Gramatigalhas

Fraude à execução ou Fraude de execução?

O leitor João Paulo Cruz enviou ao autor de Gramatigalhas o seguinte pedido: "Pode me ajudar? Fraude à Execução ou Fraude de Execução? Tenho visto as duas formas, e não consegui encontrar, na doutrina, diferenciação. Gramaticalmente, há? É o mesmo que ocorre com 'Denunciação à lide' e 'Denunciação da lide' (Migalhas 960 - 7/7/04 - clique aqui)? Grato."

29/11/2006

O leitor João Paulo Cruz enviou ao autor de Gramatigalhas o seguinte pedido:

"Pode me ajudar? Fraude à Execução ou Fraude de Execução? Tenho visto as duas formas, e não consegui encontrar, na doutrina, diferenciação. Gramaticalmente, há? É o mesmo que ocorre com 'Denunciação à lide' e 'Denunciação da lide' (Migalhas 960 - 7/7/04 - clique aqui)? Grato."

1) Quando se formula a indagação acima, quer-se saber, em última análise, que tipo de preposição o substantivo fraude exige depois de si: a ou de? A essa exigência de construção para depois de um nome denomina-se regência nominal.

2) Quando o nome que vem depois é o autor da fraude, não há dificuldade: fraude dos jogadores (ou seja, a fraude que os jogadores praticam). Ex.: "A fraude dos jogadores foi percebida pelos fiscais das mesas".

3) Em outro caso, também não é difícil verificar o uso da preposição em. Ex.: "Os postos de gasolina foram fechados por fraude na qualidade do combustível".1

4) Quando, porém, o nome que vem após é alvo, destinatário ou paciente da fraude, a questão se torna um pouco mais difícil: contra, a ou de?

5) Francisco Fernandes, sem negar o valor de outras construções, apenas lembra o acerto do emprego da preposição contra, exemplificando com a expressão "fraude contra credores".2

6) Celso Pedro Luft defende o acerto do emprego de duas preposições: contra e de. Relembra a expressão fraude contra credores e anota ser de fácil ambigüidade o uso de de em tais circunstâncias, pois não se sabe se os credores são autores ou pacientes da fraude.3

7) O Código Civil de 1916 consagrava a expressão fraude contra credores, como se verifica no título que precede o art. 106, em conduta seguida pelo Código Civil de 2002, no título que vem antes do art. 158.

8) O Código de Processo Civil, no art. 593, fala em fraude de execução, em uso que se repete no art. 672, § 3º.

9) O Código Penal, ao tratar do estelionato e de outras fraudes, fala em fraude na entrega de coisa, fraude para recebimento de indenização e fraude no pagamento por meio de cheque (art. 171), além de fraude no comércio (art. 175), fraudes na fundação ou administração de sociedades por ações (art. 177) e fraude à execução (art. 179).

10) Nesse campo, não devemos ser restritivos, mas ampliativos. Isso quer dizer que, se os gramáticos ou a lei permitem determinada sintaxe, não há razão para rechaçá-la ou restringir seu emprego, de modo que com qualquer dessas preposições há de se reputar correta a construção.

11) Vale dizer, assim, que estão corretas todas as seguintes construções: fraude de execução, fraude contra credores, fraude na entrega de coisa, fraude para recebimento de indenização. E, de modo específico para a consulta, estão ambas corretas: fraude à execução e fraude de execução.

12) Apenas se lembra a ponderação de Celso Pedro Luft de que o emprego da preposição de em tais circunstâncias pode causar ambigüidade, como quando se diz fraude de credores: nesse caso, pode-se ficar na dúvida se os credores praticam a fraude ou são vítimas dela.4

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1Cf. LUFT, Celso Pedro. Dicionário Prático de Regência Nominal. 4. ed. São Paulo: Ática, 1999, p. 243.

2Cf. FERNANDES, Francisco. Dicionário de Regimes de Substantivos e Adjetivos. 2 ed. 6ª impressão. Porto Alegre: Globo, 1969, p. 198.

3Cf. LUFT, Celso Pedro. Dicionário Prático de Regência Nominal. 4. ed. São Paulo: Ática, 1999, p. 243.

4Cf. LUFT, Celso Pedro. Dicionário Prático de Regência Nominal. 4. ed. São Paulo: Ática, 1999, p. 243.

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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.