CPC na prática

A inadmissibilidade do recurso especial ou extraordinário e único recurso cabível o agravo contra despacho denegatório (art. 1.042 do CPC). Ausência de efeito interruptivo dos embargos de declaração opostos contra a decisão de inadmissibilidade do recurso

Um dos princípios que emerge na Teoria Geral dos Recursos é o Princípio da Tipicidade.

14/9/2023

Um dos princípios que emerge na Teoria Geral dos Recursos é o Princípio da Tipicidade. Em outras palavras, o recurso, destinado a impugnar determinada decisão judicial, somente é cabível se assim o for previsto no sistema.

Um dos recursos mais corriqueiros na advocacia reside nos chamados Embargos de Declaração, cujas hipóteses de cabimento, taxativas, está restrita a decisão embargada que padece de obscuridade, contradição, omissão ou erro material, ex vi ao quanto disposto no art. 1.022, I, II e III, do CPC.

De igual sorte, reza o art. 1.026 do CPC, que “... os embargos de declaração não possuem efeito suspensivo, e interrompem o prazo para a interposição do recurso. Em outras palavras, malgrado o órgão julgador negue provimento aos embargos de declaração, a tempestiva oposição desta modalidade recursal tem o condão de gerar o chamado Efeito Interruptivo, ou seja, o prazo de interposição do recurso subsequente aos Embargos de Declaração restará interrompido e terá início somente após a intimação da decisão de seu respectivo julgamento.

Ou seja, se houver sentença e, rejeitados os embargos de declaração, o prazo para interposição de apelação terá início a partir da intimação das partes de seu respectivo julgamento. Se houver acórdão que decida a apelação e, opostos os embargos de declaração, o prazo para interpor eventual recurso especial ou extraordinário se iniciará a partir da intimação do acórdão de julgamento dos embargos de declaração.

Todavia, uma regra e objetiva ganha nova dimensão e cuidados em se tratando de recurso especial e extraordinário. Explica-se.

Recentemente a Terceira Turma do STJ reafirmou entendimento anterior ao CPC de 2015, para fixar a tese de que (i) o agravo contra despacho denegatório de seguimento de recurso especial ou extraordinário é o único recurso cabível contra respectiva decisão e (ii) se nesta hipótese restarem opostos embargos de declaração, estes não terão o condão de gerar o efeito interruptivo para interposição do recurso subsequente:

“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DE ADMISSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO INCABÍVEL. PRAZO RECURSAL. NÃO INTERRUPÇÃO. AGRAVO INTEMPESTIVO.

  1. O agravo é o único recurso cabível contra a decisão que não admite o recurso especial, sendo que a oposição de declaratórios não interrompe o prazo para a interposição de agravo em recurso especial. Precedentes da Corte Especial.
  2. Agravo interno não provido.” (STJ, AgInt no AResp 1216265/SE, Terceira Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, v.u., j. 23.5.23)

O voto condutor bem elucidou:

“A questão jurídica resultava do fato de o legislador ter promovido a inclusão expressa do termo "qualquer decisão judicial" na redação do artigo 1.022 ao tratar das hipóteses de cabimento dos aclaratórios, sedimentando, é bem verdade, posicionamento já há muito consolidado na jurisprudência pátria.

Ocorre que, melhor examinando o tema em debate e, especialmente, os precedentes mais recentes desta Corte Superior a respeito, o que se constata é que, mesmo após a entrada em vigor do CPC/15, a jurisprudência do STJ tem se mantido inalterada, conforme se observa dos seguintes julgados:

AgInt no MS 25.013/DF, rel. Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 2/10/19, DJe de 7/10/19; AgInt no AREsp 1.477.958/RS, rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 19/8/19, DJe de 21/8/19; AgInt no AREsp 1.457.368/SP, rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 25/6/19, DJe de 28/6/19, e EDcl no AgInt no AREsp 1.277.980/RJ, rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 29/4/19, DJe de 2/5/19.

Além disso, após a afetação do presente recurso, a Corte Especial já se debruçou sobre o tema em apreço em mais de uma oportunidade, sempre concluindo pela prevalência da orientação jurisprudencial supra mencionada.

A título de exemplo, oportuno consignar os seguintes julgados:

"AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS CONTRA JUÍZO PRÉVIO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANIFESTAMENTE INCABÍVEL. MANIFESTA INTEMPESTIVIDADE DO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.

