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Três prioridades iniciais e uma permanente

Os três maiores desafios que a presidente Dilma terá de encarar no curto prazo.

11/11/2014

Do meu ponto de vista não há, em princípio, nenhum impasse econômico à vista no Brasil. A despeito de todas e severas críticas que se possa fazer à política econômica, a situação com a qual nos defrontamos é delicada, mas de forma alguma é calamitosa ou trágica. A sociedade brasileira hoje está sofrendo pelos percalços e erros primários que foram cometidos durante o atual mandato da presidente da República. Faltou à administração Federal a sapiência em torno do ABC da política econômica, bem como a visão estratégica para identificar, planejar e implementar os projetos e planos que poderiam lançar o país em novo patamar de desenvolvimento. Isto, contudo, é história. Não podemos ficar preso a ela.

Agora é preciso respeitar o novo contrato estabelecido entre o povo-eleitor e a nova mandatária do país. O jogo democrático é este e não é possível conspirar contra ele sem provocar mazelas maiores que a delicada situação que iremos enfrentar.

A presidente Dilma tem todo o direito de mudar o curso de seu governo e, diria mais, deve fazê-lo. O presidente Fernando Henrique Cardoso mudou o regime cambial onze dias após o início de seu segundo mandato. Fez bem, a despeito do fato de que este erro estratégico ter custado o crescimento per capita nulo ao longo dos quatro anos derradeiros de sua passagem pela presidência da República. Não creio que se possa criticar a presidente pelas eventuais mudanças que venha a fazer. Restará a questão do proselitismo político a pregar o eventual "estelionato eleitoral". Aí, já estamos no vasto campo das possibilidades do discurso político com vistas aos projetos eleitorais futuros os quais não necessariamente se aliam com os interesses imediatos do país.

Na área econômica, os três maiores desafios têm de ser encarados no curto prazo. Não há tempo a perder. O primeiro é a rápida reconstrução da confiança fiscal. Além do inerente efeito sobre o crédito do país, a obtenção de superávits primários é questão que ganhou contornos religiosos. Em questão de fé, é melhor rezar conforme a doutrina. Se quiser mudá-la, terá de ser por meio do convencimento político. Além disso, talvez a presidente tenha de afastar toda a equipe econômica associada às teses fiscais expansionistas e à tal da contabilidade criativa. A escolha de um ministro com credibilidade é tarefa essencial deste processo.

O segundo tema a ser atacado no curto prazo diz respeito aos projetos de infraestrutura e às relações entre o setor público e o setor privado no que concerne a tais investimentos. Aqui a questão é bem mais complexa de vez que não diz respeito apenas à forma geral desta relação (mais ou menos intervencionista), mas sobretudo aos detalhes que compõem cada projeto. Parece-nos que, neste campo, há arroubos de todos os lados: o setor privado espera que o Estado se comporte como se empresa privada fosse e, do lado do Estado, vê-se a defesa de interesses corporativistas e/ou visões dogmáticas que desconfiam de tudo que é privado. O corolário momentâneo deste antagonismo é a relação pouco produtiva e, às vezes, recheada de corrupção e de acordos inconfessáveis. Precisamos, neste item, é construir uma estrutura jurídica que atenda equilibradamente a todos os interesses. Vale edificar um direito administrativo em prol do desenvolvimento. A partir de um novo marco jurídico poder-se-á pensar em avaliar com mais serenidade a questão da eficiência. Note-se que não é porque é privado que a eficiência é razoável. Basta ver, por exemplo, o que ocorre nas áreas de mobilidade urbana de centros importantes como Rio de Janeiro e São Paulo onde o desempenho do setor privado é sofrível.

Como terceiro tema prioritário, parece-me que a questão do setor externo brasileiro. O déficit em conta corrente do Brasil é insustentável – US$ 80 bilhões por ano, mesmo com reservas externas elevadas, é um número cavalar. Além de colocar o real num patamar efetivamente competitivo, o governo terá de mudar a mentalidade "de importador" que o setor de comércio exterior adquiriu depois de mais de vinte anos de abusos na política de valorização do câmbio. Aqui caberá uma série de tarefas que sejam capazes de aumentar a competitividade do Brasil para produzir divisas em moeda forte. A palavra é desgastada, mas trata-se de uma política de substituição de importações que seja de sucesso. A Ásia é um exemplo a ser analisado – não a ser seguido ipsi litteris. É preciso perseguir metas microeconômicas e agregar conteúdo tecnológico – neste último item setores compostos por empresas menores podem contribuir para melhorar as exportações e qualificar a mão de obra, ao mesmo tempo.

Creio que estas devem ser as três primeiras prioridades do governo. Outras questões tais quais a inflação, o setor elétrico e a administração da Petrobras, a meu ver, não necessitam de "novas políticas" ou de "grandes alterações" no que se refere à concepção básica do ponto de vista estratégico. Nestes casos, há que se fazer o que já se sabe, o que já se conhece, o que é necessário. Trata-se de aprofundar a ação, demitir pessoas, extirpar tumores, criar paradigmas de eficiência e comportamento.

Por fim, há que se reconhecer que as "tarefas iniciais" que a nova administração terá de cumprir não são suficientes para engendrar um desenvolvimento que seja sustentável e, ao mesmo tempo, cumpra o papel distributivista que me parece necessário para que se cumpra a previsão constitucional. Neste caso, o Brasil tem de reaprender a ser inventivo, a criar novas Instituições sem se apegar necessariamente às construções já feitas no passado e aquelas que já foram fabricadas em outros países. O papel de um governante que quer ampliar o horizonte da Nação é o de construir novas Instituições que norteiem o desenvolvimento em bases que sejam compatíveis com os interesses, com a cultura, com os projetos e com a visão estratégica do povo. Há uma paralisia criativa no Brasil em relação a como podemos compatibilizar desenvolvimento econômico e social. Esta equação não será resolvida senão por meio de uma reflexão aprofundada dos temas essenciais da Nação sem as amarras mentais às quais parecemos ligados. A economia social de mercado da Alemanha Ocidental, ou o Estado do bem-estar da França, ou, ainda, o Federalismo norte-americano não foram pré-moldados. Foram tecidos em conformidade com o momento histórico e com os interesses estratégicos daquelas nações. Por que não podemos abrir as nossas mentes e pensar o Brasil em novos moldes? Ou será que estamos rendidos ao destino de permanecermos deitados em eterno berço (nem tanto) esplêndido?

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Colunista

Francisco Petros Advogado, especializado em direito societário, compliance e governança corporativa. Também é economista e MBA. No mercado de capitais brasileiro dirigiu instituições financeiras e de administração de recursos. Foi vice-presidente e presidente da seção paulista da ABAMEC – Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais e Presidente do Comitê de Supervisão dos Analistas de Investimento. É membro do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo e do Corpo de Árbitros da B3, a Bolsa Brasileira, Membro Consultor para a Comissão Especial de Mercado de Capitais da OAB – Nacional. Atua como conselheiro de administração de empresas de capital aberto e fechado.