Em sua clássica obra, Tim Brown1 desenvolve sua teoria sobre o Design Thinking: uma metodologia que se utiliza do design para desenvolver soluções inovadoras para todas as áreas do pensamento. Segundo Tim Brown, design possui um conceito muito mais amplo que estética: design é, sobretudo, desenvolver produtos inovadores atendendo às necessidades humanas com os recursos técnicos disponíveis, considerando as restrições práticas dos negócios, integrando o desejável do ponto de vista humano ao tecnológico e economicamente viável.2
Design Thinking, portanto, seria uma metodologia para se encontrar soluções inovadoras a uma variedade de problemas, explorando as capacidades intuitivas das pessoas, reconhecendo padrões e desenvolvendo ideias que tenham um significado emocional além do funcional.3
Focando-se em alguns dos seus conceitos fundamentais, tais como simplicidade, foco na pessoa, experiência do usuário e inovação, qualquer profissional pode encontrar melhores soluções aos problemas de seus clientes.4
A metodologia do Design Thinking passa por 5 etapas:5 a) empatia: entendendo melhor as necessidades do cliente a partir do processo de se olhar a situação pela perspectiva dele; b) definição dos problemas: após se colocar no lugar do cliente, é possível definir de forma clara os problemas a serem solucionados; c) criação de ideias: por intermédio de uma equipe multidisciplinar será possível imaginar possíveis soluções inovadoras para o caso; d) prototipagem: concretiza-se as melhores ideias imaginadas na fase anterior; e) testagem: os protótipos são submetidos ao cliente para que sejam identificadas possíveis melhorias a serem incorporadas.
Como o Design Thinking trouxe a possibilidade de se utilizar a metodologia do design a qualquer área, juristas desenvolveram o chamado Legal Design.
A Universidade de Stanford, nos Estados Unidos da América, foi quem primeiro associou o Design Thinking ao Direito, por intermédio de seu Legal Design Lab. O Legal Design Lab (Laboratório de Legal Design) foi fundado em 2013, reunindo designers, advogados e tecnólogos com o objetivo de promover inovação jurídica e o acesso à justiça.6
A missão do Legal Design Lab é, por meio do design exploratório e da pesquisa empírica centrada no ser humano, desenvolver soluções inovadoras para serviços jurídicos.7
Diversas soluções já foram desenvolvidas pelo laboratório de Stanford, como a Navocado8, uma plataforma virtual para criar e publicar melhores guias para processos judiciais, com triagem passo a passo visual e interativa e guias de processo.
Legal Design é, portanto, o Design Thinking aplicado ao Direito, que considera as pessoas usuárias da lei (advogados, juízes, cidadãos, consumidores, gestores) como centro para o desenvolvimento de soluções jurídicas.9
Um método utilizado no Legal Design é o Visual Law (Direito Visual), que tem como objetivo a simplificação do jargão jurídico, facilitando a comunicação entre advogado e cliente e, também, entre advogado e julgador.10
Segundo Dierle Nunes e Larissa Holanda Andrade Rodrigues11, a técnica do Visual Law:
[...] se altera diante do usuário do documento jurídico. Petições: possuem como destinatários juízes; contratos: partes que geralmente são leigas no assunto; pareceres: indivíduos interessados em obter uma opinião jurídica ou informação sobre o tema sem que para isso tenha que dominar termos técnicos, dentre inúmeras outras possibilidades. A técnica do design determina que para a utilização dos meios audiovisuais, antes de se pleitear a estética, é preciso atingir a efetividade da informação conforme o destinatário.
A técnica do Visual Law é de suma importância na advocacia, pois: a) simplifica a linguagem jurídica para os clientes/jurisdicionados e; b) garante a efetivação do contraditório, já que a facilitação da linguagem por meio de recursos de áudio e vídeo permite que os advogados exerçam maior influência na decisão judicial.12
Em 23 de abril de 2021, Bernardo Azevedo e Ingrid Barbosa13 publicaram interessante pesquisa empírica em que se verificou qual a visão da magistratura federal acerca da utilização de elementos visuais nas petições dos advogados.
Na pesquisa, foram entrevistados 147 magistrados e magistradas federais, que responderam ao questionário enviado pelos pesquisadores no período compreendido entre maio e novembro de 2020.
Segundo a pesquisa, para 77,12% dos participantes, os elementos visuais facilitam a análise da petição, desde que utilizados com moderação.
Embora estudiosos do Visual Law apontem a utilização dos QR Codes como forma de facilitação da comunicação com os magistrados14, 39,2% responderam que estes estão entre os recursos que os juízes federais menos apreciam em petições. Além deles, 34,6% dos participantes responderam não apreciar vídeos.
Quando perguntados acerca da preferência de petição para a análise, 49% dos magistrados selecionaram o modelo tradicional de petição como sendo o mais agradável para leitura, na qual só havia texto.
