O título deste texto foi extraído de uma matéria publicitária veiculada na edição de sábado, domingo e segunda-feira, dias 13, 14 e 15 de abril, do jornal Valor Econômico. Talvez tenha sido divulgada em outros periódicos ou mídias, mas não fui atrás para verificar.
O papel-jornal, sobre o qual se estampava longo texto informativo, espalhado em página inteira, permaneceu por semanas sobre a minha mesa de trabalho. Via-o todos os dias e chamava minha atenção o início do processo de envelhecimento e consequente "amarelização".
Peguei-o algumas vezes para deitá-lo à lixeira, mas em todas as oportunidades surgia a ideia de guardá-lo para que fosse utilizado, no futuro, como objeto de comentário e de crítica.
Confesso, porém, que essa ideia me dava preguiça. Não queria perder tempo com uma matéria paga, que celebra o próprio pagador, pelo fato de, conforme sua imodesta autopercepção, iniciar o novo ciclo de modernização e profissionalização do futebol brasileiro.
Além disso, também não me sentia à vontade para falar de um contrato cujas condições não conhecia - e ainda não conheço.
Mas resolvi, enfim, livrar-me do incômodo entulho e, ao mesmo tempo, realizar uma espécie de reflexão - breve e superficial, é verdade -, sobre a falta de respeito com o torcedor e o consumidor de futebol.
Sim, é esse, ao final, o sentimento que, durante dias, não conseguia identificar.
A matéria diz que a nova dimensão do futebol brasileiro, que justifica a celebração do novo ciclo de modernização e profissionalização, decorre da assinatura de contrato com a CBF e os clubes, que garante a determinado consórcio empresarial a exclusividade na venda das propriedades de arena do campeonato brasileiro, por prazo mínimo de 5 anos.
Tais propriedades de arena serão exibidas em mais de 300 partidas transmitidas ao vivo por diversos canais e streaming. Isso, ainda de acordo com o texto, pode se expressar por diversos formatos, envolvendo ações de ativação em campo, nas redes sociais, branding, promoção, relação públicas e institucionais.
Trata-se – prossegue – de um esforço para gerar audiência e maior engajamento para as marcas.
E conclui: a parceria estabelece um novo patamar na relação entre marcas e propriedades, com o claro objetivo de alterar o cenário do marketing esportivo nacional e do futebol brasileiro em nível global.
Entendeu?
Então me explique, por favor, o que esse blábláblá significa, e como essa nova relação colocará o futebol brasileiro em nova dimensão.
Num país em que a principal atividade esportiva, outrora motivo de orgulho nacional e admiração internacional, vem sendo destruída pelos desmandos e pelas omissões estatais e pelas apropriações de uma casta cartolarial, a divulgação do texto revela, apenas, um subterfugio, travestido de anúncio de interesse público, para justificar o início de uma relação empresarial que não modificará os rumos do futebol e não o mudará de dimensão.
Seu conteúdo, aparentemente complexo, é um nada do ponto de vista material. Pior: parece que reforça o equívoco de décadas atrás, impulsionado pelo advento da Lei Pelé e pela euforia com a possibilidade de iniciação de um processo de transformação dos clubes em empresa, que, além de mal concebido, foi atropelado pela marketização do futebol.
Esse é o caminho que, aparentemente, se pretende seguir: da reconstrução da história da administração do futebol, por meio de um ambicioso projeto de marketing, que apagará (ou tentará apagar) os desvios históricos, com o apoio de uma série de mecanismos e de ferramentas formais, justificadores de um discurso adequado para o atual momento sociopolítico, mas que, na prática, além de nada mudar, reforçará a preservação do status quo.
É isso, e nada além disso, o significado da expressão "nova dimensão" do futebol brasileiro.