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A abordagem regulatória dos países asiáticos ao mercado cripto

Países asiáticos, por exemplo, como Coréia do Sul, Hong Kong, Índia e Singapura diferem em suas abordagens na tentativa de administrar e prevenir riscos no mercado de criptoativos.

2/12/2022

"Os países asiáticos como Hong Kong, Coreia do Sul, Índia e Singapura diferem em suas abordagens de tentativa de administrar e prevenir crises no mercado de criptoativos."  

Regular não é uma tarefa fácil

Pergunte a qualquer legislador e eles te darão a mesma resposta. Assim que eles acabam de compreender o que quer que tenha causado a última crise no mercado financeiro, algo novo surge e altera o caminho pelo qual eles estavam apurando as responsabilidades.

Este cenário, no entanto, não significa que todos os reguladores adotem a mesma abordagem para gerenciar e prevenir riscos.

Países asiáticos, por exemplo, como Coréia do Sul, Hong Kong, Índia e Singapura diferem em suas abordagens na tentativa de administrar e prevenir riscos no mercado de criptoativos.

É isto que veremos no artigo de hoje. 

As abordagens para regular o mercado de criptoativos têm sido diferentes 

Diante das diversas espécies de criptoativos, os muitos tipos de de blockchains, além de tantos países diferentes envolvidos, no final de 2022, Hong Kong atualizou seus regulamentos sobre o mercado cripto, sinalizando a meta de aumentar o acesso do varejo a esta nova classe de ativos.

Poucos dias depois, o FTX Group entrou em colapso e pediu falência na vizinha Cingapura, que vem endurecendo as regulamentações após grandes perdas este ano.

A Coreia do Sul, que ainda está lidando com as consequências do colapso dos tokens Terra-Luna, está atualmente se concentrando no endurecimento da regulação.

E a Índia, um tanto peculiar na região, está usando a política tributária para tentar direcionar o comportamento dos investidores.

Neste contexto, vejamos então como esses diferentes países asiáticos estão abordando a regulamentação do mercado cripto.

As diferentes jurisdições na Ásia ainda estão tentando descobrir o que fazer com essa nova classe de ativos

Os países asiáticos estão se debruçando menos sobre qual é a taxonomia dos tokens e como eles operam. Pode-se dizer que eles estão mirando mais os pontos tradicionais como, por exemplo: o que sabemos sobre criptoativos? Onde estes criptoativos estão? Eles são seguros?

Quando olhamos para o foco dos dois maiores players da região sobre o assunto, podemos verificar o seguinte.

1) Singapura

Há alguns anos, Singapura foi um dos primeiros países a adotar a ideia de que era necessário desenvolver um hub cripto para fomentar a inovação.

Portanto, eles estavam na vanguarda na tentativa de criar um ambiente que atraísse investimentos e projetos blockchain promissores, como o marketplace descentralizado de dados Ocean Protocol, capazes de trazer inovação tecnológica ao país, em um cenário de investimentos atrativos.  

Então, o país começou a perseguir este objetivo. 

Contudo, no ano passado, vimos o que a má-gestão de criptoativos ou a negligência em projetos cripto pode causar.

Os colapsos do fundo de hedge Three Arrows (3AC) e da stablecoin algorítma Terra-Luna acabou refletindo em Singapura, porque ambos os projetos tinham uma conexão com o país, e foi grande o número de investidos atingidos.

Pois bem, tudo isto levou os reguladores de Singapura a adotar uma postura muito mais cautelosa em relação à especulação de varejo e a parte da indústria cripto focada no varejo. 

Assim, os reguladores se tornaram muito mais rígidos em sua abordagem regulatória quanto aos investimentos cripto no varejo, dividindo as classes de investidores para conceder maior liberdade àqueles investidores com alto patrimônio liquido.

E ao fazer isto, os reguladores querem garantir que as pessoas estejam adequadamente protegidas dos riscos que vimos no mercado cripto no ano passado.

Neste contexto, Singapura ainda quer se tornar um hub de inovação, mas um hub que é focado na produtividade dos usos da tecnologia blockchain.

O país não quer os atores especulativos do mercado cripto, que causam toda sorte de riscos e problemas, e este é o cenário onde Singapura está agora.

2) Hong Kong

No final de outubro deste ano, Hong Kong começou a migrar em direção oposta a Singapura, para um ambiente onde eles querem permitir o mercado cripto de varejo, via ETFs (Exchage-Traded Funds). O intuito, aqui, é que através de ETF’s, os investidores do mercado tradicional tenham acesso a esta nova classe de ativos.

Nesse passo, os reguladores começaram a analisar também o status legal das redes de contratos inteligentes e dos ativos tokenizados, a fim de criar uma estrutura regulatória em Hong Kong que funcione para eles. 

E o curioso aqui é que essa mudança no approach regulatório de Hong Kong aconteceu subitamente. 

Antes, o Hong Kong adotava um regime de licenciamento voluntário –  que alguns classificavam como um sinal de um ambiente pouco amigável para o mercado cripto.

Pouco amigável porque a empresa que optasse se tornar licenciada, não poderia oferecer seus serviços a investidores de varejo – a menos que o investidor tivesse mais de US $1.000.000 em ativos para investir.

Portanto, o regime regulatório anterior de Hong Kong estringia as empresas licenciadas a investidores com alto patrimônio liquido, por se presumir que teriam uma melhor compreensão dos riscos que estariam assumindo.

E isto tudo em uma época que a China basicamente proibia tudo que era relacionado a criptoativos, como a mineração.

