O leitor José da Silva Nava Júnior, da Secretaria da Fazenda do Estado do Pará, envia-nos a seguinte mensagem :
"Prezado Professor José Maria da Costa, como devemos dizer : Socorremos-nos ou socorremo-nos ? Valemos-nos ou valemo-nos ? Restringimos-nos ou restringimo-nos ? Por quê ?"
1) Da conjugação de um verbo seguido de pronome pessoal oblíquo átono, podem surgir associações que vale a pena observar.
2) Assim, se o verbo termina por vogal e é seguido de o, a, os, as, a junção ocorre sem alteração alguma : entregou + o = entregou-o; dou + as = dou-as.
3) Se o verbo vem seguido de vos ou lhes, a junção também se faz sem alteração alguma: entregamos + vos = entregamos-vos; entregamos + lhes = entregamos-lhes.
4) Se a primeira pessoa do plural vem seguida do pronome nos, o verbo perde o s final: entregamos + nos = entregamo-nos.
5) Bem nessa esteira, lembra Mário Barreto que, nesses casos, o correto "é suprimir-se o s final da primeira pessoa do plural quando o pronome nos vem após o verbo.1
6) Na lição de Domingos Paschoal Cegaila, em casos dessa natureza, "para atender à eufonia, suprime-se o s final da primeira pessoa do plural dos verbos, quando seguida do pronome nos".2
7) Se o verbo termina por m ou ditongo nasal e é seguido de o, a, os, as, a forma verbal permanece inalterada, e o pronome é precedido de um n: entregaram + a = entregaram-na; dão + o = dão-no.
8) Se o verbo termina por r, s ou z e é seguido de o, a, os, as, aquelas consoantes são eliminadas, e os pronomes passam a ter as formas lo, la, los, las: encontrar + o = encontrá-lo; encontrar + a + ei = encontrá-la-ei; procuras + os = procura-los; fiz + as = fi-las.
9) Nos dizeres de Artur de Almeida Torres, "nas formas verbais terminadas em r, s ou z, seguidas do pronome oblíquo o, a, em sua antiga representação lo, la, aqueles fonemas assimilaram-se ao l, desaparecendo depois: mandar-lo, mandallo, mandá-lo; levastes-lo, lesvastello, levaste-lo, fez-lo, fello, fê-lo".3
10) Cândido Jucá Filho, nesse aspecto, lembra que Filinto Elísio, "censurando os críticos ignorantes, incide nesta erronia grosseira: 'E chamais-los puristas e censores?' (isto é, 'chamai-los')".4
11) Se o verbo termina por ns, segue-se a observação anterior, apenas com a transformação do n remanescente em m: tu manténs + o = tu mantém-lo; tu tens + o = tu tem-lo.5
12) De Édison de Oliveira é interessante observação sobre o assunto, muito embora em nada altere a realidade gramatical nem institua permissão para o cometimento dos equívocos em norma culta: "É claro que a maioria dessas combinações, embora rigorosamente corretas de acordo com a gramática, são freqüentemente evitadas na linguagem cotidiana, e até na linguagem literária, por estranhas ou mal sonoras, sendo fácil transmitir a mesma idéia através de outras construções".
13) E, "para evidenciar o caráter excêntrico que a forma verbal assume em tais circunstâncias", exemplifica tal autor com a conjugação completa de um tempo verbal seguido de pronome: quero + o = quero-o; queres + o = quere-lo; quer + o = qué-lo; queremos + o = queremo-lo; quereis + o = querei-lo; querem + o = querem-no).6
14) De modo específico para a consulta formulada, o correto é "Encaminhamos-lhes anexos exemplares da cartilha", e não "Encaminhamo-lhes anexos exemplares da cartilha".
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1 Cf. Barreto, Mário. Fatos da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Organização Simões Editora, 1954. p. 141.
2 Cf. Cegalla, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 139.
3 Cf. Torres, Artur de Almeida. Moderna Gramática Expositia. 18. ed. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultra, 1966. p. 15.
4 Jucá Filho, Cândido. Curso de Português - Segundo Ano Colegial. São Paulo: Companhia Editora, 1954. p. 31.
5 Cf. Ribeiro, Júlio. Gramática Portuguesa. 8. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1908. p. 257.
6 Cf. Oliveira, Édison de. Todo o Mundo Tem Dúvida, Inclusive Você. Porto Alegre: Gráfica e Editora do Professor Gaúcho Ltda., edição sem data. p. 137.