"Antropologia Jurídica"
Editora: Campus-Elsevier - Campus Jurídico
Autor: José Manuel de Sacadura Rocha
Páginas: 133
Em sua explicação inicial acerca das razões de ser da Antropologia, o autor já deixa entrever o fundamento de sua proposta para um curso que chama de filosofia antropológica do Direito: "No século XIX, (...) na ânsia de ajudar a compreender e organizar o sistema liberal burguês europeu, o caos promovido pelo capitalismo, a Antropologia vai voltar-se para o estudo das comunidades 'exóticas' e 'selvagens' encontradas nos territórios colonizados. Portanto, a antropologia científica passa a se interessar pelo diferente na ânsia de entender o homem civilizado, industrial, moderno e burguês." Ou pouco mais adiante, quando preleciona que a Antropologia, ao observar as sociedades primitivas, busca obter "explicação para o surgimento do poder e a possível conseqüência do Estado".
Crê que as relações contemporâneas dos cidadãos com o Estado estão enfermas, que o dogmatismo jurídico não realiza as promessas de liberdade e igualdade que o mundo ocidental persegue desde a queda da Bastilha, e a partir desse diagnóstico, propõe tratamento heterodoxo, quiçá panfletário, que chama de 'Ética desobediente', "como instrumento de estranhamento ao dogmatismo autoritário impregnado no ordenamento e nas práticas jurídicas dos Estados modernos". Propõe perscrutar, nas comunidades primevas, o "estranhamento do poder e do Estado".
Ainda que a estudiosos do Direito exortações como essas soem estranhas, não se afastem, leitores, e apliquem ao caso o princípio da fungibilidade recursal, que de equivocado parece haver só o rótulo. O percurso teórico apresentado na obra é pertinente, e parte de clássicos da antropologia para chegar a instigante estudo de caso sobre o processo de formação da idéia de identidade brasileira. Vale destacar trecho em que afirma, na esteira da tradição fundada pelo historiador Sérgio Buarque de Hollanda, (embora sejam outros os sociólogos citados) em seu célebre e ainda muito atual Raízes do Brasil, que, em nosso país, "(...) O relacional que substitui o constitucional não é prerrogativa apenas das elites (...) mas o modus vivendi genérico (...)".
Ao fim e ao cabo, a obra funciona como sedutor convite à leitura e ao estudo de textos não-jurídicos, a incursões em territórios que forneçam a nós, operadores do Direito, categorias de análise outras. É instrumento para apurar o olhar.
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Ramon Zanella de Oliveira, de Criciúma/SC
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