Animais não são coisas – já enuncia há várias décadas o § 90a BGB, inserido em 1990 na codificação alemã em decorrência da lei para o melhoramento da posição jurídica dos animais no Direito Civil. A norma não é letra morta, embora os animais sejam regidos pelo direito dos bens.
A sociedade alemã tem uma postura positiva de respeito e proteção dos animais, embora seus defensores reclamem um nível de proteção mais elevado.
Na Alemanha, é comum ver principalmente cães em cafés, restaurantes, transportes públicos e até em locais de trabalho.
Há, evidentemente, normas que proíbem a presença de animais em determinados locais como hospitais, cozinhas e laboratórios. A razão é evidente: considerações de ordem sanitária, higiênica e de segurança afastam a presença de animais de estimação nesses locais.
Mas não há normas gerais na legislação regulando a presença de animais em locais de trabalho ou uma regra expressa que preveja a possibilidade (ou não) do empregado levar o amigo de estimação ao trabalho.
Nada obstante, não é incomum encontrar um peludo de quatro patas em escritórios e repartições públicas.
Pessoalmente, tive a divertida experiência de conhecer um pequeno "estagiário" no Tribunal Constitucional alemão, em 2016, durante estágio de pesquisa na Corte, realizado no doutoramento.
Tratava-se de um cachorrinho maltês, "filho" de um funcionário do Tribunal, que andava tranquilamente pelos corredores próximos à sala do pai e o acompanhava com frequência à cafeteria, onde era por todos mimado.
Mas nem sempre reina paz no ambiente de trabalho quando algum colega traz seu peludo de casa.
Em um caso oriundo do Tribunal de Munique, os sócios de um escritório começaram a se desentenderem por causa do cão que a sócia levava todos os dias para o trabalho, apesar dos protestos do sócio.
Ele, então, moveu ação cautelar com pedido liminar alegando não ter concordado com a presença do animal no escritório. Ele já teria tido experiências ruins anteriores e não gostava de cachorros, principalmente do cheiro.
Segundo o autor, o cachorro gostava de usar sua cadeira, latia com frequência e acabava atrapalhando o clima do escritório.
O Amtsgericht (AG) München negou o pedido por razões processuais: não havia urgência na medida, pois não restou demonstrado nos autos que o animal era agressivo ou que os colegas de trabalho precisavam temer ataques do cachorro.
Mas o Tribunal do Trabalho de Düsseldorf (Landesarbeitsgericht – LAG) encarou a questão de fundo em caso semelhante, decidindo que cabe ao empregador autorizar (ou não) a presença de animais no local de trabalho.
Fundamento para tanto é seu poder de direção e instrução, previsto no § 106 da Gewerbeordung, que regulamenta as atividades profissionais.
Segundo o dispositivo, cabe ao empregador regular, em detalhes, a atividade laboral, determinando o local, horário e o conteúdo da atividade, bem como o funcionamento da empresa em geral.
Essa competência inclui, obviamente, o poder de fixar regras sobre a presença de animais de estimação no local de trabalho.
Cabe a ele decidir se – e sob quais pressupostos – um funcionário pode levar um cachorro, um gato ou peixes no aquário para o trabalho.
Ele pode condicionar, por exemplo, à raça, tamanho, ao bom comportamento (boas maneiras) do animal, à realização das necessidades fisiológicas em área externa ou ao uso de focinheira ou coleiras.
Da mesma forma, pode ao empregador revogar a autorização consentida sempre que o animal perturbe o local de trabalho. Isso acontece quando ele desperta medo ou receio nos colegas e/ou clientes, quando o animal é barulhento ou exala odor desagradável ou ainda quando os cuidados com o animal roubem tempo de trabalho do dono.
E esse poder lhe permite vedar casos individuais, ainda quando outros colegas tenham autorização para tanto.
Mas o poder de direção não pode configurar um tratamento desigual inadmissível, sendo necessário um motivo justo para o tratamento diferenciado, disse o LAG Düsseldorf.
Em regra, é necessário que o animal em questão – diferentemente dos demais – perturbe o funcionamento do local de trabalho para que o tratamento discriminatório se justifique.
Trata-se do processo LAG Düsseldorf, Az. 9 As 1207/13, julgado em 24/3/2014.
Segundo o Tribunal, é irrelevante, contudo, se o cão é de fato perigoso. É suficiente que o empregador subjetivamente tenha receios em relação ao animal.
No caso concreto tratava-se de uma agência de publicidade, onde normalmente há intensa comunicação e muito movimento no local. Por isso, os demais funcionários tinham receios em relação ao cachorro de um dos funcionários.
Nesse caso, surge para o empregador deveres especiais de cuidado (besondere Fürsorgepflichte) para com os empregados, sendo justificável a proibição da presença do cão na agência.
Por isso, a ação do empregado, a fim de continuar levando o cachorro para o escritório, foi julgada improcedente.
Mas os estudos mostram que a presença de um animal de estimação tem efeito positivo não apenas sobre o dono do animal, como ainda sobre o clima de trabalho na empresa, elevando o contentamento e a motivação dos funcionários1.
Por isso, várias empresas já permitem que seus funcionários levem animais ao trabalho. No Brasil, já há empresas e espaços pet friedly. Mas, evidentemente, a última palavra cabe ao empregador, responsável por preservar a segurança e a harmonia no trabalho. Thor Larenz, mascote do German Report, seria vetado devido às travessuras.
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