Gramatigalhas

Qualquer (é sinônimo de nenhum?)

Qualquer (é sinônimo de nenhum?). O professor José Maria da Costa esclarece.

29/7/2009

A leitora Isabela M. A. Miranda envia a seguinte mensagem ao Gramatigalhas:

"É correto o uso do 'qualquer' com a significação de nenhum? (Ex. 'Não há qualquer ilicitude na conduta' ou 'Não vi qualquer razão para o pedido'; 'Não há qualquer embasamento jurídico em sua petição'.)"

1) Napoleão Mendes de Almeida, com ponderosos argumentos e exemplos, condena o uso de tal vocábulo com a significação de nenhum, e taxativamente indica o caminho para solucionar os casos concretos: "Quando qualquer não vier na oração com a significação de nenhum, o seu emprego será então justo".1

2) Assim, são incorretos os seguintes exemplos: a) "Não vi qualquer razão para o pedido"; b) "Ele não se muniu de qualquer embasamento jurídico em sua petição".

3) Devem eles ser assim corrigidos: a) "Não vi razão alguma para o pedido"; b) "Não vi nenhuma razão para o pedido"; c) "Ele não se muniu de nenhum embasamento jurídico em sua petição"; d) "Ele não se muniu de embasamento jurídico algum em sua petição".

4) Josué Machado, inserindo tal equívoco no rol das "coisas lamentáveis", anota que "qualquer não pode substituir nenhum porque não significa nenhum, não tem sentido negativo nem de exclusão".2

5) É bem verdade que, asseverando que "certos gramáticos não condescendem com o uso de qualquer no sentido de nenhum em frases negativas", preconiza Domingos Paschoal Cegalla que "não se deve condenar o emprego de qualquer nesta acepção, tão generalizado está".3

6) Todavia, com todo o respeito ao eminente gramático, se verdade é que o uso se constitui no grande mestre do idioma, não menos certo é que, para que seja alçado a tal condição, há de ser ele remansoso e pacífico no padrão culto, o que não se dá no caso analisado, atendo-se a mencionada generalização tão-somente à linguagem informal.

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1 Cf. Almeida, Napoleão Mendes de. Dicionário de Questões Vernáculas. São Paulo: Editora Caminho Suave Ltda., 1981. p. 200.

2 Cf. Machado, Josué. Manual da Falta de Estilo. 2. ed. São Paulo: Editora Best Seller, 1994. p. 30-31.

3 Cf. Cegalla, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 340.

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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.