Também houve um certo grau de agitação política em Hong Kong, e algumas restrições bastante severas por causa da Covid-19, que duraram mais tempo em Hong Kong que em outros lugares da Ásia.

De modo que todo este cenário de fundo sugeria que Hong Kong não era o lugar para estar no mercado cripto.

No entanto, para surpresa de todos, o país começou a se posicionar como o centro proeminente da Ásia para o mercado cripto, o que tem encorajado outras empresas cripto a investir e se estabelecer no país.

Daí, temos essas duas jurisdições indo em caminhos opostos agora. E com isto, a pergunta que todos estão fazendo agora é: qual tipo de impacto essa mudança na abordagem regulatória desses dois países trará para investidores e o mercado cripto asiático?

Ainda não temos a resposta para tal questão, porque em meio ao efeito dominó gerado pela quebra do FTX Group, tudo ainda está acontecendo.

Some-se a isto, o fato de que o FTX, antes de ser domiciliada nas Bahamas, ela tinha domicílio empresarial em Hong Kong. E o Grupo decidiu mudar sua sede de Hong Kong, justamente porque depois de vários países da Ásia, principalmente a China, adotaram uma postura muito mais dura em relação ao mercado de criptoativos.

3) Coréia da Sul

O país, por vários anos, tem sido um lugar com forte interesse e volumes significativos de atividade no mercado cripto de varejo.

Também, é o lugar onde surgiram vários protocolos DeFi, com uma comunidade de desenvolvedores de software bastante ativa.

Quanto à abordagem regulatória, a Coréia sempre se posicionou como um país pró-cripto, e que pegou carona no enorme boom do mercado cripto entre 2017 e 2020. Muitos investidores coreanos fizeram fortuna em cripto nesta época.

Então, o cenário era favorável ao mercado cripto quando o atual Presidente sul coreano estava disputando as eleições, e propôs continuar com essa postura pró-cripto, mas através de uma estrutura regulatória abrangente para regular a indústria.

No entanto, quando o Presidente John tomou posse em maio, logo depois que o episódio Terra-Luna veio a tona, houve uma mudança na proposta do regime regulatório coreano, que atualmente está paralisada.

Dito de outro modo, a abordagem regulatória na Coreia foi impactada pelo colapso da Terra-Luna, tornando o complexo debate sobre qual o regime cripto mais indicado, ainda mais complexo.

Isto porque, reguladores e autoridades coreanos estão debatendo a legislação do mercado cripto, enquanto lidam com a irritação de investidores causada pelo catastrófico projeto Terra-Luna, e com o alerta vermelho da Interpol emitido contra Do Kwon. 

Por isso, ainda não há uma posição muito clara da Coreia do Sul sobre qual será sua abordagem regulatória do mercado cripto.  

4) Índia

A Índia tem usado a tributação, que não é exatamente um regime regulatório, como forma de incentivar ou desincentivar certos tipos de comportamento no mercado de criptoativos.

Eles também tomaram medidas para tornar mais difícil para instituições como a Coinbase usar bancos indianos, ou ter acesso a bancos indianos, e outros serviços afins.

Isso significa que, na prática, se você é um indiano tentando fundar uma empresa de carteiras digitais (wallets), o número de obstáculos pelos quais você deve passar é tão exaustivo que é mais provável que você desista no meio do caminho. Mesmo que não haja nada tecnicamente dizendo que você não tem permissão para abrir uma empresa de wallets.

Notas finais

Atualmente, existem muitas empresas cripto não regulamentadas, ou operando em certas ilhas ou países com pouca ou nenhuma regulamentação. 

Mais do que isso, a maioria dos países ainda não possui regulamentação e requisitos unificados para os players do mercado cripto.

Todavia, como vimos, a abordagem regulatória e os requisitos não são os mesmos em todos os países, e o que é obrigatório em alguns lugares, pode não ser em outras jurisdições para empresas que operam lá. 

Ora, isto é um grande problema. Principalmente se levarmos em conta a demanda crescente do lado dos players financeiros tradicionais para se envolverem com players cripto legítimos. 

O ideal, contudo, seria um mundo onde vigorasse um meio-termo de todas essas abordagens regulatórias, em um regime regulatório unificado para todos os países.

Principalmente se o mercado a ser regulado presta serviços e gera produtos ligados a um ativo transacionado em diversas jurisdições e com alcance global.

Conhecimento é poder!! Nos vemos em breve!

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Colunista

Tatiana Revoredo é representante do "European Law Observatory on New Technologies" no Brasil. Especialista em Direito Digital e Professora de Blockchain para Negócios no Insper. Especialista em aplicações de negócios Blockchain pelo MIT Sloan School of Management, em Inteligência Artificial pelo MIT CSAIL, em estratégia de negócios em Inteligência Artificial pelo MIT Sloan School of Management e em Cyber-Risk Mitigation pela Harvard University. Estrategista Blockchain pela Saïd Business School, University of Oxford. Convidada pelo Parlamento Europeu e pelo Congresso Nacional para palestrar sobre blockchain, criptoativos e legislações correlatas. Membro-fundadora da Oxford Blockchain Foundation. LinkedIn Top Voice em Tecnologia e Inovação. Coautora do livro "Criptomoedas no Cenário Internacional: qual o posicionamento de autoridades, Bancos Centrais e Governos". Autora dos livros "Blockchain: Tudo o que você precisa saber"; e "Bitcoin, CBDC, DeFi e Stablecoins".