Meio de campo

Características do programa de ajuda financeira aos dirigentes e clubes de futebol: o Anteprojeto Pedro Paulo

Características do programa de ajuda financeira aos dirigentes e clubes de futebol: o Anteprojeto Pedro Paulo.

25/9/2019

Rodrigo R. Monteiro de Castro e José Francisco C. Manssur

O deputado Federal Pedro Paulo (MDB/RJ) irá apresentar um projeto substitutivo ao projeto de lei 5.082/16 ("PL 5.082"), que terá, como pilar, o programa de recuperação fiscal das entidades de prática desportiva profissional do futebol ("Anteprojeto Pedro Paulo"). O anteprojeto Pedro Paulo, aliás, rejeita as propostas do mencionado PL 5.082, que pretende criar o novo ambiente sustentável do futebol e o seu instrumento de legitimação e segurança jurídica: a sociedade anônima do futebol – SAF.

Trata-se o Anteprojeto Pedro Paulo, em síntese, de um superpacote de ajuda que oferecerá benefícios relevantes aos clubes devedores – e eventualmente inadimplentes - e incentivará a manutenção do atual sistema amador de gestão (responsável pela crise econômica e de reputação do futebol brasileiro).

Aliás, é sempre bom registrar: esse novo superpacote será viabilizado, se o caso, pelo Estado Brasileiro, que se declara liberal e contrário à concessão de subsídios preservadores de ineficiências produtivas e empresariais, apenas 4 anos após a concessão de outro pacote de favores aos clubes – o Profut -, planejado em 2015, durante o Governo da Presidente Dilma Rousseff.

Ambos os pacotes – o de 2015 e o que se pretende implementar agora em 2019, no mandato do Presidente Jair Bolsonaro – caracterizam-se - curiosa e contraditoriamente, por conta do distanciamento ideológico e das politicas econômicas de seus governos - pela manutenção de um sistema secular de subsídios estatais aos times de futebol, à conta do contribuinte.

Transcrevem-se, assim, a seguir, algumas das características do superpacote de favores que integra o Anteprojeto Pedro Paulo, e se destacam, em negrito, determinados aspectos que envolvem prazo de pagamento de obrigações fiscais, reduções de multas ou juros e possibilidade de utilização de créditos de terceiros para liquidar obrigações fiscais originárias dos clubes associativos (dentre outros aspectos que merecem ser evidenciados).

Aliás, apesar de o Anteprojeto sugerir que tais créditos sejam próprios, eles terão sido gerados, na verdade, por terceiro, isto é, pela empresa na qual o clube se fundir, incorporar ou realizar outra operação societária (e que será, para efeitos do Anteprojeto, o clube-empresa).

Vejamos.

O art. 10 do Anteprojeto prevê que, no âmbito da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, o sujeito passivo que aderir ao Refis do Futebol poderá liquidar os débitos de que trata o art. 9º, mediante a opção por uma das seguintes modalidades:

- Primeira Modalidade: pagamento em espécie de, no mínimo, 10% (dez por cento) do valor da dívida consolidada, sem reduções, em até 5 (cinco) parcelas mensais e sucessivas, vencíveis do 1º (primeiro) ao 5º (quinto) mês subsequente ao de adesão ao Refis do Futebol, e a liquidação do restante com a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL ou de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, com a possibilidade de pagamento em espécie de eventual saldo remanescente em até 84 (oitenta e quatro) prestações adicionais, vencíveis a partir do mês seguinte ao do pagamento à vista;

- Segunda Modalidade: pagamento da dívida consolidada em até 144 (cento e quarenta e quatro) prestações mensais e sucessivas, calculadas de modo a observar os seguintes percentuais mínimos, aplicados sobre o valor da dívida consolidada:

a) da 1ª (primeira) à 24ª (vigésima quarta) prestação: 0,2% (dois décimos por cento);

b) da 25ª (vigésima quinta) à 48ª (quadragésima oitava) prestação: 0,3% (três décimos por cento);

c) da 49ª (quadragésima nona) à 60ª (sexagésima) prestação: 0,4% (seis décimos por cento); e

d) da 61ª (sexagésima primeira) prestação em diante: percentual correspondente ao saldo remanescente, em até 84 (oitenta e quatro) prestações mensais e sucessivas;

