Meio de campo

O Estatuto Social do Clube Náutico Capibaribe

O Estatuto Social do Clube Náutico Capibaribe.

9/10/2019

Rodrigo R. Monteiro de Castro e Leonardo Barros C. de Araújo

Há alguns dias, o Clube Náutico Capibaribe ("Náutico") conquistou o título da série C do campeonato brasileiro, coroando a campanha que culminou no seu acesso à segunda divisão da liga nacional.

O clube pernambucano é organizado sob a forma de associação civil, desprovido, portanto, de qualquer finalidade lucrativa, não obstante admitir, no art. 3º de seu Estatuto, a possibilidade de constituir sociedade empresária para a gestão de suas atividades profissionais de prática desportiva.

A sua estrutura organizativa divide-se entre os seguintes poderes: assembleia geral, conselho deliberativo, diretoria executiva e conselho fiscal; o que revela uma estrutura básica-formal bastante comum no futebol brasileiro.

Composta pelos associados que preencham os requisitos estatutários, a assembleia geral tem a função de deliberar sobre temas como eleição de presidente e vice-presidente da diretoria executiva e dos membros do conselho deliberativo, destituição de administradores, penalizações do presidente e vice-presidente da diretoria executiva, celebração de determinados contratos imobiliários e extinção, cisão, fusão ou incorporação do Náutico.

Já ao conselho deliberativo compete privativamente, nos termos do Estatuto Social, eleger os seus próprios presidente, vice-presidente e primeiro e segundo secretários, eleger os membros do conselho fiscal, decidir sobre o orçamento e o plano de trabalho da diretoria executiva (após parecer do conselho fiscal), aprovar (ou não) o balanço anual do clube (também após parecer do conselho fiscal), bem como deliberar sobre as seguintes propostas do presidente da diretoria executiva: (i) realização de obras de construção ou reformas; (ii) constituição, pelo Náutico, de sociedade empresária, prevista no art. 3º do Estatuto; (iii) operações de crédito de qualquer natureza; (iv) antecipações de receita que superem o prazo do mandato do presidente da diretoria executiva; e (v) a constituição de ônus sobre os bens do clube; além de outras matérias.

Percebe-se que, do ponto de vista prático, o conselho deliberativo possui grande poder internamente, afigurando-se, talvez, o órgão de maior relevância decisória do clube.

À diretoria executiva, por sua vez, compete gerir o Náutico, mediante planejamento estratégico, com planos de ação e metas, em observância a princípios de responsabilidade organizacional, transparência, eficiência e ética, nos termos do art. 36 do Estatuto. O presidente possui atribuições específicas como representação passiva e ativa do clube, elaboração do regimento interno (para deliberação pelo conselho deliberativo), definição e implantação da estrutura organizacional da diretoria e nomeação dos demais diretores (afora o vice, que é eleito pela assembleia). Também compõem a diretoria executiva as diretorias de futebol, esportes amadores, finanças, administração, jurídica, patrimonial e comercial.

Exige-se para os cargos de presidente e vice da diretoria o atendimento aos requisitos de elegibilidade previstos na Lei da Ficha Limpa, além de outros critérios objetivos estabelecidos estatutariamente (como idade mínima e tempo de associação).

O art. 45 prevê rito para apuração da responsabilidade do presidente e do vice-presidente da diretoria executiva (que também se aplica, naquilo que couber, para o presidente e o vice do conselho deliberativo).

Pode resultar em suspensão ou destituição (a aplicação de advertência não se sujeita a esse procedimento, pelo que indica o Estatuto), por força de violação de deveres, sendo assegurada a ampla defesa, e inicia-se com apresentação de denúncia ao conselho deliberativo, contendo assinatura de pelo menos 10 conselheiros ou associados – denúncia essa que pode ser liminarmente rejeitada caso não esteja acompanhada de provas.

Uma comissão é, então, constituída por três conselheiros (dentre os quais um relator), indicados pelo conselho deliberativo, para apurar a denúncia.

Apresentada a defesa do acusado, a comissão analisa os documentos e informações e produz um relatório, que é submetido ao conselho deliberativo para decisão acerca da suspensão ou destituição do acusado. Essa decisão, contudo, fica sujeita à aprovação da assembleia geral, a fim de confirmá-la ou não.

Independentemente do rito previsto no art. 45, conforme comentado acima, o art. 46 do Estatuto Social do Náutico dispõe que na hipótese de rejeição das contas da diretoria executiva, os membros "diretamente responsáveis pelas finanças do Clube" ficarão inelegíveis por 8 (oito) anos para o exercício de qualquer cargo no Náutico.

Além do exposto, o art. 49 prescreve a responsabilização pessoal do presidente da diretoria executiva por prejuízos causados ao clube por ato doloso praticado em violação estatutária, legal ou regimental.

Ainda quanto aos órgãos do clube, registre-se que o conselho fiscal detém a incumbência de fiscalizar os aspectos contábeis, financeiros e patrimoniais do Náutico (e de seu centro de treinamento – divisão que é feita no Estatuto), devendo examinar livros e documentos, emitir pareceres sobre os balancetes, solicitar esclarecimentos aos diretores e auditores independentes, examinar e opinar sobre as propostas orçamentárias, verificar o cumprimento do orçamento e a aplicação dos recursos, denunciar irregularidades e analisar e emitir parecer sobre o balanço anual.

Por fim, o Estatuto Social do Náutico dispõe acerca das fontes de recursos, do orçamento e das demonstrações financeiras, propondo requisitos mínimos que devem ser contemplados por cada um desses temas.

Verifica-se, diante do exposto, que apesar de conter alguns dispositivos interessantes, o Estatuto Social do Náutico, pelo menos do ponto de vista formal, estabelece uma estrutura de funcionamento que se repete em grande parte dos clubes brasileiros.

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Colunista

Rodrigo R. Monteiro de Castro advogado, professor de Direito Comercial do IBMEC/SP, mestre e doutor em Direito Comercial pela PUC/SP, coautor dos Projetos de Lei que instituem a Sociedade Anônima do Futebol e a Sociedade Anônima Simplificada, e Autor dos Livros "Controle Gerencial", "Regime Jurídico das Reorganizações", "Futebol, Mercado e Estado” e “Futebol e Governança". Foi presidente do IDSA, do MDA e professor de Direito Comercial do Mackenzie. É sócio de Monteiro de Castro, Setoguti Advogados.