Jefferson Aparecido Dias
No âmbito Federal, a Administração Pública Direta inclui, além da presidência da República e os órgãos a ela vinculados, também os Ministérios, cujos nomeados ocupam cargo de confiança do presidente da República, atuando como seus auxiliares e tendo como atribuições: "I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República; II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos; III - apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Ministério; IV - praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe forem outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República" (art. 87, parágrafo único, da Constituição).
A partir dessa afirmação seria possível concluir que a nomeação de um ministro de Estado constitui ato discricionário do chefe do Executivo que, nessa condição, poderia optar pela livre nomeação de qualquer brasileiro, maior de vinte e um anos, no exercício dos direitos políticos (art. 87, da Constituição), de acordo com a sua conveniência e oportunidade. O mesmo ocorreria quanto à sua exoneração.
Apesar dessa aparente regra, o Poder Judiciário tem proferido decisões limitando a discricionariedade de tais nomeações.
Isso ocorreu no caso da nomeação do ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, para o cargo de ministro da Casa Civil, pela então presidente Dilma Rousseff, por meio de ato suspenso no Supremo Tribunal Federal, por decisão do ministro Gilmar Mendes. A decisão liminar acabou não sendo apreciada a tempo e o caso foi arquivado pelo Plenário do STF1.
A decisão liminar que impediu a posse do ex-presidente entendeu que a sua nomeação ofendia o princípio da moralidade administrativa, uma vez que estaria sendo realizada apenas para conceder-lhe foro privilegiado e impedir que ele fosse processado em Primeira Instância.
Decisão semelhante ocorreu no caso da deputada Federal Cristiane Brasil, cuja nomeação para o cargo de ministra do Trabalho, pelo presidente Michel Temer, foi suspensa pela ministra Cármen Lúcia, também do STF2.
Mais uma vez o fundamento foi a violação ao princípio da moralidade administrativa, diante das condenações que a deputada Federal possuía na Justiça Trabalhista. Entendeu-se que era uma contradição nomear para o Ministério do Trabalho alguém condenado por descumprir leis trabalhistas.
No mesmo sentido o STF decidiu em relação à Medida Provisória que deu status de ministro de Estado para a Secretaria-Geral da presidência da República, na época ocupada por Moreira Franco, a qual foi considerada inconstitucional3. Além de aspectos formais, mais uma vez a violação do princípio da moralidade administrativa foi suscitada.
Diante de tais decisões, a nomeação de um ministro de Estado, apesar de continuar a ser considerada um ato discricionário, passou a se submeter a novos limites, além da conveniência e oportunidade do presidente da República, pois passou-se a exigir, também, o respeito aos princípios expressos (art. 37, caput, da Constituição) e implícitos que devem nortear a atuação da Administração Pública.
Além dessas limitações impostas pelo Poder Judiciário, também tramita no Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição 284/20134, a qual pretende ampliar a aplicação da Lei da Ficha Limpa, impedindo a nomeação para emprego ou para cargo efetivo ou em comissão de pessoa que esteja em situação de inelegibilidade. Assim, não poderiam ser nomeados para ministros do Estado pessoas que, por terem sofrido condenações, estejam inelegíveis, o que parece bastante razoável, já que tais pessoas não podem se candidatar para cargos eletivos.
Todas essas medidas pretendem dar maior confiabilidade nas nomeações para ministros de Estado, as quais, como se viu, têm sido muito questionadas e, por consequência, suspensas pelo Poder Judiciário.
Apesar de essa cruzada em nome da moralidade administrativa, o STF decidiu que a súmula vinculante 13, que impede o nepotismo, não se aplica para as nomeações para cargos políticos, os quais inclui, além dos ministros de Estado, também os de Secretários Estaduais e Municipais5.
É certo que tal restrição à aplicação da súmula vinculante encontra eco em várias decisões judiciais e textos doutrinários, mas parece-me que a razão está com aqueles que defendem que o nepotismo deve ser impedido em todos os níveis, inclusive nos cargos políticos.
Na verdade, o que se espera dos eleitos para cargos políticos, inclusive do Poder Executivo, e de todos os seus auxiliares é o respeito à Constituição e a correta aplicação do ordenamento jurídico o que começa, certamente, desde a sua posse, que, portanto, não pode estar eivada ab initio de qualquer vício.
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1 OLIVEIRA, Mariana. STF arquiva pedido para reconhecer nomeação de Lula como ministro de Dilma: Julgamento aconteceu em plenário virtual. Em 2016, Lula foi nomeado ministro da Casa Civil, mas Gilmar Mendes suspendeu ato de Dilma; petista recorreu. Para STF, pedido ficou 'prejudicado'. Data: 29/3/2019. Acesso em: 25/06/2019.
2 G1 (Brasil). Cármen Lúcia suspende a posse de Cristiane Brasil no Ministério do Trabalho: Decisão da presidente do STF foi divulgada na madrugada desta segunda (22). Posse da deputada, filha de Roberto Jefferson, estava marcada para as 9h no Palácio do Planalto, mas foi cancelada. Data: 22/1/2018. Acesso em: 25/06/2019.
3 PUPO, Amanda. STF: MP de Temer que deu status de ministro a Moreira Franco é inconstitucional. Data: 27/3/2019. Acesso em 25/6/2019.
4 BRASIL. Câmara dos Deputados. PEC 284/2013. Acesso em: 25/6/2019.
5 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Rcl 22339 AgR/SP. AG.REG. NA RECLAMAÇÃO. Relator(a): Min. EDSON FACHIN. Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES. Julgamento: 04/09/2018. Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação: DJe-055. Divulg. 20/3/2019. Public. 21/3/2019. Acesso em: 25/6/2019.