O leitor Enio Pereira da Rosa envia-nos a seguinte mensagem:
"Após ler o merecido agradecimento ao mestre José Maria da Costa contido no Direto da Redação desse poderoso rotativo, fico a me perguntar o que teria a dizer o insigne mestre ao ler no referido texto (Migalhas 1.728 – 29/8/07)... agradecê-lo em vez de agradecer-lhe, pois, salvo melhor juízo, quem agradece algo o faz a alguém por meio de complemento verbal indireto, logo, com preposição."
O leitor Sílvio Alonso, acerca do mesmo assunto, assim também se manifestou:
"Leio nos esclarecimentos de Migalhas (1.728 – 29/8/07): 'Nós aqui de Migalhas, em nome dos migalheiros, é que temos de agradecê-lo'. - Agradecê-lo ou agradecer-lhe, meu caro professor? Isso está parecendo aquela ressalva célebre do escrevente: Onde digo digo não digo digo digo Diogo. Enfim, herrare humanum oeste."
1) A dúvida que se põe é se, quando se quer agradecer a uma pessoa, diz-se agradecê-lo ou agradecer-lhe?
2) Vale sempre lembrar, como princípio básico, que o estudo do relacionamento entre as palavras na frase diz respeito a uma parte da Gramática denominada sintaxe (do grego sin = conjunto + taxe = construção).
3) E o capítulo específico da Gramática que trata das preposições exigidas pelo verbo para iniciar seu complemento (ou mesmo ausência de preposição) chama-se regência verbal.
4) Em nosso idioma, as questões de construção, ou seja, de sintaxe, são solucionadas pelo uso que nossos melhores autores, desde Camões (1524-1580), fizeram do idioma pátrio. E a expressão melhores autores deve abranger aqueles escritores que empregaram o vernáculo com apuro e zelo.
5) Buscar, porém, na obra literária dos nossos melhores autores, como foi o emprego da regência do verbo agradecer é como procurar agulha em um palheiro.
6) Mas isso não é necessário, pois, de um modo geral, estudiosos e gramáticos já realizaram estudos nesse sentido, compilaram milhares de exemplos e sistematizaram, em monografias preciosas, grande parte da sintaxe de vocábulos dessa natureza.
7) De modo específico para os limites da indagação, ensina Domingos Paschoal Cegalla que o verbo agradecer "constrói-se com objeto indireto de pessoa" (e pede a preposição a). Ex.: "Ele agradeceu ao doutor e saiu".1
8) Feita essa observação de que o verbo agradecer, nesse sentido, pede objeto indireto com a preposição a, caminha-se mais um passo. Os pronomes pessoais oblíquos átonos o, a, os e as servem para funcionar como objetos diretos, enquanto os pronomes lhe e lhes servem para substituir objetos indiretos. Exs.:
a) "O juiz sentenciou o caso";
b) "O juiz sentenciou-o";
c) "O documento pertence aos autos";
d) "O documento pertence-lhes".
9) Com essas premissas, parece não haver dúvida, assim, quanto ao acerto ou erronia dos exemplos trazidos como dúvida, para quando se quer agradecer a uma pessoa:
I) "Ele quis agradecer o autor" (errado);
II) "Ele quis agradecê-lo" (errado);
III) "Ele quis agradecer ao autor" (correto);
IV) "Ele quis agradecer-lhe" (correto).
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1Cf. CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1999, p. 16.