Meio de campo

Raí

Raí.

15/8/2018

No início do ano, com resultados ainda pouco animadores, as cornetas esboçaram um movimento na direção de Raí (e de seus diretores Lugano e Ricardo Rocha) e de seu time. Lembremos: suas contratações foram questionadas, o sistema de jogo teimava em aparecer e o treinador escolhido para comandar o processo, Aguirre, foi recebido com pouco entusiasmo.

Contra Raí pesava um fato, é verdade: era sua primeira experiência no cargo de direção de futebol.

A favor dele, no entanto, contavam muitos aspectos, que não podiam – e não podem – ser ignorados: (i) como afirmou o jornalista Victor Birner no programa Cartão Verde, ele vinha de dentro, do conselho de administração, e sabia o tamanho do desafio; (ii) se preparara, desde que deixou os gramados, para a função; (iii) era – e é – boleiro, e fala o idioma dos jogadores; (iv) é respeitado e admirado; e (v) tem uma visão contemporânea da estrutura do futebol e sabe que, se não vier uma mudança, os times brasileiros não sairão da crise em que estão.

Essas características deveriam contribuir para que se reconhecesse, no projeto, um desafio que transcendia uma questão pessoal e, de certo modo, do São Paulo, mas que se podia afirmar essencial para o futebol como um todo.

O insucesso, por outro lado, serviria para apagar mais um ídolo tricolor – no caso o maior de todos os tempos -, e reafirmar a supremacia cartolarial na condução dos temas pseudo-clubísticos.

Esse dilema foi ignorado e a demanda por resultados imediatos, como de costume, surgiu de todos os lados. O jornalista Menon apontou, em texto denominado "Raí precisa corrigir os erros que cometeu", publicado em 23 de abril de 2018, que "ídolos devem participar da direção dos clubes, após a aposentadoria? Não há nada contra. Há até uma torcida para que dê certo. A cobrança, porém, deve ser igual. Ídolos podem errar. E Raí errou muito. Contratou Trellez, Diego Souza e o time jogou sem centroavante no segundo tempo contra o Ceará. Como resolver? Não sei. Raí, Ricardo Rocha, Lugano e Leco são bem pagos para resolver o assunto (...)".

O problema era de perspectiva; ou melhor, é. Neste momento, porém, com sinal trocado: uma perspectiva exageradamente otimista, pela posição de liderança no campeonato brasileiro.

O projeto de Raí e de seus executivos, Lugano e Ricardo Rocha, não é de curto prazo.

Isso deveria ser óbvio, ao menos aos mais atentos e iniciados analistas do esporte. O que agora se produz ali, sob a presidência de Leco, é um movimento estrutural de time, e não um time para um campeonato ou para um ano; são sintomas de atos anteriores que, apesar de mais lentos do que se imaginavam, já começam a se manifestar.

De todo modo, a construção de alicerces não se finaliza em dias, semanas ou poucos meses. O que se projeta, portanto, é uma nova estrutura, que criará um padrão identificável da base ao profissional. Isso demandará tempo e (alguma) paciência.

Ou seja, não podemos nos iludir: o trabalho de Raí está apenas começando. A ponta do campeonato veio antes do que o mais otimista dos são-paulinos podia imaginar. Melhor assim. Porém, a ele deve ser dado o tempo necessário para cumprir a sua longa missão, qualquer que seja a posição final na tabela.

Raí merece – e merecerá - o apoio e a confiança dos dirigentes e dos torcedores. Pelo bem do São Paulo, pelo bem do futebol brasileiro.

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Colunista

Rodrigo R. Monteiro de Castro advogado, professor de Direito Comercial do IBMEC/SP, mestre e doutor em Direito Comercial pela PUC/SP, coautor dos Projetos de Lei que instituem a Sociedade Anônima do Futebol e a Sociedade Anônima Simplificada, e Autor dos Livros "Controle Gerencial", "Regime Jurídico das Reorganizações", "Futebol, Mercado e Estado” e “Futebol e Governança". Foi presidente do IDSA, do MDA e professor de Direito Comercial do Mackenzie. É sócio de Monteiro de Castro, Setoguti Advogados.