Dando continuidade aos textos publicados neste espaço ("Parte 1", "Parte 2" e/ou "Parte 3"), reproduzem-se novas perguntas relacionadas à Lei da SAF e se apresentam, na sequência, as respectivas respostas. A numeração das perguntas seguirá a ordem já exposta nas Partes 1, 2 e 3.
Qual é a extensão da responsabilidade dos administradores da SAF?
R: Os administradores da SAF sujeitam-se a um sofisticado regime de deveres e obrigações previstos, de modo específico, na Lei da SAF e, de modo geral, na Lei das Sociedades por Ações, que incluem deveres de diligência, lealdade, de não agir em conflito de interesses e de informar, além do dever de não promover desvio de atribuição e de poder. Como regra geral, o administrador da SAF – e de qualquer companhia – não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da SAF em decorrência de ato regular de gestão; mas responde pelos prejuízos que causar quando agir (i) com culpa ou dolo (mesmo dentro de suas atribuições) ou (ii) com violação da lei ou do estatuto.
Quem responde pelas obrigações do clube, anteriores ou posteriores à constituição da SAF?
R: O clube é responsável por suas obrigações. A SAF, como regra geral, não deve responder pelo clube. Mas ela será responsável pelas obrigações do clube expressamente transferidas no ato de sua constituição, desde que sejam relacionadas ao seu objeto social. O que não for transferido, permanecerá sob a responsabilidade do clube.
A SAF deverá transferir recursos para o clube? Em quais circunstâncias?
R: Toda companhia – a SAF é uma espécie de companhia – tem como propósito a geração de excedentes para distribuição aos seus acionistas. Assim, parte do lucro do exercício deverá ser distribuída. O estatuto da SAF poderá fixar o montante de dividendo mínimo que somente deixará de ser distribuído em hipóteses especiais. Se o clube for acionista único da SAF, receberá 100% da distribuição; se sua participação for de 10%, esse será o montante que receberá. Além disso, a Lei da SAF prevê, no art. 10, que, na hipótese de opção pelo Regime Centralizado de Execuções (“RCE”) (tema que será objeto de um artigo próprio) – e apenas nesse caso -, 20% das receitas correntes mensais devem ser direcionadas ao clube ou pessoa jurídica original, para pagamento de obrigações anteriores à constituição da SAF.
A Lei da SAF prevê modos de quitação das obrigações do clube, anteriores à constituição da SAF?
R: Sim. Além do pagamento direto de credores, com recursos próprios oriundos de todas e quaisquer fontes, a Lei da SAF prevê dois modos especiais de quitação em seu art. 13: o concurso de credores, por intermédio do RCE, ou a recuperação judicial ou extrajudicial, nos termos da lei 11.101/05.
A SAF pode requerer recuperação judicial?
R: A recuperação judicial é disciplinada na lei 11.101/2005. Ela se aplica ao empresário e à sociedade empresária. A SAF é uma espécie de sociedade empresária, logo sujeita à incidência das normas contidas naquela lei. Portanto, sim, a SAF pode requerer recuperação judicial.
O clube pode requer recuperação judicial?
R: O clube costuma ser constituído sob a forma de associação sem fins lucrativos, e não se confunde com o empresário ou com a sociedade empresária – que sempre perquire a lucratividade para distribuição parcial aos seus sócios. Assim, o clube não poderia, em princípio, requer recuperação judicial. Mas a Lei da SAF trouxe uma novidade, ao prever, no art. 13, que o clube poderá pagar suas obrigações por meio de recuperação judicial ou extrajudicial, nos termos da lei 11.101/05. Portanto, com o advento da Lei da SAF, o clube poderá, como regra geral, requer sua recuperação, judicial ou extrajudicial.
A SAF pode falir?
R: Sim, todo empresário ou sociedade empresária pode, eventualmente, falir. A SAF, pela sua natureza empresarial, sujeita-se ao mesmo destino.
O clube pode falir?
R: Se o clube pode requer recuperação judicial, também poderá falir. Ela pode decorrer (i) da convolação da própria recuperação judicial requerida pelo clube em falência, conforme alguma das hipóteses previstas na Lei 11.101/05 (como pela deliberação da assembleia geral de credores ou pela não apresentação de plano de recuperação pelo clube), ou (ii) de pedido de credor.
Se o clube falir, a atividade futebolística será extinta?
R: A falência tem, dentre outros, o propósito de preservar e de otimizar a utilização produtiva dos bens, dos ativos e dos recursos produtivos, inclusive os intangíveis, do falido. Trata-se, assim, de acordo com a Lei 11.101/05, de mecanismo de "preservação de benefícios econômicos e sociais decorrentes da atividade empresarial, por meio da liquidação imediata do devedor e da rápida realocação útil de ativos na economia". Liquida-se, pois, o devedor – SAF ou clube – e não necessariamente a atividade futebolística (o time), que poderá, conforme condições a serem verificadas em cada caso, ser adquirida e continuada sob o controle de outra sociedade empresária (ou SAF), preservando-se, pois, a relação entre torcedor e time.
A Lei da SAF prevê meios específicos de financiamento da atividade futebolística desenvolvida pela SAF?
R: Sim, a debênture-fut, que é um valor mobiliário, representativo de uma obrigação (ou dívida) da SAF, e que confere ao seu detentor direito de crédito contra a própria SAF. Os recursos captados pela SAF por intermédio da emissão de debenture-fut “deverão ser alocados no desenvolvimento de atividades ou no pagamento de gastos, despesas ou dívidas relacionados às atividades típicas da Sociedade Anônima do Futebol” (art. 26, § 1º).
A Lei da SAF prevê algum incentivo para fomentar a emissão e a formação de um mercado de debênture-fut, voltado ao financiamento da atividade futebolística no país?
R: O incentivo previsto na Lei da SAF foi vetado pelo Presidente da República. Previa-se que os rendimentos decorrentes da aplicação em debênture-fut ficariam sujeitos à incidência de imposto sobre a renda, com alíquotas de (i) zero quando auferidos por pessoa física residente no país, e (ii) 15% quando auferidos por pessoa jurídica ou fundo domiciliado no país ou por qualquer investidor estrangeiro. Com o veto, o incentivo caiu e os ganhos auferidos por investidores sujeitam-se às normas gerais e aplicáveis de tributação.
Além da debênture-fut, a SAF poderá emitir outros valores mobiliários para financiamento de suas atividades?
R: Sim, poderá emitir qualquer valor mobiliário ou outro instrumento de dívida disponível às companhias em geral, observada a regulação própria, exceto aqueles concebidos especialmente para desenvolver setores específicos (p.ex., o certificado de recebível do agronegócio -CRA -, que se origina de relações entre produtores rurais e terceiros, vinculados à produção, comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos e insumos agropecuários).
Outras dúvidas, ainda não abordadas nas Partes 1, 2 ou 3, bem como nesta Parte 4, serão apresentadas – e respondidas – nas colunas seguintes.