O leitor Claudio Lázaro Aparecido Júnior envia a seguinte mensagem para a seção Gramatigalhas:
"Prezado Prof. José Maria da Costa: no Concurso Interno de Seleção e Convocação por Antiguidade à Graduação de Cabo PM (CCE/10), mais conhecido como CPC 2010, promovido pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, no exame acerca do uso correto da Língua Portuguesa, a questão de nº 14 apresentava a seguinte formulação: 'Assinale a alternativa em que o pronome pessoal oblíquo poderia ser colocado em duas outras posições: a) Eles queriam-me enganar; b) Não te prejudicarei nunca; c) Deixei de cumprimentá-lo; e, d) Creio que ele não te dará explicações.' O gabarito oficial apresentou como sendo a resposta correta aquela contida na alternativa de letra "a", mas não estou convencido nesse sentido, pois entendo que o enunciado da referida questão está equivocado (ou é falho), uma vez que o pronome oblíquo usado na oração da alternativa "a" poderia ser utilizado em apenas uma outra posição, o que também pode acontecer na frase da alternativa "c". Caso contrário, se os pronomes oblíquos em testilha fossem empregados em mais de duas posições, haveria a alteração do sentido dos períodos em estudo. O senhor acredita nisso também ou não? Muito obrigado."
1) Um leitor, trazendo uma questão de concurso, indaga em qual das alternativas o pronome pessoal oblíquo poderia ser colocado em duas outras posições: a) Eles queriam-me enganar; b) Não te prejudicarei nunca; c) Deixei de cumprimentá-lo; e, d) Creio que ele não te dará explicações.
2) Quando se tem a frase "O réu quer dizer-nos alguma coisa", tem-se uma locução verbal composta por um verbo auxiliar (quer) e um principal no infinitivo (dizer); e a questão é saber qual a posição em que há de estar corretamente colocado o pronome pessoal oblíquo átono (nos): antes do auxiliar ("O réu nos quer dizer alguma coisa"), entre o auxiliar e o principal ("O réu quer-nos dizer alguma coisa"), ou após o principal ("O réu quer dizer-nos alguma coisa").
3) Em realidade, muito embora seja mais comum a colocação antes do auxiliar ou depois do principal, Eduardo Carlos Pereira (1924, p. 252-3), para os casos normais, lembra a possibilidade genérica das três colocações do pronome átono: antes do auxiliar, após o auxiliar e após o principal. Exs.: a) "A testemunha nos pode esclarecer a verdade"; b) "A testemunha pode-nos esclarecer a verdade"; c) "A testemunha pode esclarecer-nos a verdade".
4) Se o pronome começa a frase, vedada está a possibilidade de vir ele antes do auxiliar, sob pena de contrariar princípio básico de colocação de pronomes oblíquos átonos, segundo o qual eles não começam frase. Exs.: a) "O magistrado lhe queria falar" (correto); b) "Lhe queria falar o magistrado" (errado).
5) Se há palavra atrativa antes da locução, não se coloca o pronome entre o auxiliar e o principal. Exs.: a) "O magistrado não lhe quer falar" (correto); b) "O magistrado não quer-lhe falar" (errado); c) "O magistrado não quer falar-lhe" (correto).
6) Se o auxiliar está no futuro do presente ou no futuro do pretérito, valem as regras já referidas, apenas com a ressalva de que, com essas formas verbais, nunca se dá a ênclise ao auxiliar, mas mesóclise ao auxiliar: a) "O magistrado dever-lhe-ia falar toda a verdade" (correto); b) "O magistrado deveria-lhe falar toda a verdade" (errado).
7) Em um outro aspecto, anota Édison de Oliveira que "o pronome oblíquo não pode ficar solto entre dois verbos", motivo por que está errada a construção "O fato vai se repetir".
8) Segundo tal autor, para corrigir expressões dessa natureza, "reúne-se o pronome oblíquo à forma verbal anterior": "O fato vai-se repetir" (OLIVEIRA, E., s/d, p. 119).
9) Com essas reflexões, pode-se afirmar, em resposta ao leitor, que a alternativa correta é a primeira.
10) E se podem fazer as seguintes variações, com a indicação de seu acerto ou erronia entre parênteses: a) "Eles me queriam enganar" (correto); b) "Eles queriam-me enganar" (correto); c) "Eles queriam enganar-me" (correto); d) "Me queriam enganar" (errado); e) "Eles queriam me enganar" (errado); f) "Eles não me queriam enganar" (correto); g) "Eles não queriam-me enganar" (errado); h) "Eles não queriam me enganar" (errado); i) "Eles não queriam enganar-me" (correto); j) "Eles me quererão enganar" (correto); k) "Eles querer-me-ão enganar" (correto); l) "Eles quererão-me enganar" (errado); m) "Eles quererão me enganar" (errado); n) "Eles quererão enganar-me" (correto); o) "Eles não me quererão enganar" (correto); p) "Eles não querer-me-ão enganar" (errado); q) "Eles não quererão-me enganar" (errado); r) "Eles não quererão me enganar" (errado); s) "Eles não quererão enganar-me" (correto).