O presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª região, após apreciar a decisão proferida pela Justiça de 1ª instância em pedido de tutela de urgência proferida pela Justiça Federal do Ceará, suspendeu os efeitos da liminar concedida. A decisão de primeiro grau exigia dos passageiros de voos com destino ao Ceará a apresentação do comprovante de vacinação completa, com uma ou duas doses, dependendo do imunizante, ou do resultado negativo do exame antígeno ou RT-PCR, realizado até 72 horas antes do embarque.
Caminhou a Justiça de segundo grau por uma trilha segura quando suspendeu os efeitos da decisão proferida e que trazia restrições de acesso ao Estado do Ceará, além do que, mais importante ainda, a sentença não apresentou suporte probatório suficiente para demonstrar a necessidade e a urgência da drástica medida.
A Organização Mundial da Saúde, após constatar no mês de janeiro de 2020 que o surto da doença provocada pelo coronavírus (Covid-19) atingiu cinco continentes, não hesitou em declarar o estado de pandemia. A partir daí cada Estado passou a legislar a respeito das medidas necessárias e adequadas para o combate ao vírus, observando ao menos as regras básicas e fundamentais recomendadas pela organização.
O Brasil, em fevereiro de 2020, após proclamar Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), sancionou a lei 13.979/2020, de caráter excepcional, temporária, caracterizada por circunstâncias que determinaram sua edição, que prevê medidas de enfrentamento da emergência da saúde pública, com a finalidade de evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus. Dentre as medidas previstas no artigo 3º para o enfrentamento, destacam-se as de realização compulsória, compreendendo: exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação, outras medidas profiláticas ou tratamentos médicos específicos.
As medidas previstas na referida lei e que objetivam a proteção da coletividade são de competência do Poder Executivo, inclusive aquelas que compreendem a restrição excepcional e temporária de entrada e saída do país, desde que haja a recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), por rodovias, portos e aeroportos.
Para tanto, já que existe a lei considerando situação de emergência e com previsão de enfrentamento para a proteção da coletividade, nada mais justo que ocorra a restrição a alguns direitos individuais em favor do interesse coletivo. Ao mesmo tempo em que se ergue a proteção para a pessoa contaminada, a própria comunidade é alcançada, pois trata-se de uma de medida preventiva de saúde.
Ora, no caso relatado, percebe-se claramente que o Estado para o qual foi voltada a decisão encontra-se no mesmo patamar de igualdade sanitária dos demais. O Judiciário pode sim intervir excepcionalmente na esfera de competência do Executivo, desde que haja o demonstrativo inequívoco de omissão ou erro manifesto das autoridades administrativas competentes com a potencialidade de causar danos à coletividade local. Não é recomendado e nem goza de competência de regulação o Estado, isoladamente - sem qualquer motivo determinante - criar protocolo próprio sanitário com a proibição de movimentação da população em seu próprio território ou daqueles que pretendem frequentá-lo e, para tanto, utilizam o transporte aéreo.
É certo que a comunidade científica vem se manifestando reiteradamente que a vacina se apresenta como o único recurso seguro e eficaz para a prevenção da Covid-19. Tanto é que pela resposta mundial, quanto maior o número de imunizações, menor será o número de infectados e óbitos. Basta ver que alguns países já criaram as cepas dos vacinados e não vacinados, esses com restrições de frequentar espaços e locais públicos.
A prefeitura municipal de São Paulo, no âmbito de sua competência, publicou o decreto 6.044/2021, determinando a obrigatoriedade de vacinação contra a Covid-19 para todos os funcionários de autarquias, fundações e da administração indireta. Em caso de recusa, sem justa causa médica, caracterizará falta disciplinar do servidor ou do empregado público. Nos mesmos moldes o decreto 49.286/21, publicado pela prefeitura municipal do Rio de Janeiro.
E, ao que tudo indica, nova lei, agora nacional, deverá ser editada para regulamentar a obrigatoriedade ou não da vacina fora do estado pandêmico. "O balanço entre o bem-estar individual e bem-estar do grupo, afirma categoricamente Stepke, deve ser considerado ao se desenvolver ou modificar qualquer sistema de cuidado de saúde".1
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1 Stepke, Fernando Lolas, José Geraldo de Freitas Drumond. Fundamentos de uma antropologia bioética: o apropriado, o bom e o justo. São Paulo: Centro Universitário São Camilo: Loyola, 2007, p. 73.