Meio de campo

Serão o Red Bull e o Athletico os protagonistas da nova estrutura do futebol brasileiro?

7/7/2021

Escrevi, neste espaço, que o Red Bull poderia ser a nova marca do futebol brasileiro.

A afirmação não era oportunista, como se costuma fazer quando um time atinge a ponta de um campeonato – e que geralmente é acompanhada, rodadas adiante, por uma manifestação de descrédito, após o declínio na tabela.

Ela foi feita e publicada em 27 de março de 20191. Há mais de dois anos, portanto.

Pois, neste exato momento, o Red Bull se situa na primeira colocação do campeonato brasileiro, após 9 rodadas disputadas.

O marco se mostra ainda mais relevante, considerando que essa é apenas a segunda temporada do time na primeira divisão nacional e, em seu ano inaugural (2020), terminou em honroso 10º lugar (mesmo ano em que se assistiu os rebaixamentos de dois clubes considerados grandes: Vasco e Botafogo).   

Não se tratava – ou se trata – de uma visão profética. Afirmava-se apenas o óbvio.

E a afirmação também não perderá valor se, nas rodadas vindouras, a liderança ficar para trás, porque, no plano organizacional, o Red Bull vem impondo um modelo que já se revela superior aos retrógrados padrões associativos, com raízes no século retrasado.

Fato é que, no tocante ao futebol (ou melhor, não apenas a ele), o Brasil se tornou pródigo em negar a obviedade; no caso, a negação servia, assim como ainda serve, para preservar posições de uma pequenina classe que se apropriou do patrimônio nacional e não defende, sob qualquer aspecto, o interesse coletivo do torcedor.

Três dogmas se perpetuam no tempo e servem para manutenção dessa situação.

O primeiro, no sentido de que a cultura local é diferente e não comporta a adoção, mesmo por simples referência, de modelos propostos e praticados no exterior.

O segundo, que nada mais é do que uma variação do primeiro, consiste na afirmação de que o torcedor brasileiro não admitiria o ingresso de investidores numa suposta estrutura societária criada para deter a propriedade do time de futebol (a exemplo da SAF).

O terceiro, que é uma variação do segundo (e, logo, do primeiro também) – o que permite a conclusão de que o desmembramento dogmático não passa de uma estratégia de confusão e dominação –, tenta impor o cartolismo, cujos representantes são oriundos de herméticos e interessados processos político-clubísticos, como guardião da tradição futebolística.

Todos eles foram superados – ou, eventualmente, jamais existiram dessa forma – nos principais centros europeus, que reduziram países como o Brasil (e a Argentina) a fornecedores de matéria-prima.

Daí não haver surpresa no posicionamento do Red Bull – que não se confunde, diga-se a verdade, com o modesto, e apenas existente no nome, Bragantino.

O que se projeta ali, respeitadas as diferenças, e até as limitações orçamentárias, é a mesma evolução, ou revolução, que alçou times europeus outrora não tão relevantes à ponta mundial.

Com efeito, o atual líder do campeonato brasileiro não se caracteriza pela atuação folclórica ou midiática de um presidente-associado de clube, exibicionista de redes sociais, vendedor de sonhos e/ou semeador de dívidas e decadência patrimonial.

Ao contrário, vislumbra-se por lá um modelo de negócios que pouquíssimos times brasileiros teriam coragem de implementar: captação de jovens promessas descartadas (ou não devidamente aproveitadas) pelos clubes formadores; estrutura de aperfeiçoamento de atletas; uma imagem moderníssima (sim, ambos os uniformes são comparáveis aos de times europeus) e uma diretoria profissional norteada por objetivos imediatos e mediatos. Além, o que é tão ou mais relevante, de acesso a recursos financeiros para implementação de todas as etapas do plano.

Por essas razões o Brasil não deve se surpreender quando (não é uma questão de se, mas de quando, exceto se o projeto for sabotado) o Red Bull se confirmar como uma força permanente do futebol, apesar da minúscula ou quase inexistente torcida.

Aliás, nesse histórico ou dramático momento do esporte no Brasil, em que Cruzeiro, Vasco e Botafogo, além de Coritiba, Goiás e Vitória disputam a segunda divisão do brasileirão, e Grêmio e São Paulo estacionam na zona de rebaixamento da primeira divisão, outro time, que há muito tempo vem se organizando para passar ao modelo empresarial, também se apresenta como candidato a protagonista do contemporâneo futebol brasileiro: o Athletico Paranaense (sobre o qual, aliás, já foram publicados, neste espaço, ao menos 3 artigos, em que se enfatizaram os méritos das decisões corajosas adotadas pela sua diretoria).

É verdade que a diferença entre o Athletico e o Red Bull não está apenas nos dois pontos que os separam na tabela, mas, sim, no bolso sem fundo do segundo.

Porém, com o novo marco regulatório do futebol brasileiro, de autoria do Presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM/MG), que deverá em breve ser votado na Câmara dos Deputados, o time do Paraná poderá, enfim, acessar o que lhe falta para se afirmar como potência sul-americana: investidores e recursos para aplicação na empresa futebolística.

Ficam aí duas belas lições aos brasileiros.

E uma advertência: o discurso populista de cartolas irresponsáveis não garantirá a permanência, nem a continuidade de trajetórias vitoriosas.

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1 https://www.migalhas.com.br/coluna/meio-de-campo/298950/atencao--o-red-bull-brasil-pode-ser-a-marca-do-novo-futebol-brasileiro

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Colunista

Rodrigo R. Monteiro de Castro advogado, professor de Direito Comercial do IBMEC/SP, mestre e doutor em Direito Comercial pela PUC/SP, coautor dos Projetos de Lei que instituem a Sociedade Anônima do Futebol e a Sociedade Anônima Simplificada, e Autor dos Livros "Controle Gerencial", "Regime Jurídico das Reorganizações", "Futebol, Mercado e Estado” e “Futebol e Governança". Foi presidente do IDSA, do MDA e professor de Direito Comercial do Mackenzie. É sócio de Monteiro de Castro, Setoguti Advogados.