Rodrigo R. Monteiro de Castro e Leonardo Barros C. de Araújo
Há pouco menos de 1 ano, previmos que o Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro – PROFUT ("Profut" ou "Programa") não salvaria ou resgataria o futebol brasileiro1.
O tom da projeção não foi profético, mas ela, de fato, se concretizou: atualmente, os clubes discutem formas de flexibilizar regras contidas no Programa, como a manutenção da regularidade de suas obrigações trabalhistas e tributárias federais correntes, pois se viram incapazes de cumpri-las2.
Prever o insucesso do Profut não foi tão difícil assim, infelizmente. E nem causa satisfação.
Apesar dos méritos e avanços, o Programa foi construído sobre uma base punitiva - o que tem algum sentido, sem dúvida, diante do histórico de inadimplência e de apropriação indevida das riquezas dos clubes -, que o afasta, porém, do seu verdadeiro propósito: a recuperação.
Alguns aspectos eram evidentes. O Profut estabeleceu, por exemplo, tipo de parcelamento especial, que permitiu a redução do passivo e o escalonamento do pagamento das dívidas, com a finalidade de aliviar a situação financeira e o fluxo de caixa dos clubes aderentes. Em contrapartida, exigiu o atendimento de determinados critérios, sob pena de rescisão do parcelamento, dentre eles, a mencionada regularidade das obrigações trabalhistas e tributárias federais, bem como a publicação de demonstrações contábeis auditadas, a limitação de gastos com atletas profissionais de futebol em, no máximo, 80% da receita bruta anual com tal atividade, entre outros.
São medidas necessárias, é verdade, e que poderiam ter contribuído para a obtenção de melhorias. Mas não foram e não são suficientes, pois se prestam, na prática, a trazer algum alento para um modelo esgotado e irreversivelmente falido.
Para tentar ilustrar, seria mais ou menos como jogar água mineral no Rio Tietê, com o propósito de purificá-lo.
Assim, apesar de a lei 13.155/2015, criadora do Profut, ter formulado reformas importantes, não produzirá, sem a concepção de outros mecanismos menos defensivos, os efeitos pretendidos. A salvação exigirá, como no caso do maltratado rio, uma mudança comportamental e estrutural.
Portanto, não basta dar a oportunidade de parcelar dívidas e exigir, como contrapartida, algumas poucas medidas de cunho intervencionista, mantendo-se, no entanto, o modelo secular associativo, que já foi abandonado em praticamente todos os centros relevantes de prática do futebol.
A reforma deve ser mais ampla e estrutural.
Deve envolver e transformar os modelos de governança e de propriedade.
Deve permitir o financiamento da empresa futebolística.
Deve, ainda, criar os meios para que os clubes em dificuldade encontrem saídas fora do paternalismo estatal e do sistema de subsídios.
Enquanto não for proporcionado esse ambiente, leis como a do Profut servirão para resolver apenas problemas imediatos; e esses problemas voltam, a exemplo do que se verifica atualmente com os clubes aderentes, que estão com dificuldades para cumprir com as obrigações do Programa.
Pode-se argumentar, até, que o insucesso decorre da resistência em relação à mudança. É verdade, para alguns. No entanto, há, sim, os que desejam melhorar, porém não conseguem, ante à inexistência de uma saída viável.
O Profut precisa de socorro. Mas, o socorro não virá do Profut ou de sua revisão casuística e oportunista.
Virá de outras iniciativas - como o projeto de lei 5.082/16, da Sociedade Anônima do Futebol, ou de uma nova proposta de recuperação judicial da atividade futebolística - que busquem criar o ecossistema propício ao desenvolvimento e ao financiamento do futebol brasileiro, e, assim, permitir que se gerem receitas e riquezas para o cumprimento dos propósitos pretendidos no Profut.
Enquanto não se pensar e oferecer uma solução sistêmica, o país continuará a produzir um ciclo vicioso de medidas ineficazes.
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1 Profut: uma iniciativa paliativa.
2 Clubes não cumprem exigência do Profut e podem desfalcar Estaduais.