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Reforma necessária, mas insuficiente

Reforma necessária, mas insuficiente.

7/3/2019

A economia brasileira necessita de muitas e
profundas reformas para se desenvolver

A reforma da previdência social, lançada pelo governo há duas semanas, parece ser uma resposta razoável às necessidades do país no que tange ao tema. A economia total em 10 anos deve gravitar ao redor de R$ 1,1 trilhão e virá pelo aumento a idade mínima para aposentadoria e pela redução do benefício, em alguns casos. Em 2018, a Previdência e Assistência social apresentaram um dispêndio da ordem de R$ 700 bilhões, cerca de seis vezes o que se gastou com saúde e dez vezes o que se gastou com educação. Assim não dá.

As resistências às manobras legislativas que pretendem reduzir a gritante desigualdade nos gastos da previdência social vêm de dois segmentos muito simbólicos: de um lado a esquerda anacrônica que não reconhece a situação e defende o direito dos mais ricos. Marx teria calafrios, posso imaginar! De outro, os corporativistas, estes seres bem instalados no Congresso Nacional, cuja pregação sugere que todos serão injustiçados se houver reforma. De fato, os corporativistas desprezam os mais pobres e cuidam mesmo é de seu contracheque mensal. O discurso corporativista funciona apenas para segmentos das Casas Legislativas vez que a evidência demonstra que o funcionalismo, em geral, ganha cinco vezes mais que os "comuns" (maior parte do eleitorado), sendo que no caso de militares, procuradores e juízes essa diferença beira à imoralidade absoluta.

Dá para ser otimista em relação à votação do tema ser proveitosa para a finança pública. A razão mais forte para isso é que, sem a reforma, Estados e municípios se tornarão inviáveis. Logo, os distintos representantes do povo e dos Estados terão de arbitrar entre (i) uma reforma previdenciária que torne mais isonômicos os ganhos de poucos milhões de funcionários públicos e (ii) uma crise federalista mais à frente. Sinceramente, acredito que suas excelências acabarão por preservar os cargos de prefeito e governador que sempre estão a cobiçar. Portanto, a previdência deve ser reformada porque finalmente aportamos no "espírito do tempo" no qual o Mefistófeles de plantão é o crescente déficit que engalfinha o Estado e seus asseclas. É claro que que as corporações, aqui e ali, tirarão nacos da reforma a seu favor. Contudo, o que estou a dizer é que, ao final do processo legislativo, o ganho fiscal será positivo e bom para o Brasil.

Sem equívocos, pode-se afirmar que a reforma da previdência é condição prévia de qualquer reforma fiscal. O déficit previdenciário é tão avassalador que não se pode falar de reforma fiscal sem se falar de previdência. O que parece realmente discutível é a elaboração teórica de que a reforma da previdência trará inexoravelmente crescimento econômico. Isso pode acontecer ou não. É verdade que os fatores de produção (capacidade instalada, empregos, etc.) estão bem desocupados que podemos aumentar rapidamente a produção sem que isso implique no curto prazo em aumento das expectativas de inflação. Por esse raciocínio a boa-nova da reforma da previdência soará como fator decisivo para o crescimento do consumo e do investimento. Será?

A vontade de consumir e investir nasce do denominado "espírito animal" (conceito aristotélico tomado por Keynes na sua teoria econômica) daqueles que tomam no presente o risco de enfrentar o futuro opaco para realizar maior satisfação de consumo e lucros por investir. Ou seja, o processo racional de investir e consumir tem fortes componentes de expectativas. De forma breve, esse raciocínio parece englobar muito mais que o resultado da votação da reforma da previdência social.

Há muito fatores que indicam que a economia brasileira perdeu tração para se desenvolver. Do papel letárgico do Estado para forjar o desenvolvimento por meio de políticas públicas até a queda sistemática da produtividade dos fatores de produção, inclusa a mão-de-obra influenciada pelo fator demográfico, há evidências de que a economia brasileira tende à estagnação. Somente com enorme esforço dos agentes econômicos é que será quebrada essa tendência estrutural. Assim sendo, muito embora a promessa liberal seja a de libertar o "espírito animal" dos empreendedores por meio de reformas pró-mercado (sem dúvida um aspecto positivo), parece relevante que se pense um modelo novo para o papel que o Estado exercerá nesse processo. Questões básicas, tais como a disponibilização ou facilitação do crédito, a melhora da infraestrutura, o treinamento da mão-de-obra, ainda estão pendentes de serem repensadas. Outros temas novos como a "revolução industrial 4G", políticas de inovação tecnológica, a integração do país nas cadeias produtivas mundiais, necessitam de respostas eficientes e rápidas para que possamos surfar nas ondas das principais economias mundiais.

O que temos verificado nos fatos disponíveis, no comportamento dos agentes públicos e privados, são movimentos muito desencontrados e tímidos. A economia brasileira necessita de muitas e profundas reformas para que possa voltar ao leito do desenvolvimento. A reforma da previdência social é fato essencial do processo, mas não é a revolução necessária para que o Brasil possa acompanhar a revolução que ocorre lá fora.

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Colunista

Francisco Petros Advogado, especializado em direito societário, compliance e governança corporativa. Também é economista e MBA. No mercado de capitais brasileiro dirigiu instituições financeiras e de administração de recursos. Foi vice-presidente e presidente da seção paulista da ABAMEC – Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais e Presidente do Comitê de Supervisão dos Analistas de Investimento. É membro do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo e do Corpo de Árbitros da B3, a Bolsa Brasileira, Membro Consultor para a Comissão Especial de Mercado de Capitais da OAB – Nacional. Atua como conselheiro de administração de empresas de capital aberto e fechado.