CPC na prática

Recentes posições do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o artigo 866 do CPC/15 – A penhora de faturamento

Recentes posições do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o artigo 866 do CPC/15 – A penhora de faturamento.

5/9/2019

Elias Marques de Medeiros Neto

Recentemente, em 23/4/2019, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou o Agravo de Instrumento n. 2053491-24.2019.8.26.0000, tendo-se decidido que:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. PENHORA. PREFERÊNCIA LEGAL. Tentativa de bloqueio de recursos financeiros da agravante frustrada. A falta de dinheiro em conta é demonstração de que a ordem estabelecida pelo art. 835 do CPC foi observada. Competia ao devedor indicar outros bens antecedentes passíveis de penhora, o que não foi feito. PENHORA DE FATURAMENTO. Penhora sobre o faturamento no valor mensal de 30% da receita. Percentual excessivo e põe em risco a atividade econômica explorada pela sociedade. Art. 866 do CPC. Penhora reduzida para 5% do faturamento bruto mensal da pessoa jurídica. Decisão reformada. Recurso provido em parte."

Em especial, o julgado enfatiza a importância do administrador judicial para a elaboração de um plano de constrição eficiente, sendo tal trabalho essencial para a fixação do percentual a ser observado na realização da penhora: "Na penhora de faturamento, o administrador deverá submeter à aprovação judicial a base de cálculo, o percentual e o tempo de constrição, corroborado por documentos e informações necessárias para a formação do plano de pagamento para satisfação do credor".

O mesmo posicionamento do Tribunal de Justiça de São Paulo é presente no julgamento do Agravo de Instrumento nº 2177466-54.2017.8.26.0000, ocorrido em 13.12.2017, e no julgamento do Agravo de Instrumento nº 2159588-53.2016.8.26.0000, ocorrido em 31/8/2016:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA DE FATURAMENTO. Penhora sobre o faturamento no valor mensal de 20% da receita. Alegação comprovada de que o percentual é excessivo e põe em risco a atividade econômica explorada pela sociedade. Art. 866 do CPC/15. Penhora reduzida para 5% do faturamento bruto mensal da pessoa jurídica. ENCARGO DE DEPOSITÁRIO. Recusa pela agravante sob fundamento de que não gerencia a empresa e não está apta ao cumprimento. Possibilidade. Súmula n. 319 do STJ. Precedentes. Incidência das regras do §3º do art. 866 e art. 869, §2º, do CPC. Havendo recusa do exequente e do executado, o magistrado deve nomear terceiro para que lhe preste contas periódicas e execute a medida constritiva. Decisão reformada. Recurso provido."

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA DE FATURAMENTO. Regularidade. Pressupostos atendidos. Inexistência de outros bens passíveis de penhora. Ausência de demonstração de que a penhora inviabiliza o exercício da atividade empresarial. Penhora mantida. Compatibilização dos princípios da menor onerosidade do devedor com o da efetividade da execução. Administrador que deverá demonstrar que o percentual da penhora compromete a sua sobrevivência ou mesmo inviabiliza a atividade econômica quando formular e apresentar o plano de pagamento do credor. Art. 866 do CPC/15. Recurso improvido".

Na penhora de faturamento, a exigência de um administrador é fundamental, até para verificar a melhor forma de satisfazer o credor (art. 797 do CPC/15), sem que, contudo, seja promovida a destruição da empresa (art. 805 do CPC/15); sendo necessário, portanto, que um especialista estude o cenário fiscal, financeiro e contábil da pessoa jurídica e verifique a melhor forma de solver-se a dívida executada, sem acarretar problemas para as atividades e sobrevivência da empresa.

Compete ao administrador fazer um plano de pagamento que atenda aos interesses do credor e que não provoque a insolvência da empresa, devendo tomar todas as cautelas necessárias para que o seu plano, uma vez judicialmente aprovado, seja fielmente executado.

O artigo 866 do CPC/15 inspira reflexão sobre a necessidade de um procedimento cuidadoso na realização da penhora de faturamento; razão pela qual, com acerto, agem os tribunais quando exigem a nomeação de administrador e a elaboração de plano de pagamento para a fixação do percentual da constrição: "Execução fiscal. Penhora. Dinheiro em conta corrente. Não cabimento. Equivalência à penhora do estabelecimento. Comprometimento do capital de giro. Caráter excepcional não configurado. Equiparação à penhora de faturamento. Necessidade de nomeação de um depositário administrador. Artigos 677 e 678 do Código de Processo Civil". (TJ/SP, AG n. 9038193-92.2004.8.26.0000, Rel. Des. José Roberto dos Santos Bedaque, Primeira Câmara, julgado em 28/5/2004).

Da redação do art. 866 do CPC/15, extrai-se a certeza de que a penhora de percentual do faturamento depende, para sua realização, da figura de um depositário, o qual deverá elaborar um plano de atuação a ser submetido à aprovação judicial, bem como deverá prestar contas mensalmente perante o juízo quanto à sua atuação.

Logo de início já é possível perceber que a penhora de faturamento não pode dispensar a figura de um administrador, a quem se incumbe à importante tarefa de elaborar um plano de atuação e pagamento ao credor.

Ora, se a lei determina que o magistrado deva nomear um administrador para que ele estude a melhor forma de a constrição sobre o faturamento ocorrer, então claro é que o magistrado não pode dizer – sem ouvir um expert – qual é o percentual do faturamento que será penhorado, bem como qual é a base de cálculo que será utilizada para fins de incidência daquele percentual.

O magistrado não deve fixar percentual, e nem a forma de constrição, sem ouvir previamente o administrador depositário nomeado; cabendo a este último, como expert, e não ao juiz, dar o devido direcionamento técnico para chegar-se à maneira mais eficiente de se satisfazer o credor, e da forma menos onerosa possível ao devedor. Ao magistrado cabe, após o seu devido juízo de ponderação, e após o regular contraditório entre as partes, chancelar o plano de atuação e pagamento elaborado pelo administrador, bem como fiscalizar a atuação deste último; tudo de modo a zelar-se pela efetividade da tutela executiva.

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André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto tem pós-doutorado em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015). Pós Doutorado em Democracia e Direitos Humanos, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019). Pós Doutorado em Direitos Sociais, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022). Pesquisador visitante no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil (2023). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). Pós Graduação Executiva nos Programas de Negociação (2013) e de Mediação (2015) da Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (destacando-se a EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae, UCDB, e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil: Teams. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).