CPC na prática

Princípios do contraditório e da ampla defesa no julgamento da apelação

Na coluna de hoje, o professor André Pagani de Souza discute a importância dos princípios do contraditório e da ampla defesa no processo judicial, previstos no artigo 5º, inciso LV da CF.

12/9/2024

Como se sabe, a Constituição Federal (CF) estabelece, em seu artigo 5º, inciso LV, que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". Trata-se de um dos dispositivos mais importantes do texto constitucional, no que se refere ao direito processual civil, pois a um só tempo consagra os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Tamanha é a importância desses princípios que José Roberto dos Santos Bedaque observou o seguinte:

"Eventual violação desses princípios implica evidente nulidade dos atos processuais praticados anteriormente. Se, por algum motivo injustificado, qualquer das partes foi impedida de participar ativamente do processo e influir na convicção do julgador, tudo o que se realizar após essa falha estará comprometido" (Efetividade do processo e técnica processual, 3ª edição, São Paulo: Malheiros, 2010, p. 495).

Assim, uma vez violado o princípio do contraditório e configurado o cerceamento de defesa, os atos subsequentes serão nulos. O que fica em aberto, depois do reconhecimento da nulidade, é saber se ela é sanável ou não.

Em julgado recente, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa e declarou a nulidade de ato praticado no curso do julgamento de um recurso de apelação. Confira-se, a propósito, a ementa da decisão:

"Recurso de apelação. Rejulgamento na mesma sessão que acolhe os embargos de declaração. Direito à sustentação oral. Notificação prévia. Ausência. Nulidade. Violação ao contraditório e à ampla defesa. O rejulgamento do recurso de apelação na mesma sessão que acolhe os embargos de declaração - sem a devida notificação prévia para sustentação oral - configura cerceamento ao direito de defesa e ao contraditório, ocasionando a nulidade do julgamento. (STJ, Segunda Turma, REsp 2.140.962-SE, Rel. Ministro Teodoro Silva Santos, por unanimidade, julgado em 3/9/2024)".

No caso concreto, o Tribunal local, após o acolhimento dos embargos de declaração e a consequente anulação do julgamento anterior devido à violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa, procedeu imediatamente ao rejulgamento das apelações na mesma sessão.

Tal procedimento deveria ter sido precedido de uma nova inclusão em pauta e de uma oportunidade para renovação da sustentação oral (CPC, art. 937, I), pois houve uma clara divisão das etapas do julgamento, o que pode comprometer a integridade dos direitos ao contraditório e à ampla defesa das partes envolvidas. Houve o reconhecimento de uma nulidade processual pelo Tribunal de origem e, na sequência, o novo julgamento do mérito das apelações.

Cumpre observar que os patronos de uma das partes não haviam sequer sido intimados do julgamento do recurso, pois o ato foi realizado em nove de antigos advocados que já não mais atuavam no processo.

Diante disso, ficou claro o prejuízo a uma das partes que não foi regularmente intimada do julgamento do recurso e privada da possibilidade de apresentar sustentação oral de suas razões recursais no tocante ao mérito da apelação, direito garantido pelo inciso I do art. 937 do CPC.

Para sanar esse vício de intimação prévia da parte antes do julgamento do mérito recursal, seria necessário provar que não houve dano para as partes causado pela forma como o julgamento das apelações aconteceu. Nessa linha é a lição de José Roberto dos Santos Bedaque, para quem "(...) se da falha processual não decorrer dano a essa garantia ou a outro interesse da parte prejudicada, ou se a sentença transitar em julgado, desconsidera-se a nulidade" (op. cit., p. 501).

Ocorre que o dano foi claro para uma das partes que deixou de realizar sustentação oral de suas razões recursais quanto ao mérito de sua apelação. Por tal razão, merece aplausos o Superior Tribunal de Justiça, por mais uma vez ter corrigido um erro de julgamento consistente em nítida violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

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Colunistas

André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto Pós-doutorados em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015), na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019), na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022) e na Universitá degli Studi di Messina (2024/2025). Visiting Scholar no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil e em Direito Constitucional (2023/2024). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). MBA em Agronegócio pela USP (2025). MBA em Energia pela PUC/PR (2025). Pós Graduação Executiva em Negociação (2013) e em Mediação (2015) na Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em diversos cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (ex.: EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb e da Amcham. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Membro honorário da ABEP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).