Gramatigalhas

Quem serve para coisa ou só para pessoa?

Quem serve para coisa ou só para pessoa? O Professor esclarece a questão.

14/12/2016

O leitor Cesar Cruz envia a seguinte dúvida ao Gramatigalhas:

 "Usar o 'quem' numa situação em que o sujeito não é humano não configura uma inadequação? Veja: 'Foram os cartões corporativos quem fizeram mais sucesso no carnaval'. Não seria mais adequado 'que fizeram'?"

1) Um leitor pergunta se configura inadequação usar quem numa situação em que o termo referido não é pessoa, e sim coisa. E traz um exemplo colhido na mídia, para demonstrar sua estranheza: "Foram os cartões corporativos quem fizeram mais sucesso no carnaval".

2) Ora, no português moderno, em estruturas como a trazida pelo leitor, o que serve para coisas e pessoas, mas quem serve apenas para pessoas, e não para coisas. Exs.: a) "Foi o reitor que o ajudou naquela dificuldade" (correto); b) "Foi o reitor quem o ajudou naquela dificuldade" (correto); c) "Foi o dicionário que o ajudou naquela dificuldade" (correto); d) "Foi o dicionário quem o ajudou naquela dificuldade" (errado).

3) Vejam-se, porém, dois exemplos de autores clássicos em que não se obedeceu a essa regra: a) "A ciência do direito romano foi quem, para desconto, trouxe o absolutismo às nações" (Alexandre Herculano); b) "... Toledo, cidade nobre e antiga, a quem cercando o Tejo em torno vai, suave e ledo" (Luís de Camões).

4) Quanto a esses dois exemplos de séculos atrás, Cândido Jucá Filho, mesmo assim, traz justificativa mais do que apropriada: "em ambos os casos há certa personificação do ser a que se alude" (1963, p. 525).

5) Para o português atual, todavia, em termos de norma culta, deve-se observar os princípios inicialmente postos, de modo que se deve assim corrigir o exemplo trazido pelo leitor: "Foram os cartões corporativos que fizeram mais sucesso no carnaval".

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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.