O ministro Dias Toffoli concedeu parcialmente medida cautelar, entendendo que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, porque contraria os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero.
O ministro decidiu interpretar artigos do Código Penal e do Código de Processo Penal conforme a Constituição, excluindo a legítima defesa da honra, do modo como é historicamente aplicada no Tribunal do Júri.
Óbvio. Mas por que uma tese esdrúxula ainda está sendo debatida, ainda mais por um ministro do Supremo?
Por incrível que pareça, as defesas ainda aplicam a tese da legítima defesa da honra para absolver homens nos Tribunais do Júri. Como o júri é leigo e não está obrigado a fundamentar juridicamente as suas decisões, tecnicamente, a defesa poderia sustentar essa tese para colher uma absolvição de um feminicida.
O júri ainda estaria legitimado pela garantia constitucional da soberania dos veredictos e pela plenitude de defesa (argumentos que Toffoli já afastou, corretamente, interpretando a sua amplitude, de acordo com os princípios da igualdade de gênero e da dignidade humana).
Assim, os advogados dos réus não podem mais sustentar a tese de modo algum, direta ou indiretamente, nas fases pré-processual ou processual penais e perante o tribunal do júri, ou haverá a nulidade do ato e do julgamento.
Aquele que pratica feminicídio ou usa de violência, para "reprimir um adultério", não está se defendendo de nada. Está praticando crime. Ponto final. Não cabe aqui nenhuma relativização.
Já vi esta semana criminalistas defendendo que a legítima defesa da honra existe e que o problema é a desproporcionalidade na tese no Tribunal do Júri, ou seja, você não pode sacrificar um bem maior, a vida, por um bem menor, a honra.
Primeiro, não se defende honra alguma matando uma mulher. Segundo, mesmo que, tecnicamente, seja correto dizer que a honra pode ser defendida e que o problema é o contexto, não é hora de se fazer essas ponderações. É momento de simbolicamente e incisivamente repudiar uma tese de uma estupidez e sexismo abissais.
A legítima defesa da honra, no Tribunal do Júri, reproduz e amplia a violência de gênero em nosso país, fazendo com que o julgamento se desloque para a análise do comportamento da mulher, como se ela fosse a culpada pelo seu próprio assassinato.
A legítima defesa da honra culpava a vítima pela própria morte, naturalizando as práticas mais torpes da violência de gênero. Exorcizava a justiça e transformava o júri em um circo macabro. É uma relíquia triste de um Brasil perdido. Que tenha ido embora para nunca mais voltar!