  1. O acórdão objeto dos embargos de divergência ostenta o mesmo entendimento erigido pela jurisprudência desta Casa, no sentido de que os embargos de declaração, quando opostos contra decisão de inadmissibilidade do recurso especial proferida na instância ordinária, não interrompem o prazo para a interposição do agravo previsto no artigo 1.042 do CPC - único recurso cabível -, salvo quando essa decisão for tão genérica que impossibilite ao recorrente aferir os motivos pelos quais teve seu recurso obstado, impedindo-o de interpor o agravo.
  2. Agravo interno não provido" (AgInt nos EAREsp 1.653.277/RJ, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 26/4/22, DJe de 3/5/22 - grifou-se).

"AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AUSENTES AS HIPÓTESES DE ADMISSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INTEMPESTIVIDADE.

  1. Não prospera o agravo interno cujos fundamentos são a reiteração dos mesmos fundamentos expostos no recurso anteriormente indeferido.
  2. A interposição de recurso manifestamente incabível não interrompe o prazo recursal. Assim, os embargos de declaração opostos a decisão que inadmite recurso especial não interrompem o prazo para a interposição do agravo em recurso especial, único recurso cabível na hipótese.
  3. Agravo interno desprovido" (AgInt nos EDcl nos EAREsp 1.632.917/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Corte Especial, julgado em 9/3/21, DJe de 11/3/21 - grifou-se)

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/73. ACÓRDÃO EMBARGADO QUE, CONFIRMANDO A DECISÃO DO RELATOR, SEQUER CONHECEU DO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL EM RAZÃO DO ÓBICE DA SÚMULA 182/STJ. AUSÊNCIA DE ANÁLISE DO MÉRITO DO RECURSO ESPECIAL. MANIFESTA INADMISSIBILIDADE DOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 315 DO STJ. EMBARGOS LIMINARMENTE INDEFERIDOS PELA PRESIDÊNCIA DO STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. ALEGADA OMISSÃO. VÍCIO INEXISTENTE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

  1. Sob o pálido argumento de que haveria 'omissão' no acórdão embargado, os Embargantes buscam, indisfarçavelmente, a reapreciação de questão já oportunamente analisada e decidida, o que não se coaduna com a via eleita.
  2. 'O vício que autoriza os embargos de declaração é a contradição interna do julgado, não a contradição entre este e o entendimento da parte, nem menos entre este e o que ficara decidido na instância a quo, ou entre ele e outras decisões do STJ' (EDcl no AgInt nos EAREsp 1.125.072/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, CORTE ESPECIAL, julgado em 14/3/19, DJe 02/4/19).
  3. Embargos de declaração rejeitados" (EDcl no AgInt nos EDcl nos EAREsp 741.649/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Corte Especial, julgado em 12/11/19, DJe de 5/12/19 - grifou-se).

Diante desse cenário, não prosperam as alegações postas no agravo, incapazes de alterar os fundamentos da decisão impugnada.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.

É o voto.”

O aresto supra deita fundamento puramente interpretativo e na contramão da redação do caput do art. 1022, claro em admitir embargos de declaração contra qualquer decisão judicial. Ainda, o legislador do CPC em vigor também não criou regra de exceção para afastar o efeito interruptivo assegurado no art. 1.026 quando tempestivos os embargos de declaração.

Respeitado o entendimento acima, o STJ criou problemas de duas ordens:

a) qual a leitura e interpretação da regra de exceção criada pelo próprio STJ, qual seja: os embargos de declaração opostos contra a decisão de inadmissibilidade do recurso especial ou extraordinário não geram o efeito interruptivo, salvo “(...) quando essa decisão for tão genérica que impossibilite ao recorrente aferir os motivos pelos quais teve seu recurso obstado, impedindo-o de interpor o agravo”?

b) ao jurisdicionado, restará comprovar, quando da interposição de seu agravo contra despacho denegatório de seguimento de recursos especial ou extraordinário, que os embargos de declaração antes opostos se faziam necessário, dada a generalidade da decisão que inadmitiu o recurso especial.

Respeitado entendimento em sentido contrário, a orientação que remanesce ao jurisdicionado é deixar de opor embargos de declaração contra a r. decisão que inadmite o recurso especial ou extraordinário, sob pena de restar penalizado por mais este novo tema, dentre tantos, que compõe a chamada jurisprudência defensiva voltada a inadmitir o recurso previso no art. 1.046 do CPC e acesso às Cortes Superiores.

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André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto tem pós-doutorado em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015). Pós Doutorado em Democracia e Direitos Humanos, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019). Pós Doutorado em Direitos Sociais, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022). Pesquisador visitante no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil (2023). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). Pós Graduação Executiva nos Programas de Negociação (2013) e de Mediação (2015) da Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (destacando-se a EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae, UCDB, e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil: Teams. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).