Gramatigalhas

Inobservar - Existe?

Inobservar - Existe? O Professor José Maria da Costa esclarece.

28/9/2022
O leitor Cássio Bustamante de Lima envia à coluna Gramatigalhas a seguinte mensagem:

"Dr. José Maria, tendo sempre lido em suas colunas que o VOLP é o órgão incumbido de determinar a existência de vocábulos em nosso idioma, ocorreu-me uma dúvida. Em consulta àquele, identifiquei que existe a palavra inobservar. Um dos meus colegas de trabalho, porém, com base em consulta ao Aurélio, insiste que não existe tal verbo. Seguindo os seus ensinamentos, gostaria de saber se posso usar tal termo com o mesmo significado de 'não se verifica' ou 'não se observa'? Em caso negativo, qual seria o real significado atribuído a tal verbo?".

1) Um leitor anota que este autor, em suas colunas, afirma frequentemente que o VOLP é a autoridade incumbida de determinar a existência de vocábulos em nosso idioma. E segue em seu raciocínio para dizer que, em consulta àquele, notou que lá se registra a palavra inobservar. Terceira pessoa, com base em consulta negativa ao Dicionário Aurélio, insiste em que não existe tal verbo. Então indaga se pode empregar tal termo e, em caso positivo, se seu significado é o de "não se verificar" ou de "não se observar".

2) Pode-se dizer, em termos bem práticos, que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa é, assim, uma espécie de dicionário que lista as palavras reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua portuguesa, bem como lhes fornece a grafia oficial.

3) Também conhecido pela sigla VOLP, seu objetivo é reconhecer a existência e consolidar a grafia dos vocábulos, além de classificá-los pelo gênero (masculino ou feminino) e categoria morfológica (substantivo, adjetivo...).

4) Difere dos dicionários convencionais, por não explicar usualmente o significado dos termos que registra.

5) É elaborado pela Academia Brasileira de Letras, que tem a delegação e a responsabilidade legal de editá-lo, desde a vetusta Lei Eduardo Ramos, de n. 726, de 8 de dezembro de 1900.

6) Sempre é oportuno reiterar que, incumbido por lei específica para sua confecção, quem o elabora goza de autoridade para, nesse campo, dizer o Direito, motivo por que, ao consultá-lo, legem habemus e devemos prestar-lhe obediência, como devemos fazer com respeito aos demais diplomas legais. Qualquer discussão ou eventual divergência entre o VOLP e os dicionaristas há de ficar para o plano da ciência, não consistindo, todavia, em válvula que permita o descumprimento de suas determinações

7) Em comunhão com tal pensamento, para José de Nicola e Ernani Terra, esse vocabulário "é a palavra oficial sobre a ortografia das palavras da língua portuguesa no Brasil"1, não se podendo olvidar que também é a palavra oficial no que concerne à própria existência dos vocábulos em nosso idioma.

8) Com respeito à dúvida trazida pelo leitor, uma consulta ao site da ABL mostra que o VOLP registra, sim, inobservar. E isso faz concluir que tal vocábulo existe oficialmente em nosso idioma. Seu conteúdo semântico é o oposto de observar, de modo que coincide com o que o leitor apontou: seu significado é o de "não se verificar" ou de "não se observar".

9) É certo que o Dicionário Aurélio, na edição consultada (quinta, de 2010), não registra o mencionado vocábulo, o que também se dá com o Dicionário Houaiss (1ª edição, 2001). Mas aqui, mais uma vez, é preciso realçar que os estudiosos da língua e os dicionaristas, sem sombra de dúvida, prestam relevantes serviços ao vernáculo. Não são eles, porém, as autoridades para dizerem, com valor oficial, acerca da existência ou não de algum vocábulo em nosso idioma, bem como acerca de sua grafia e de suas peculiaridades, ou mesmo de sua correção no idioma. Essa atribuição cabe, com exclusividade, à Academia Brasileira de Letras, de modo que, na divergência entre os gramáticos, filólogos e dicionaristas de um lado, e o VOLP de outro, há de prevalecer, nesse campo, o que registra este último.

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1 NICOLA, José de; TERRA, Ernani. 1.001 Dúvidas de Português. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 231.

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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.