- Terceira Modalidade: pagamento em espécie de, no mínimo, 10% (dez por cento) do valor da dívida consolidada, sem reduções, em até 5 (cinco) parcelas mensais e sucessivas, vencíveis do 1º (primeiro) ao 5º (quinto) mês subsequente ao de adesão ao Refis do Futebol, e o restante:

a) liquidado integralmente no 6º (sexto) mês subsequente ao de adesão ao Refis do Futebol, em parcela única, com redução de 95% (noventa e cinco por cento) dos juros de mora e 75% (setenta e cinco por cento) das multas de mora, de ofício ou isoladas;

b) parcelado em até 145 (cento e quarenta e cinco) parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir do 6º (sexto) mês subsequente ao de adesão ao Refis do Futebol, com redução de 85% (oitenta e cinco por cento) dos juros de mora e 60% (sessenta por cento) das multas de mora, de ofício ou isoladas; ou

c) parcelado em até 175 (cento e setenta e cinco) parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir do 6º (sexto) mês subsequente ao de adesão ao Refis do Futebol, com redução de 65% (sessenta e cinco por cento) dos juros de mora e 45% (quarenta e cinco por cento) das multas de mora, de ofício ou isoladas, e cada parcela será calculada com base no valor correspondente a 1% (um por cento) da receita bruta do requerente, referente ao mês imediatamente anterior ao do pagamento, e não poderá ser inferior a 1/175 (um cento e setenta e cinco avos) do total da dívida consolidada;

- Quarta Modalidade : pagamento em espécie de, no mínimo, 12% (doze por cento) da dívida consolidada em 24 (vinte e quatro) prestações mensais e sucessivas e liquidação do restante com a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL ou de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil; ou

- Quinta Modalidade: pagamento em espécie de, no mínimo, 15% (quinze por cento) do valor da dívida consolidada, sem reduções, em até 5 (cinco) parcelas mensais e sucessivas, vencíveis do 1º (primeiro) ao 5º (quinto) mês subsequente ao de adesão ao Refis do Futebol, liquidação do saldo remanescente com redução de 50% (cinquenta por cento) dos juros de mora e 70% (setenta por cento) das multas de mora, de ofício ou isoladas e, após essas reduções, a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL ou de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e o restante liquidado em até 235 (duzentas e trinta e cinco) parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir do 6º (sexto) mês subsequente ao de adesão ao Refis do Futebol, calculadas de modo a observar o seguinte:

a) da 1ª (primeira) à 55ª (quinquagésima quinta) prestação, cada parcela será calculada com base no valor correspondente a 1% (um por cento) da receita bruta do requerente, referente ao mês imediatamente anterior ao do pagamento; e

b) a partir da 56ª (quinquagésima quinta) prestação, cada parcela:

1. será calculada com base no valor correspondente a 1% (um por cento) da receita bruta do requerente, referente ao mês imediatamente anterior ao do pagamento; e

2. não poderá ser inferior a 1/180 (um cento e oitenta avos) do saldo remanescente após o pagamento da 55ª (quinquagésima quinta) prestação.

Importa registrar, ademais, que, na liquidação de determinados débitos com créditos oriundos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL, o Anteprojeto Pedro Paulo autoriza a utilização não apenas do crédito da própria empresa, resultante da fusão, mas, também, dos créditos de empresas controladora e controlada, de forma direta ou indireta, ou de empresas que sejam controladas direta ou indiretamente por uma mesma empresa.

Essas são, enfim, apenas algumas das características do programa de favores e de ajuda financeira aos dirigentes e clubes de futebol, pilar do Anteprojeto Pedro Paulo, que resgata e preserva, em tudo e por tudo, a motivação e o direcionamento de programa anterior, formulado durante a presidência de Dilma Rousseff, e que propiciou a manutenção do ineficiente sistema amador de gestão do futebol, com o beneplácito do Estado – e do Governo; algo que, aparente e surpreendentemente, também poderá ser apoiado pelo atual Governo.

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Colunista

Rodrigo R. Monteiro de Castro advogado, professor de Direito Comercial do IBMEC/SP, mestre e doutor em Direito Comercial pela PUC/SP, coautor dos Projetos de Lei que instituem a Sociedade Anônima do Futebol e a Sociedade Anônima Simplificada, e Autor dos Livros "Controle Gerencial", "Regime Jurídico das Reorganizações", "Futebol, Mercado e Estado” e “Futebol e Governança". Foi presidente do IDSA, do MDA e professor de Direito Comercial do Mackenzie. É sócio de Monteiro de Castro, Setoguti Advogados.