Segundo Cristiane Iwakura, o Visual Law é compreendido, muitas vezes, de forma reduzida e equivocada atribuindo-se tal fato a três principais fatores: 1) pouco aprofundamento sobre a técnica, seus conceitos e fundamentos; 2) conhecimento restrito sobre modelos de manifestações jurídicas com um inadequado uso da técnica do Visual Law: peças "carnavalescas", mal estruturadas, desarmônicas, e/ou com o uso excessivo de recursos visuais; 3) crenças limitantes que geram uma forte barreira cultural em relação à introdução das novas tecnologias.
Considerações finais
A técnica do Visual Law, embora seja considerada um elemento facilitador da comunicação entre advogados e magistrados, ainda não está sendo bem aceita pelos magistrados brasileiros.
Tal fato se deve ao parco conhecimento dos advogados acerca da aplicação da técnica, aliado à resistência por parte dos magistrados em relação aos elementos visuais, bem como ao tempo adicional gasto na interpretação destes.
A zona de conforto acerca da utilização de modelos tradicionais de petições prejudica a exploração da potencialidade dos elementos visuais no âmbito do Poder Judiciário brasileiro e representa um obstáculo a ser enfrentado pelos aplicadores do direito.
O caminho para o alcance da plenitude da utilização de técnicas efetivas de Visual Law está na transformação da mentalidade dos operadores do direito por meio da capacitação dos sujeitos do processo para tanto.
*Lucélia de Sena Alves é mestre em Direitos Fundamentais, da linha de Direito Processual Coletivo, pela Universidade de Itaúna (2014). Professora da Escola Superior da Advocacia de Minas Gerais. Professora do curso de Pós-graduação da PUC Minas. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro da Comissão de Processo Civil da OABMG. Advogada no escritório Sena & Alves Advocacia.
__________
1 BROWN. Tim. Design Thinking [recurso eletrônico]: uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias. Tradução de Cristina Yamagami. Rio de Janeiro: Alta Books, 2018.
2 BROWN. Tim. Design Thinking [recurso eletrônico]: uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias. Tradução de Cristina Yamagami. Rio de Janeiro: Alta Books, 2018, p. 19-20.
3 BROWN. Tim. Design Thinking [recurso eletrônico]: uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias. Tradução de Cristina Yamagami. Rio de Janeiro: Alta Books, 2018, p. 20.
4 PEREIRA, Filipe; MONTEIRO, Marisa. Legal Design: instrumento de inovação legal e de acesso à justiça. In MALDONADO, Viviane Nóbrega; FEIGELSON, Bruno. Advocacia 4.0. [livro eletrônico]. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 2608.
5 PEREIRA, Filipe; MONTEIRO, Marisa. Legal Design: instrumento de inovação legal e de acesso à justiça. In MALDONADO, Viviane Nóbrega; FEIGELSON, Bruno. Advocacia 4.0. [livro eletrônico]. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 2630-61.
6 GABEL, Kathleen. Law + Design- Summit. Disponível aqui. Acesso em 05 out. 2020.
7 LEGAL DESIGN LAB. Our Mission. Disponível aqui. Acesso em 05 out. 2020.
8 Disponível aqui. Acesso em 05 out. 2021.
9 PEREIRA, Filipe; MONTEIRO, Marisa. Legal Design: instrumento de inovação legal e de acesso à justiça. In MALDONADO, Viviane Nóbrega; FEIGELSON, Bruno. Advocacia 4.0. [livro eletrônico]. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 2752.
10 NUNES, Dierle; RODRIGUES, Larissa Holanda Andrade. O contraditório e sua implementação pelo design: design thinking, legal design e visual law como abordagens de implementação efetiva da influência. In. NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique dos Santos; WOLKART, Erik Navarro. Inteligência Artificial e Direito Processual: os impactos da virada tecnológica no direito processual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 239.
11 NUNES, Dierle; RODRIGUES, Larissa Holanda Andrade. O contraditório e sua implementação pelo design: design thinking, legal design e visual law como abordagens de implementação efetiva da influência. In. NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique dos Santos; WOLKART, Erik Navarro. Inteligência Artificial e Direito Processual: os impactos da virada tecnológica no direito processual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 241.
12 NUNES, Dierle; RODRIGUES, Larissa Holanda Andrade. O contraditório e sua implementação pelo design: design thinking, legal design e visual law como abordagens de implementação efetiva da influência. In. NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique dos Santos; WOLKART, Erik Navarro. Inteligência Artificial e Direito Processual: os impactos da virada tecnológica no direito processual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 257.
13 VISUAL LAW. Elementos visuais em petições na visão da magistratura federal. Disponível aqui. Acesso em 30 set 2021.
14 Ver: ROVER, Tadeu. Advogado usa QR Code em petição para facilitar comunicação com juiz. Acesso em 30 set 2021.