A leitora Mariana Bergamini envia a seguinte dúvida ao Gramatigalhas:
"Tenho uma dúvida e não consigo encontrar a resposta adequada. Quando vou fazer um parecer jurídico, qual a pessoa que devo usar? Posso escrever em primeira pessoa? Atenciosamente."
1) Uma leitora, não conseguindo encontrar resposta adequada, indaga se pode escrever um parecer jurídico em primeira pessoa.
2) Ora, em suas diversas modalidades (petições, pareceres, arrazoados ou trabalhos acadêmicos), a redação jurídica deve obedecer a determinados critérios, que é oportuno observar.
3) Num primeiro aspecto, lembra-se que o Direito é uma ciência, de modo que o profissional da área produz textos científicos, cuja linguagem deve ser técnica e precisa.
4) Por isso, já em resposta direta à indagação da leitora, anota-se que a linguagem do Direito, exatamente por ser científica, deve ser impessoal.
5) Isso quer significar que, com a exceção representada pela expressão final de um parecer ("É o que me parece, salvo melhor juízo [ou, de modo abreviado, s. m. j.]" – o que também pode ser dito de outra forma objetiva e impessoal ["É o que parece, salvo melhor juízo])", um parecerista, assim como todo e qualquer autor de petição, arrazoado ou trabalho acadêmico, deve empregar, na redação que produz, a terceira pessoa (e não a primeira, quer do singular, quer do plural).
6) Fica, assim, muito mais adequado dizer, em uma fundamentação, "Quando se busca uma interpretação convincente..." do que "Quando eu busco (ou buscamos) uma interpretação convincente...". Deve-se proceder de modo idêntico nas conclusões: "Conclui-se que..." fica muito melhor do que "Concluo que..." ou mesmo "Concluímos que...", ainda que essa última expressão tenha por pretexto um plural de modéstia.
7) Aproveitando a oportunidade, outras observações podem ser acrescidas para o aperfeiçoamento da redação jurídica: a) é inconveniente, de um modo geral, substituir termos técnicos e locuções por sinônimos, a pretexto de evitar repetições e de buscar uma pretensa linguagem literária (assim, não se deve substituir, ao longo de um texto, por exemplo, petição inicial por peça inaugural, petição de introito, preambular ou vestibular); b) em nome da sobriedade e da objetividade próprias da linguagem científica, deve-se evitar uma adjetivação desnecessária (como clara e indefectível Justiça, digna Autoridade Policial, douta Procuradoria de Justiça ou ilustrado Órgão do Ministério Público, bastando dizer Justiça, Autoridade Policial, Procuradoria de Justiça ou Órgão do Ministério Público); c) devendo a linguagem jurídica ser sóbria e parcimoniosa, clara, correta e persuasiva, são perfeitamente dispensáveis pedidos de licença para alguma afirmação mais contundente ou divergente (como, por exemplo, data venia, ou venia concessa, ou similares).