Gramatigalhas

Propositadamente ou Propositalmente?

Propositadamente ou Propositalmente? Professor esclarece a dúvida.

17/12/2014

O leitor Celso Oliveira envia a seguinte mensagem ao Gramatigalhas:

"O Professor José Maria da Costa poderia explicar qual é a diferença das palavras 'propositadamente' e 'propositalmente'. Qual delas deve ser usada quando queremos dizer 'de propósito'?"

1) Fundado em lição de João Ribeiro, Napoleão Mendes de Almeida adverte que, para significar a expressão de propósito ou de caso pensado, deve-se usar o advérbio propositadamente, não sendo considerado de bom uso, nesse caso, nem o advérbio propositalmente, nem o adjetivo proposital. Ex.: a) "O crime foi doloso, porque o réu agiu propositadamente" (correto); b) "O crime foi doloso, porque o réu agiu propositalmente" (errado).

2) Rui Barbosa, em suas críticas específicas, já observava a ausência de analogia vernácula autorizadora de uso do advérbio propositalmente, ao qual chamou de "desnecessária corruptela", que ganharia foro de sanção jurídica com sua inserção no Código Civil de 1916.

3) Em outro lugar de mesma obra, tal mestre lecionava textualmente que "as regras da analogia não autorizam a formação de semelhante neologismo", estendendo longa lista de sinônimos para substituí-lo.

4) Por fim, ao criticar o art. 96 do projeto original do código, sugeriu, para o adjetivo proposital, três vocábulos substitutos: intencional, voluntário, deliberado.

5) José de Sá Nunes, num primeiro aspecto, afiança não ser propositalmente um vocábulo do léxico português, para o que traz abono de Rui Barbosa e de Ernesto Carneiro Ribeiro.

6) Ao depois, transcreve lição de Said Ali, para quem propositalmente e até mesmo propositadamente são vocábulos desnecessários.

7) Acrescenta, a seguir, que, em seu modo de ver, nem Rui Barbosa nem Ernesto Carneiro Ribeiro se lembraram de "provar a vernaculidade do adjetivo propositado e do advérbio propositadamente".

8) Por fim, acaba trazendo citações de abalizados escritores, em que se comprova o emprego do vocábulo discutido: a) "Mas A. Herculano mui propositadamente escreveu..." (Rui Barbosa); b) "Propositadamente neguei registo a vocábulos, que tinham a abonação de Rui Barbosa e que eram do meu conhecimento" (Cândido de Figueiredo); c) "Excluímos propositadamente desta secção os escritores vivos" (João Ribeiro).

9) Para Domingos Paschoal Cegalla, propositadamente é "melhor forma do que propositalmente", assim como propositado é forma "preferível a proposital".

10) Cândido Jucá Filho, por um lado, lembra lição de Mário Barreto, de importância para o caso: "Rui Barbosa, na sua brilhante Réplica, provou a ilegitimidade vernácula de proposital e de propositalmente. O que é português é propositado e propositadamente".

11) Por outro lado, após tal transcrição, continua o referido autor: "Não concordo. Rui não mostrou senão uma implicância pessoal. Diz-se intenção, intencional, intencionalmente. Por que se não pode dizer propósito, proposital, propositadamente?"

12) Por fim, conclui ele: "Mas a verdade é que os clássicos, como o povo, têm preferido a expressão de propósito. Quanto a propositado, não se livra de ser pedante".

13) Dirimindo, todavia, toda e qualquer dúvida acerca da possibilidade de emprego de proposital e, por consequência, propositalmente, é de se ver que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, que é o veículo oficial para dirimir dúvidas acerca da existência de vocábulos em nosso idioma, registra tanto propositado quanto proposital, o que implica dizer que o uso de ambos os adjetivos está plena e oficialmente autorizado entre nós, além de estarem autorizados, de igual modo, propositadamente e propositalmente, os quais nada mais são do que advérbios regularmente formados dos dois referidos adjetivos.

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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.