A resolução n. 354, de 19/11/2020, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dispõe sobre "o cumprimento digital de ato processual e de ordem judicial e dá outras providências". Mais especificamente, o art. 1º esclarece que "esta resolução regulamenta a realização de audiências e sessões por videoconferência e telepresenciais e a comunicação de atos processuais por meio eletrônico nas unidades jurisdicionais de primeira e segunda instâncias da Justiça dos Estados, Federal, Trabalhista, Militar e Eleitoral, bem como nos Tribunais Superiores, à exceção do Supremo Tribunal Federal".
Vale notar que as "audiências telepresenciais" são definidas pela própria resolução em questão como sendo "as audiências e sessões realizadas a partir de ambiente físico externo às unidades judiciárias" (art. 2º, inc. II). Por sua vez, a "videoconferência" é definida como "comunicação a distância realizada em ambientes de unidades judiciárias" (art. 2º, inc. I).
No que diz respeito à possibilidade de realização e audiência de conciliação e mediação, o art. 3º, inc. IV, da referida resolução, estabelece que "as audiências telepresenciais serão determinadas pelo juízo, a requerimento das partes, se conveniente ou viável, ou, de ofício, nos casos de: (...) IV – conciliação ou mediação".
Apesar de ser louvável a tentativa de buscar disciplinar a realização de atos processuais por meios telepresenciais, a resolução n. 354, de 19/11/2020, do CNJ, deixou de tratar com a objetividade e clareza necessárias de uma questão fundamental para toda e qualquer audiência de mediação ou conciliação: a confidencialidade.
Com efeito, é crucial que o tema da confidencialidade seja enfrentado quando se estabelece que um juízo pode determinar a realização de audiência de conciliação ou mediação por meio de uma audiência telepresencial.
Como é cediço, a audiência realizada por meio presencial pode ser gravada por quaisquer das pessoas que estejam dela participando e o próprio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo recomenda a sua gravação em material divulgado em seu site na rede mundial.
Assim, seria necessário compatibilizar o disposto no art. 3º, inc. IV, da resolução n. 354/2020, do CNJ, com o art. 136, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil de 2015, que dispõe: "Art. 166. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada. § 1º A confidencialidade estende-se a todas as informações produzidas no curso do procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes. § 2º Em razão do dever de sigilo, inerente às sus funções, o conciliador e o mediador, assim como os membros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundo da conciliação ou da mediação" (grifos nossos).
O princípio da confidencialidade também está estampado no Código de Ética de Conciliadores e Mediadores Judiciais, anexo à resolução n. 125/2010, do CNJ, que foi alterado aos 4 de fevereiro de 2013 pelo Anexo III, que dispõe o seguinte em seu art. 1º, inciso I: "São princípios fundamentais que regem a atuação de conciliadores e mediadores judiciais, confidencialidade, decisão informada, competência, imparcialidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes, empoderamento e validação. I – Confidencialidade – dever de manter sigilo sobre todas as informações obtidas na sessão, salvo autorização expressa das partes, violação à ordem pública ou às leis vigentes, não podendo ser testemunha do caso, nem atuar como advogado dos envolvidos, em qualquer hipótese" (grifos nossos).
A lei 13.140, de 26 de junho de 2015, também conhecida como Lei de Mediação, igualmente, estabelece em seu art. 2º, inc. VII, que a mediação será orientada pelo princípio da confidencialidade.
Ou seja, com tantos dispositivos legais frisando que deverá ser observado o princípio da confidencialidade na realização da audiência de mediação e conciliação, o Conselho Nacional de Justiça poderia ter aproveitado a oportunidade para disciplinar a maneira pela qual será assegurada esta confidencialidade nas audiências de mediação e conciliação que serão realizadas pela forma telepresencial.
Tal confidencialidade é importante para que as partes sintam-se livres para participar da mediação ou da conciliação e assim seja aumentada a probabilidade de sucesso na tentativa da resolução consensual do conflito. Se a audiência for realizada de maneira telepresencial, como permite a resolução n. 354/2020, as partes deveriam ter a garantia de que o registro ou a gravação da audiência não chegassem ao conhecimento de ninguém, inclusive do juiz. Se isso não acontecer, confidencialidade será mais uma palavra vazia de significado no CPC de 2015.