Rogerio Mollica
Uma das inovações do Código de Processo Civil de 2015 foi a previsão do artigo 90, § 4º quanto a redução pela metade dos honorários advocatícios no caso do réu reconhecer a procedência do pedido e imediatamente cumprir a prestação reconhecida:
"§ 4º - Se o réu reconhecer a procedência do pedido e, simultaneamente, cumprir integralmente a prestação reconhecida, os honorários serão reduzidos pela metade".
Nesses 4 anos de vigência do Código de Processo Civil parece ter se consolidado o entendimento de que tal previsão só seria cabível na fase de conhecimento do processo1.
Uma dúvida que surgiu desde o início da vigência do novo Código foi se o referido benefício seria aplicável aos Entes Públicos em Juízo. De fato, é notório que os Entes Públicos não podem cumprir imediatamente suas obrigações de pagar, eis que os valores precisam ser incluídos no orçamento do ano seguinte e são pagos via ofícios Precatórios e Requisições de Pequeno Valor (RPV), nos termos do artigo 100 da Constituição Federal.
Portanto, mesmo que o Ente Público reconheça a procedência do pedido, não pode cumprir imediatamente a prestação reconhecida quanto ao pagamento de quantia. Por ser uma impossibilidade advinda da própria Constituição muito se questionou se a redução seria aplicável no caso do reconhecimento, com a expedição do Precatório/RPV.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu que tal benefício não seria aplicável nos seguintes termos:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. FAZENDA PÚBLICA. TÍTULO FORMADO EM AÇÃO COLETIVA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REDUÇÃO. ART. 90, § 4º, DO CPC.IMPOSSIBILIDADE.
1. Não cabimento da redução prevista no artigo 90, § 4º do Código de Processo Civil de 2015 para os honorários advocatícios, ainda que o cumprimento de sentença não seja impugnado nem embargado. Precedente da Corte Especial.2. A redução dos honorários pela metade somente se justifica quando o réu, além de reconhecer a procedência do pedido, cumprir prontamente a prestação, o que não ocorre nas ações contra a Fazenda Pública, eis que sujeita a procedimento especial.3. Agravo de instrumento provido.” (g.n.)
(TRF4, AG 5040252-49.2016.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, julgado em 09/05/2017)
Instado a se manifestar sobre a questão, o Superior Tribunal de Justiça decidiu da mesma forma, conforme se extraí da ementa de seu recentíssimo julgado:
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. REDUÇÃO DE HONORÁRIOS PELA METADE EM CUMPRIMENTO DE SENTENÇA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA NÃO IMPUGNADO. ART. 90, § 4º, DO CPC/2015. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE NORMA ESPECÍFICA. ART. 85, § 7º, DO CPC/2015. NORMA INCOMPATÍVEL COM A SISTEMÁTICA DOS PRECATÓRIOS. INCIDÊNCIA DE HONORÁRIOS. RECURSO REPETITIVO. TEMA 973. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. Cinge-se a controvérsia a definir se a previsão do § 4º do art.
90 do CPC/2015 se aplica aos cumprimentos de sentença não impugnados, total ou parcialmente, pela Fazenda Pública.
2. Da análise sistemática do diploma legal, verifica-se não haver espaço para a incidência da norma em comento no cumprimento de sentença, pois a aplicação de dispositivos legais relativos ao procedimento comum nos procedimentos especiais e no processo de execução é expressamente subsidiária, nos termos do parágrafo único do art. 318 do Código de Ritos.
3. Com relação ao cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública, há previsão específica de isenção de honorários em caso de ausência de impugnação, qual seja, o § 7º do art. 85 do CPC/2015. Portanto, o próprio Código de Processo Civil rege a hipótese de ausência de impugnação, não havendo de se cogitar a aplicação de outra disposição normativa de forma subsidiária.
4. Por outro lado, deve-se ressaltar que a previsão legal é incompatível com o procedimento de execução ao qual está sujeita a Fazenda Pública, por não haver possibilidade de adimplemento simultâneo da dívida reconhecida, ante a necessidade de expedição de precatório ou requisição de pequeno valor.
5. Não assiste razão à autarquia recorrente em pretender obter o mesmo benefício dos particulares. Primeiro, porque os entes públicos já possuem prerrogativas constitucionais e legais que os colocam em situação favorável em relação aos particulares. Segundo, porque o art. 90, § 4º, do CPC/2015 não se aplica ao cumprimento de sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa, tendo em vista a existência de norma específica que isenta o executado do pagamento de honorários, em caso de pagamento voluntário do débito no prazo legal de 15 (quinze) dias (art. 523, caput e § 1º, do CPC/2015).
6. Impende ainda destacar que a Corte Especial, no julgamento do REsp 1.648.238/RS, submetido ao rito dos recursos repetitivos, estabeleceu que o art. 85, § 7º, do CPC/2015 não afasta a aplicação do entendimento consolidado na Súmula 345 do STJ, de modo que são devidos honorários advocatícios nos procedimentos individuais de cumprimento de sentença decorrente de ação coletiva, ainda que não impugnados e promovidos em litisconsórcio.
7. Recurso especial a que se nega provimento". (g.n.)
(REsp 1691843/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/02/2020, DJe 17/02/2020)
É de se concordar com o entendimento dos referidos Tribunais, eis que a lei prevê dois requisitos para a aplicação do benefício da redução dos honorários pela metade, o reconhecimento do pedido e o imediato cumprimento da obrigação. Não havendo o imediato cumprimento da obrigação de pagar quantia, não há que se falar na redução, sob pena de se criar mais um privilégio/prerrogativa para os Entes Públicos em juízo.
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