Gramatigalhas

Prover a mantença ou Prover à mantença?

Prover a mantença ou Prover à mantença? O professor José Maria da Costa esclarece.

22/8/2012

A leitora Cristiane Sampaio Camargo envia a seguinte mensagem ao Gramatigalhas:

"Minha dúvida é relativa ao art. 1.695 do Código Civil, que foi objeto de questão de português no 178º concurso da Magistratura de São Paulo. No referido artigo lemos: 'São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu próprio trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento'. Parece-me que há um erro no texto: a crase indevida precedendo 'mantença', já que prover é verbo transitivo direto. No entanto, o concurso considerou correta a alternativa que reproduzia a grafia constante do Codex. Não foi equivocada a resposta?"

1) Uma leitora pergunta se não há erro no texto do art. 1.695 do Código Civil (objeto de questão do 178º Concurso da Magistratura de São Paulo), quando registra que "são devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover... à própria mantença..." Para o consulente, a crase seria indevida antes de mantença, já que prover é verbo transitivo direto.

2) A questão da leitora busca saber, em suma, se o verbo prover pede um objeto direto ou um objeto direto e se, por conseguinte, o respectivo complemento deve vir ou não regido pela preposição a. E isso é uma questão de regência verbal.

3) Celso Pedro Luft leciona que o verbo prover, quando tem o sentido de acudir, de atender, é transitivo indireto. E exemplifica: a) "Prover às despesas"; b) "Prover ao pagamento de uma dívida"; c) "Prover ao seu sustento"; d) "Prover à própria subsistência".1

4) O ensino de Francisco Fernandes não é diferente e traz a corroboração de exemplos de excelentes autores: a) "Prover à segurança pública" (Morais); b) "Prover às necessidades do hospital" (Cândido de Figueiredo); c) "Nem provê às necessidades do gênero humano" (Rui Barbosa).2

5) Ante essas lições, conclui-se não haver reparo algum a ser feito à redação do art. 1.695 do Código Civil, quando registra que "são devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover... à própria mantença..."

6) A crase antes de mantença é totalmente adequada, já que prover, no sentido empregado, é verbo transitivo indireto e pede que o complemento seja regido pela preposição a, a qual, ao se fundir com o artigo a que antecede mantença, gera a crase.

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1 Cf. LUFT, Celso Pedro. Dicionário Prático de Regência Verbal. 8. ed. São Paulo: Ática, 1999, p. 424.

2 Cf. FERNANDES, Francisco. Dicionário de Verbos e Regimes. 4. ed., 16. reimpressão. Porto Alegre: Editora Globo, 1971, p. 483.

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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.