A insistência com que se trata, nesta coluna, da crise estrutural do futebol brasileiro é motivada pelos evidentes e recorrentes sinais internos e externos de deterioração do ambiente.
Não bastasse o desperdício de atividade econômica única, pujante e universal, ainda se joga pelo ralo a possibilidade de sua utilização como instrumento de desenvolvimento social.
No plano interno, algumas (poucas) pessoas ganham, eventualmente muito, com essa situação, e oferecem toda sorte de obstáculos para evitar o surgimento de um novo marco regulatório do futebol.
Aliás, o modelo vigente, construído sobre pilares que deixaram de cumprir função de sustentação, serve, paradoxalmente, para manutenção do status quo.
O dogma maior é o sistema tributário. Não que seja algo simples, pois não é. A passagem do modelo associativo para o de mercado tem consequências relevantes que somente se compensam, enquanto o Projeto da SAF não se tornar lei, pela organização de uma empresa econômica futebolística eficiente e competitiva.
Esses requisitos, porém, deveriam estimular, e não obstaculizar, o processo. A potencialidade, aliás, é comprovada pelo sucesso organizacional do futebol europeu, que superou o mesmo dilema, e se posicionou como o principal – e talvez único – mercado realmente relevante do planeta.
No plano externo, as evidências de que a nova ordem empurra o Brasil para a mais distante periferia são inequívocas.
O Movimento se iniciou com a ruptura com o modelo clientelista e a compreensão de que, além de jogo, o futebol é um negócio global. Daí a concepção e a adoção de mecanismos de financiamento da empresa, que viabilizam inicialmente a importação de jogadores formados e, na sequência, a importação em massa de jogadores em formação.
Esse modelo reforça a desigualdade que se revela nos confrontos entre clubes ou seleções. Esta situação, no entanto, decorre menos da localização geográfica e da instabilidade das moedas ou governos locais, do que da ineficiência sistêmica mantida e defendida pelos donos ocultos do futebol.
O propósito, nos dias atuais, está muito claro: países como o Brasil devem fornecer matéria prima para o desenvolvimento europeu. Nada muito diferente do que se passa desde as invasões e conquistas ibéricas, como ensina Eduardo Galeano: "Os metais arrebatados aos novos domínios coloniais estimularam o desenvolvimento europeu e até se pode dizer que o tornaram possível".
Não bastasse a redução dos times brasileiros a exportadores de matéria-prima, pretende-se, ademais, aniquilar o símbolo cambaleante de resistência, uma espécie de Palmares, abalada pelas interferências dos mesmos donos ocultos do futebol: a seleção.
O instrumento é a Liga das Nações da UEFA, que servirá para isolar ainda mais a periferia do centro mundial do futebol, e reduzir as seleções sul-americanas a (indesejadas, porém necessárias) coadjuvantes.
Portanto, o problema passou a ser também da CBF, e não apenas dos clubes. Seus dirigentes têm a oportunidade de impor um novo modelo e reconquistar o prestígio perdido, ou ficarão marcados na história como os algozes do futebol brasileiro.