Na coluna do dia 30 de agosto de 2022, intitulada A novela do Fisco na Recuperação judicial: cenas do próximo capítulo, Daniel Carnio Costa e Liliane Midori Yshiba Michels apresentaram preciso relato da discussão envolvendo o processo de recuperação e a dívida tributária, seja sob o aspecto jurisprudencial, seja sob o aspecto legislativo.
Para os autores, o próximo capítulo será protagonizado pelo Superior Tribunal de Justiça, que, recentemente, por meio de decisão monocrática, voltou à cena, estabelecendo a divergência, ainda que momentânea, entre a Justiça Ordinária (TJSP) e a Corte Superior.
Paulo Penalva, na coluna do dia 13/09/2022, também discorreu sobre o assunto, e o fez sob a ótica do artigo 57. Após afirmar que a possibilidade de equacionamento do passivo tributário, por meio de parcelamentos, não tem influência na interpretação do artigo 57, concluiu, com inteligência, que o equacionamento do passivo tributário é condição econômica e não condição jurídica para a superação da crise do empresário.
Em razão da inegável importância, volto ao assunto nesta coluna.
Recordo-me que em janeiro de 2006 (vejam que a novela é antiga) atuei no caso Parmalat. Ainda estava no Ministério Público de primeiro grau e, após a aprovação do plano de recuperação judicial pela assembleia de credores, a Fazenda Pública Estadual peticionou pedindo a apresentação das certidões previstas no artigo 57 da Lei 11.101/05.
A manifestação1 da Promotoria de Justiça foi no sentido da inconstitucionalidade do artigo 57. A decisão de lavra do Magistrado Alexandre Lazzarini dispensou a apresentação das certidões negativas de tributo, e o fez por mais de um fundamento2.
A inconstitucionalidade defendida pela Promotoria de Justiça jamais foi acolhida; nem discutida, a bem da verdade. Eu continuo convencido da inconstitucionalidade da norma, que é uma sanção política. Porém, o assunto desta coluna é outro, que parte da premissa de que a lei é constitucional.
Com a reforma da Lei 11.101/05, em 2020, foram introduzidas modificações em prol do Fisco. Contudo, como bem explicaram Daniel Carnio e Liliane Midori, “A reforma promovida pela Lei n. 14.112/2020 não alterou a opção legislativa em relação à exclusão dos créditos tributários do processo de recuperação judicial”.
Essa é a questão essencial, e, por essa razão, o problema por mim suscitado em janeiro de 2006 sobrevive e a ele retorno nesta coluna, ainda que muito brevemente, e por outra ótica. Sem falar de inconstitucionalidade, pretendo usar, como pano de fundo, a derrotabilidade, tema da teoria do direito.
Pois bem. Recentemente, por ocasião do julgamento sobre a possibilidade de aplicação de equidade na fixação de honorários advocatícios de sucumbência (RESP 1.664.077), o fundamento do ilustrado voto vencido, de lavra da Eminente Ministra Nancy Andrighi, foi a derrotabilidade.
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1 O parecer foi publicado no livro Jurisprudência da nova lei de recuperação de empresas e falências, de Manoel Justino Bezerra Filho. São Paulo, RT, 2006, p. 132-143.
2 A decisão foi publicada no livro referido na nota anterior, p. 152-155.