturas, homogeneizando (para o bem e para o mal) manifestações outrora inconciliáveis.
Essas conquistas, que no passado somente se viabilizariam por intermédio de mobilizações expansionistas, com uso da força ou de guerras, evidenciam a necessidade de aproveitamento de ativos únicos, espontâneos ou deliberadamente construídos, marcantes em certas culturas contemporâneas.
É o caso, no plano da construção, do recente fenômeno do movimento pop sul-coreano (o K-pop), consumido planetariamente a despeito da dificuldade de compreensão linguística. Eis um bom exemplo, aliás, de como agentes privados podem, direta ou indiretamente, tornar-se embaixadores de seus países e lhes propiciarem influência, poder e renda.
O futebol, muito além da música ou do cinema, é a mais global das atividades rotuladas como entretenimento, praticado em um número de países maior do que a quantidade de filiados à ONU, por exemplo.
Esse fato, somado à incapacidade da CBF Associação de assumir funções de exportadora de produtos desejados em qualquer rincão do planeta – inclusive nos mais prósperos e propensos a consumi-los em larga escala – e de disseminadora de soft power, expressam o tamanho da oportunidade que se desperdiça.
Não se pretende, aqui, atribuir a pessoas, passadas ou atuais, a responsabilidade por isto. Trata-se, apenas, de uma constatação: a CBF Associação jamais executará aquelas funções, pela sua natureza jurídica (e política) – motivadora de suas pequenas (e ao mesmo tempo grandes) querelas internas, regionais e político-administrativas.
E é justamente aí que se reforça a pertinência do projeto de reorganização e ressignificação da CBF, no qual a CBF Associação se posicionaria não só como acionista da CBF S.A., mas também guardiã de tradições e história.
Foi no mercado, ou mediante apelo aos capitais disponíveis, que, desde tempos longínquos, Nações se expandiram via comércio marítimo (Inglaterra, como melhor exemplo) ou, na contemporaneidade, por intermédio de suas ideias e produtos (Hollywood e K-pop, dentre outros).
A abertura de capital da CBF S.A., oriunda de um ato de vontade da CBF Associação, com a participação das federações, dos clubes e das sociedades anônimas do futebol, e realizada no âmbito de um plano qualificado de legítima expansão e dominação, forneceria recursos financeiros, jurídicos, governativos, relacionais e humanos para reprodução e adaptação, ao futebol, de empreendimentos expansionistas bem-sucedidos.
Em outras palavras: o mercado, com as suas imperfeições e tendências históricas à apropriação da maior quantidade de lucros em favor de interesses próprios, poderia, no entanto, no âmbito de uma proposta convergente de pretensões coletivas e individuais, previamente arquitetada, viabilizar a adequada distribuição de ganhos, inclusive (e necessariamente) ao próprio mercado, e, assim, impulsionar a criação do maior sistema de futebol do planeta: o brasileiro.