Leitura Legal

Bem-estar animal

O governador de SP sancionou lei para proteção de cães e gatos, destacando seu bem-estar. Reflete tendência judicial de considerar animais como seres sencientes, exigindo cuidados e punindo maus-tratos severamente.

21/7/2024

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, (Republicanos) sancionou a lei 17.972/241, em vigência desde o dia 11/7 do ano em curso, que dispõe sobre a proteção, a saúde e o bem-estar na criação e na comercialização, exclusivamente de cães e gatos domésticos, no território paulista.

É interessante observar que o convívio entre o homem e o animal – especificamente cão e gato – vem se estreitando cada vez mais no plano afetivo. Basta ver que os tribunais, já de forma consolidada, vêm concedendo a guarda compartilhada de animais de companhia em casos de divórcio. Percebe-se, com muita facilidade, que a convivência reflete uma harmonização saudável entre ambos, cabendo ao tutor a obrigação de cuidar não só do item alimentação, como, também da saúde e higiene do animal.

A lei dos Crimes Ambientais, por sua vez, já carrega esta preocupação. Tanto é que lançou seus tentáculos protetivos no acréscimo feito ao art. 32, acarretando, em consequência, a punição agravada com relação à prática de maus-tratos, ferimentos ou mutilação a esses animais, com a aplicação da pena de reclusão de 2 a 5 anos, multa e proibição da guarda do animal.

Não só. A lei 9.605/98, já referida, foi modificada a passou a considerar os animais não mais como bens móveis e sim como seres sencientes. A palavra senciência não guarda afinidade etimológica com a palavra sapiência. Ambas carregam raízes provenientes do latim. Enquanto sapiência (sapere) tem o significado de inteligência, conhecimento, senciência (sentire) tem o significado de sentir, ou na capacidade de sentir. Então, quando se fala em respeito à sensibilidade do animal, deve compreender que se trata de um ser vivo, detentor de uma vida incorporada à dignidade de sua natureza. Quer isto significar que, assim como o humano estabeleceu suas regras e quer ser bem tratado, de igual forma o animal, pelo regramento natural, quer idêntico tratamento.

A lei paulista também erigiu, dentre outros fatores, a sensibilidade dos animais como um dos fundamentos da proteção da saúde e o bem-estar de cães e gatos. Nessa perspectiva, o homem, revestido da dignidade, carrega consigo uma carga de direitos e deveres que propulsiona a busca da perfeição - pelo menos é a meta primordial da humanidade - e, nessa trajetória, compreende o relacionamento com o reino animal. Se for insensível com aquele que é sensível, numa desastrosa colidência, ultrapassando os limites do humano, demasiadamente humano apregoado por Nietzsche, certamente estará descumprindo regra básica e fundamental de convívio harmônico.

A lei traz em seu corpo uma interessante inovação voltada justamente para a integração entre homem e animais, inexistente nos demais textos legais, ao definir saúde única, que  "representa uma visão integrada da saúde humana, saúde animal e saúde ambiental, que reconhece o vínculo estreito entre o meio ambiente, as doenças dos animais e a saúde da população humana, empregada como base de políticas, normas e programas, que contribuam com a eficácia das ações em saúde pública e proteção do meio ambiente".

Também esclarecedora a definição a respeito do agente da legalidade: Responsabilidade que recai sobre o médico-veterinário incumbido de orientar as atividades do estabelecimento visando a garantir a saúde única, o bem-estar animal e o cumprimento das exigências legais, éticas e técnicas preconizadas para a área de atuação em questão.

Além disso traz inúmeras inovações, dentre elas podem ser citadas as exigências para realizar atividade econômica de criação de cães e gatos domésticos; proibição de expor animais em vitrines fechadas ou alojados em espaços que impeçam sua movimentação, amarrados ou em quaisquer condições exploratórias que lhes causem desconforto e estresse a ponto de afetar sua saúde física e/ou psicológica; a obrigatoriedade de realizar o comércio ou permuta apenas por criadores e estabelecimentos comerciais, assim cadastrados e  a proibição da distribuição de cães e gatos a título de brinde, promoção, sorteio de rifas e bingos em todo o Estado.

Em boa hora a providência governamental, levando-se em consideração que o mercado pet continua em ascendência e promissor, necessitando, portando, de regras mais consistentes para sua regulação.

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1 Disponível aqui.

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Coordenação

Eudes Quintino de Oliveira Júnior promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, pós-doutorado em Ciências da Saúde e advogado.