Gramatigalhas

Conjunções concessivas – Em que tempo usar o verbo?

Conjunções concessivas – Em que tempo usar o verbo? O Professor esclarece.

21/10/2020

O leitor Sérgio Gomes envia à coluna Gramatigalhas a seguinte mensagem:

"Quais conjunções concessivas deverei utilizar com verbos na forma finita de subjuntivo?"

1) Um leitor indaga, em síntese, quais conjunções concessivas deve ele utilizar com verbos na forma finita do subjuntivo.

2) Observa-se, de início, que a questão, tal como posta, é um tanto hermética e de difícil compreensão, de modo que, em última análise, não se consegue ver com clareza o que intenta o leitor, efetivamente, perguntar; todavia, para que ninguém fique para trás e sem resposta, tenta-se dar uma resposta.

3) Vejam-se os seguintes exemplos: a) "Ainda que pareça fácil, trata-se de matéria de difícil compreensão"; b) "Ainda que parece fácil, trata-se de matéria de difícil compreensão".

4) O verbo parecer, na oração subordinada do primeiro exemplo, está no presente do subjuntivo; o da oração subordinada do segundo exemplo, no presente do indicativo.

5) Em frases como essas, de idêntico significado, construídas pelas conjunções ou locuções conjuntivas concessivas ainda que, bem que, conquanto, posto que e outras equivalentes, o emprego do verbo no subjuntivo, tal como se acha no primeiro exemplo, dispensa comentários, por ser essa a sintaxe mais usual na escrita moderna.

6) No que respeita ao emprego do verbo no indicativo, porém, anote-se que Vieira, Camões, Bernardes e os outros clássicos "assim construíam todos, construção, como se vê, lidimamente vernácula e de bom cunho, que, no entanto, vai resvalando no esquecimento", sendo raros os escritores modernos que a empregam (FREIRE, 1937a, p. 24), podendo-se acrescentar que a referida sintaxe vem sendo substituída gradativamente, nos tempos atuais, pelo emprego do subjuntivo.

7) Não se olvide, porém, que, se, para alguns, a segunda forma pode parecer não soar bem modernamente, tal, entretanto, não significa que não esteja ela em estrita consonância com a correção do vernáculo.

8) De Laudelino Freire vem a lição de que, "nas frases em que se emprega qualquer das expressões ainda que, bem que, conquanto, posto que e outras equivalentes, o verbo da oração subordinada tanto pode estar no subjuntivo como no indicativo".

9) E lembrando que o emprego do verbo no subjuntivo é a forma mais usual (FREIRE, 1937b, p. 92-3) – "E ainda que pareça matéria de riso... é matéria de toda a tentação" (Vieira) – passa tal autor a transcrever exemplos de autores insuspeitos, que empregaram o verbo no indicativo: a) "... ainda que Deus era imenso e invisível" (Vieira); b) "... mas conquanto não pode haver desgosto" (Camões); c) "Não hesita Diez em chamar solecismo, ainda que está subscrita por Camões" (Rui Barbosa); d) "Posto que era horrendo esse inimigo..." (Castilho).

10) Em lição proferida para a expressão desde que, anota Luciano Correia da Silva (1991, p. 154) que, "como locução conjuntiva, leva ordinariamente o verbo para o subjuntivo, se a função for condicional: 'Poderão requerer o divórcio desde que satisfaçam todas as exigências legais'. Tal fato é regra também com várias outras conjunções: embora sejam, ainda que façam, ainda que fizessem etc. Entretanto é norma geral, que os autores nem sempre observaram: 'O trigo do semeador, ainda que caiu quatro vezes, só de três nasceu' (Vieira, Sermões...)".

11) Em realidade, é lição primeira de conjugação verbal a assertiva de que o modo indicativo aponta para uma certeza, enquanto o subjuntivo refere dúvida, indecisão, incerteza.

12) Assis Cintra, contudo, mesmo referindo doutrina de gramáticos no sentido dessa posição inflexível (dentre os quais Júlio Ribeiro e Ernesto Carneiro Ribeiro), cita ensinamento esclarecedor de Rui Barbosa, em sua Réplica: "Enunciada em absoluto, não é verdadeira a sentença de que o subjuntivo indique sempre dúvida, indecisão, incerteza. Certo que as locuções enunciativas, ação possível, desejável, receável ou dubitável, conformam especialmente com aquele modo verbal. Mas não seria igualmente exato que só por esse modo se exprimam essas ideias, assim como o não é que só a exprimir tais ideias, se emite a função desse modo. Muita vez se traduz a dúvida em tempos do verbo no indicativo".

13) E refere o mencionado autor (CINTRA, 1922, p. 31- 45) diversos exemplos indicadores de dúvida no indicativo, concluindo que "todas essas orações, perfeitamente conversíveis ao subjuntivo e mais comuns sob essa forma, se dão igualmente bem com as do indicativo": a) "Ainda que me parece que este o não fez" (Camões); b) "É possível que em nenhuma parte das nossas hierarquias achou Deus outra natureza?" (Padre Antônio Vieira); c) "Suposto que aquele amor também é honesto" (Padre Manuel Bernardes); d) "Pode ser que isto foi a causa" (Frei Luís de Sousa).

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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.